PROCESSO Nº: 0801476-76.2021.4.05.8100 - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA APELANTE:
(...) ADVOGADO:
(...) ADVOGADO: Ana Victoria Freire Couto APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: Os mesmos ADVOGADO: Os mesmos RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Francisco Roberto Machado - 1ª Turma JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal Ricardo Cunha Porto EMENTA: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EX-MILITAR TEMPORÁRIA. ODONTÓLOGA. ADICIONAIS DE HABILITAÇÃO E DE COMPENSAÇÃO ORGÂNICA. FÉRIAS NÃO GOZADAS. DANOS MORAIS. 1. Sustentando ter deixado de gozar quinze dias de férias e ter direito aos adicionais de habilitação e de compensação orgânica, respectivamente, nos percentuais de 20% e de 40% (e não 12% e 10%,
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...como percebia), a autora, ex-militar temporária na função de odontóloga, ajuizou esta ação de cobrança c/c indenização por danos morais pleiteando o pagamento: 1) das diferenças remuneratórias relativas ao adicional de habilitação, ao adicional de compensação orgânica e às férias não gozadas; 2) da diferença na compensação pecuniária recebida quando do desligamento do serviço militar, decorrente do ajuste pleiteado nos valores dos adicionais; 3) indenização de dez mil reais. A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos, condenando a União ao pagamento da diferença pleiteada a título de adicional de habilitação no percentual de 8% sobre o soldo autoral no período compreendido entre fevereiro de 2015 (ingresso no serviço militar) até janeiro de 2020 (data de seu desligamento), como também o pagamento de 15 dias de férias não gozadas (férias trabalhadas) atinentes ao 1º semestre de 2018, bem como todos os reflexos pecuniários daí advindos, em especial no cálculo da compensação pecuniária que lhe foi paga equivalente a uma remuneração mensal por ano de efetivo serviço militar prestado. Ambas as partes apelaram. 2. O Juízo singular, ao não acolher o pleito relativo ao adicional de compensação orgânica, considerou não mais vigorar a legislação que previa o referido adicional no percentual de 40%, entendendo ser devido no percentual de 10%, nos termos da MP 2.215-10/2001. A autora, em seu apelo, sustenta que o adicional em questão foi regulamentado a partir de leis específicas (Lei 1.234/50 e Dec. 32.604/53) ainda vigentes, pois não teriam sido revogadas, e que preveem o percentual de 40%. 3. Não assiste, porém, razão à recorrente. Embora a invocada Lei 1.234/50 tenha criado uma gratificação adicional de 40% do vencimento, devida a todos os servidores da União, civis e militares, que operam diretamente com raios X (art. 1º, c), a Lei 8.237/91 alterou a estrutura remuneratória dos militares, limitando os tipos de gratificações por eles percebidas apenas às de tempo de serviço, de compensação orgânica e de habilitação (art. 2º, II, letras a, b e c) e dispondo que seria de 10% sobre o soldo a gratificação de compensação orgânica destinada a compensar os desgastes orgânicos consequentes da exposição a radiações resultantes do desempenho continuado em trabalho com raios X ou substâncias radioativas (art. 18, V, e anexo II). A referida Lei, em seu art. 96, ainda estabeleceu que ficam extintas quaisquer outras vantagens remuneratórias que vinham sendo pagas aos militares da ativa e na inatividade, que não tenham sido mantidas por esta lei. 4. Por sua vez, a MP 2.215-10/2001 revogou a citada Lei 8.237/91, reestruturando novamente a remuneração dos militares, desta feita: criando as gratificações de localidade especial e de representação (art. 1º, III, letras a e b); transformando em adicionais as gratificações de habilitação, de tempo de serviço e de compensação orgânica (art. 1º, II, letras b, c e d); definindo este último adicional como parcela remuneratória mensal devida ao militar para compensação de desgaste orgânico resultante do desempenho continuado de atividades especiais (art. 3º, V); e mantendo em 10% sobre o soldo o percentual do adicional de compensação orgânica por trabalho com raios X ou substâncias radioativas (tabela V do anexo II). 5. Quanto ao adicional de habilitação, ele é uma parcela remuneratória mensal devida ao militar, inerente aos cursos realizados com aproveitamento, conforme regulamentação (art. 3º, III, da MP 2.215-10/2001), sendo devido em percentuais diversos sobre o soldo, dependendo do tipo de curso: 12% para os cursos de formação, 16% para os de especialização e 20% para os de aperfeiçoamento, no que interessa à lide (tabela III do anexo II da referida MP 2.215). A sentença entendeu que o adicional seria devido à autora não apenas no percentual de 12%, mas no de 20%, por ela ter pós-graduação em Ortodontia e monitoria na disciplina de Endodontia (cursos de aperfeiçoamento), além da sua graduação em Odontologia (curso de formação), tendo o Juízo sentenciante considerado que, nos termos da portaria vigente à época do ingresso da autora no Exército, a pós-graduação obtida equivalia a um curso de aperfeiçoamento e era do interesse daquela Força, pois aplicável no exercício da função de dentista. 