DECISÃO Vistos, etc. Trata-se de Recurso Especial interposto por OI S/A, Sociedade Anônima de Capital Privado em Recuperação Judicial, com fundamento no
art. 105,
III, alínea “a”, da
Constituição Federal (ID 61365105), em face do acórdão que, proferido pela Primeira Câmara Cível, negou provimento ao apelo nos termos da ementa abaixo transcrita (ID 49925204): APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EMPRESA DE TELEFONIA. TELEFONIA FIXA. PRELIMINARES. REJEITADAS. INTERRUPÇÃO DE SERVIÇO. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE PARCIALMENTE O PEDIDO MINISTERIAL. FALHA DO SERVIÇO COMPROVADA. CONDENAÇÃO EM DANOS MATERIAIS E MORAIS.
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...CABIMENTO. DIREITO DIFUSO E COLETIVO E INDIVIDUAL HOMOGÊNEO. PRECEDENTES. PARECER DA PROCURADORIA DE JUSTIÇA PELA MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Para ancorar seu Recurso Especial com fulcro na alínea “a”, do permissivo constitucional, afirma o recorrente, em síntese, que o aresto guerreado violou os arts. 19, incisos VI e XVIII, 22, e 79, da Lei nº 9.472/97; arts. 42, 370 e 485, inciso VI, do Código de Processo Civil; e arts. 844 e 884, do Código Civil. O recurso foi contra-arrazoado. É o relatório. De início, no que se refere à suposta violação aos arts. 19, incisos VI e XVIII e 22, da Lei nº 9.472/97 e ao art. 42, do Código de Processo Civil, assentou-se o aresto recorrido nos seguintes termos: Afasta-se, de início, a preliminar de incompetência do Juízo suscitada, eis que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende não haver litisconsórcio passivo necessário com a ANATEL, nos termos do art. 47 do CPC, nas hipóteses em que o objeto da ação civil é a proteção da relação de consumo existente entre os usuários e a empresa de telefonia e não as normas editadas pela autarquia federal em demanda cujo resultado vai interferir na sua esfera jurídica. Dito isto, observa-se que o entendimento firmado pelo aresto recorrido encontra-se em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, sendo imperiosa a incidência da Súmula 7, do STJ. Nesse sentido: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TELEFONIA. MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ALEGADA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. ANATEL. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 283/STF. 1. No caso dos autos, verifica-se não ter ocorrido ofensa ao art. 1.022 do CPC, na medida em que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas e apreciou integralmente a controvérsia posta nos autos; não se pode, ademais, confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem asseverado que a ação civil pública em que se discute relação contratual entre particular e a concessionária de serviços de telefonia não atinge a órbita jurídica da agência reguladora. Assim, não existe litisconsórcio passivo necessário entre a concessionária de serviços de telefonia e a Anatel, quando a relação jurídica controvertida é alheia àquela mantida entre as concessionárias e o ente regulador. 3. "Não há falar na existência de violação dos dispositivos previstos na Lei n. 9.472/1997 - Lei Geral das Telecomunicações -, haja vista que a competência da Anatel para regular o setor de telefonia é privativa, e não exclusiva, circunstância que permite a intervenção do Poder Judiciário, caso provocado" (AgInt no AREsp 1659845/PI, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 25/5/2021, DJe 09/6/2021). 4. No que diz respeito à alegada inépcia da inicial e à existência de irregular transferência de responsabilidade quanto ao serviço de energia elétrica, o recurso especial não impugnou fundamentos basilares que ampararam o acórdão recorrido, esbarrando, pois, no obstáculo da Súmula 283/STF. 5. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp n. 1.210.327/AM, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 16/8/2021, DJe de 18/8/2021.) PROCESSUAL CIVIL, ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO - VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA - PIS/COFINS - REPASSE AO CONSUMIDOR NA FATURA TELEFÔNICA - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA ANATEL - TESE ACERCA DA INEXISTÊNCIA DE ERRO NO PAGAMENTO: AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO - ABUSIVIDADE DA COBRANÇA RECONHECIDA POR ESTA CORTE - DEVOLUÇÃO EM DOBRO - POSSIBILIDADE. 1. Não ocorre ofensa ao art. 535, II, do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide. 2. Prevalece no STJ o entendimento de que a ANATEL não tem legitimidade passiva para responder pela cobrança indevida de valores levada a efeito pelas empresas de telefonia na conta telefônica. 3. É inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida pelo Tribunal de origem, dada a ausência de prequestionamento. 4. A Segunda Turma desta Corte firmou entendimento no sentido da ilegalidade do repasse do PIS e da COFINS na fatura telefônica, bem como acerca da má-fé das empresas de telefonia e, por consequência, da abusividade dessa conduta. 5. Direito à devolução em dobro reconhecido com base no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não provido. (REsp n. 910.784/RJ, relatora Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 4/6/2009, DJe de 23/6/2009.) De igual modo, incide o óbice imposto pela Súmula 83, do Superior Tribunal de Justiça quanto às supostas violações aos arts. 370 e 485, inciso VI, do Código de Processo Civil. Vejamos: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. CONTRATO IMOBILIÁRIO. CONTROLE ABSTRATO E CONCRETO DE PRÁTICAS E CLÁUSULAS ABUSIVAS. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ARTS. 81, PARÁGRAFO ÚNICO, E 82, I, DA LEI 8.078/1990 (CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR). ARTS. 1º, II, E 5º DA LEI 7.347/1985 (LEI DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA). DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS DISPONÍVEIS E DIVISÍVEIS. REPERCUSSÃO SOCIAL. "HABITE-SE" PROVISÓRIO. 1. Cuida-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte contra Patri Dez Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Município de Natal, em que objetiva a revisão de práticas e cláusulas contratuais abusivas, em contrariedade ao Código de Defesa do Consumidor, na venda de unidades habitacionais do empreendimento denominado Condomínio Residencial Smile Village Lagoa Nova. 2. Na hipótese dos autos, imputam-se à empresa cláusulas e práticas abusivas que transbordam os limites estreitos de um par de negócios firmados com compradores individuais de unidades habitacionais em um único empreendimento. In casu, observa-se repercussão social em alto grau, seja porque a abusividade acha-se inserida em instrumentos por adesão de ampla circulação e sem possibilidade de discussão ("pegue ou largue"), seja porque nos contratos imobiliários residenciais não está em jogo apenas a integridade econômica (o bolso) do consumidor, mas, sim, bens jurídicos tangíveis e intangíveis com forte conotação pública no Estado atual, lastreados no princípio da solidariedade (a casa própria e o direito à moradia, p. ex.). Tudo sem falar do agravamento da situação quando o fornecedor, com a conivência de agentes estatais, utiliza-se de meios e mecanismos que afrontam a ordem jurídica da probidade administrativa, como a emissão de "habite-se" provisório ou condicional. 3. O controle judicial de práticas e cláusulas abusivas faz-se in concreto ou in abstracto. Como o Direito do Consumidor caracteriza-se por axiomática ojeriza à lesão consumada - daí ser disciplina de riscos mais do que disciplina de danos -, a atuação dos órgãos administrativos, do Ministério Público e do próprio Poder Judiciário deve buscar, ao máximo e prioritariamente, evitar que prejuízos efetivos aconteçam, muitos deles dependentes de custosa e difícil, quando não impossível, restauração ao statu quo ante ou indenização. Logo, a implementação do controle abstrato de práticas e cláusulas abusivas independe de reclamação de um ou vários consumidores, já que investigação e eventual acionamento judicial acerca de anomalias negociais precisam se antecipar à consumação do ilícito (modelo de controle preventivo) em vez de esperarem pela materialização dos malefícios (modelo de controle remediador ou, na linguagem popular, modelo do "leite derramado"). 