6. Considerando que a União não contestou o pleito autoral referente ao adicional de habilitação, a impugnação desta questão apenas no apelo interposto pela ré configura inovação recursal, vedada pelo ordenamento jurídico, sendo forçoso o não conhecimento da apelação da União, nesse ponto. Por outro lado, tendo sido apreciada na sentença, a matéria pode ser reexaminada por força da remessa necessária. 7. Assim, observe-se que a autora ingressou no Exército em abril de 2015 e foi licenciada em janeiro de 2020. A Portaria 190, de março de 2015, vigente à época do seu ingresso, de fato, considerava como equivalente a um curso de aperfeiçoamento cursos de pós-graduação latu sensu realizados em instituições civis, como o da demandante, condicionado ao atendimento do interesse do Exército, assim definido pelo Estado-Maior do Exército (art. 1º, III, b). Por sua vez, o art. 6º da mesma Portaria ainda explicitava (no que interessa à lide) que os cursos realizados em instituições civis de ensino somente serão considerados (...) se forem necessários ao exercício do cargo e ao desempenho da função, desde que (...) atendam ao interesse do Exército, assim definido pelo EME. 8. À vista desse regramento, o Juízo a quo inferiu que o curso de pós-graduação obtido pela autora era de interesse do Exército à época de sua prestação de serviço, uma vez que (...) refere-se à especialização em ortodontia, conhecimento este aplicado no exercício de sua função de dentista. No entanto, o Comandante da OM à qual a demandante estava vinculada informou que não havia, naquela unidade, suporte físico e técnico para o oferecimento do serviço de Ortodontia, de tal sorte que a ex-militar atuou apenas na função de clínica geral (doc. 4058100.20468725). Ora, se não havia estrutura para a realização de procedimentos ortodônticos, os conhecimentos específicos da autora nessa área efetivamente não foram "necessários ao exercício do cargo e ao desempenho da função", como exigido pelo citado art. 6º da Portaria 190/2015, sendo suficiente, para tanto, apenas a graduação em Odontologia. De outra banda, se não era necessária a pós-graduação da autora para o desempenho da função por ela exercida, razoável concluir que o referido curso não atendia ao interesse do Exército. 9. Além disso, note-se que o invocado parecer favorável ao cadastro dos cursos na ficha individual da demandante apenas aprova o registro deles nos assentamentos funcionais. Com efeito, elaborado no âmbito de diligência instaurada para verificar a validade e a veracidade dos diplomas e/ou certificados apresentados pela ex-militar, o parecer apenas atesta serem válidos e verdadeiros os referidos documentos e opina sejam eles cadastrados na ficha funcional da demandante, não tendo havido qualquer análise, muito menos decisão, quanto ao preenchimento de requisitos para concessão do adicional de habilitação. 10. Assim, não demonstrado que o curso de pós-graduação era necessário ao desempenho da função militar assumida pela autora nem comprovado o interesse do Exército na obtenção da especialização, não faz jus a demandante à diferença de percentual do adicional de habilitação, sendo, por consequência, descabido o pleito indenizatório fundado no não pagamento da referida vantagem no percentual pretendido. 11. Quanto ao pedido indenizatório baseado nas férias trabalhadas, é de se manter o indeferimento nos termos da sentença, segundo a qual, ainda que gere certa aflição e preocupação, da conduta da Administração Pública não decorre uma situação ofensiva à dignidade autoral capaz de ensejar a reparação de dano moral. 12. Mantido também, nos termos da sentença, o acolhimento do pedido autoral de pagamento de 15 dias de férias (férias trabalhadas) referentes ao período aquisitivo de 01/01/2018 a 30/06/2018 (6/12 avos), uma vez que não há qualquer comprovação da concessão e gozo de férias pela promovente relativas ao restante do período a que tinha direito pelo tempo de serviço prestado em 2018, somente restando comprovado o período de 10 dias de férias de 2018, que foram gozadas no 1º semestre de 2019. 13. Apelo da União não conhecido, apelação da autora improvida e remessa necessária parcialmente provida. Ante a sucumbência parcial das partes, a verba honorária resta fixada nos percentuais mínimos sobre o valor do proveito econômico obtido por uma e outra partes, nos termos do
art. 85,
parágrafos 2º ao 5º, do
CPC/2015, ficando, porém, suspensa a cobrança à autora, por até cinco anos, enquanto perdurarem as condições que permitiram a concessão da justiça gratuita (
art. 98,
§ 3º, do
CPC).
(TRF-5, PROCESSO: 08014767620214058100, APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO ROBERTO MACHADO, 1ª TURMA, JULGAMENTO: 17/02/2022)