4. Para fins de legitimação do Ministério Público na Ação Civil Pública de tutela de direitos individuais homogêneos disponíveis e divisíveis, a aferição da repercussão social não haverá de considerar somente a textura quantitativa das vítimas, rechaçado juízo meramente matemático ou exercício mecânico de contar cabeças. Muito mais importantes são aspectos, entre outros, associados à natureza dos bens jurídicos tutelados (saúde, segurança, essencialidade dos produtos ou serviços, dignidade do consumidor no mercado, tutela da igualdade e enfrentamento da discriminação, condição de hipervulnerabilidade, etc.) e a risco supraindividual de incentivar desobediência generalizada à lei (enfraquecimento da qualidade dissuasória e da autoridade dos comandos normativos), sobretudo por comportamentos empresariais predatórios, típicos do capitalismo selvagem, em frontal violação das premissas éticas e políticas que norteiam o reconhecimento e a legitimidade da pessoa jurídica, como agente econômico no ordenamento brasileiro contemporâneo. 5. A Corte Especial do STJ firmou jurisprudência no sentido de que, "ainda que se trate de direito disponível, há legitimidade do Ministério Público para a defesa do consumidor de forma coletiva na hipótese em que o Órgão Ministerial postula o reconhecimento de abusividade de cláusula contida em contrato de compra e venda de imóvel celebrado com consumidores." (EREsp 1.378.938/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Corte Especial, DJe 27.6.2018). No mesmo sentido: "A jurisprudência desta Corte vem se sedimentando em favor da legitimidade ministerial para promover ação civil pública com vistas à defesa de direitos individuais homogêneos, ainda que disponíveis e divisíveis, quando na presença de relevância social objetiva do bem jurídico tutelado ou diante da massificação do conflito em si considerado" (AgRg no REsp 1.301.154/RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 19.11.2015); "Ainda que se trate de direito disponível, há legitimidade do Ministério Público para a defesa do consumidor de forma coletiva na hipótese em que o Órgão Ministerial postula o reconhecimento de abusividade de cláusula contida em contrato de compra e venda de imóvel celebrado com consumidores" (AgInt no AREsp n. 1.284.667/DF, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 27.5.2021). 6. Agravo Interno não provido. (AgInt no AgInt no AREsp n. 2.322.703/RN, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 20/5/2024, DJe de 4/6/2024.) Por fim, no que tange à suscitada ofensa aos arts. 844, parágrafo único e 884, do Código Civil, constata-se que eventual alteração do entendimento firmado pelo aresto guerreado demandaria necessária reanálise do acervo fático-probatório, sendo imperiosa a incidência da Súmula 7, do Superior Tribunal de Justiça. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PATRIMÔNIO HISTÓRICO-CULTURAL. IMÓVEL. DESAPROPRIAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO. PASSIVO AMBIENTAL. SUB-ROGAÇÃO NO PREÇO. CONDENAÇÃO DO EXPROPRIADO. REPARAÇÃO DO BEM. IMPOSSIBILIDADE. BIS IN IDEM. DANO MORAL COLETIVO. REVISÃO DE MATÉRIA FÁTICA. NÃO CABIMENTO. 1. A principal controvérsia jurídica do recurso especial em exame consiste em saber se o expropriado, após a desapropriação, pode ser condenado a reparar dano ambiental por ele praticado anteriormente. 2. Esta Corte Superior, no Tema repetitivo 1.204, fixou a tese jurídica de que "as obrigações ambientais possuem natureza 'propter rem', sendo possível exigi-las, à escolha do credor, do proprietário ou possuidor atual, de qualquer dos anteriores, ou de ambos, ficando isento de responsabilidade o alienante cujo direito real tenha cessado antes da causação do dano, desde que para ele não tenha concorrido, direta ou indiretamente", na linha do que anteriormente já preconizava a sua Súmula 623. 3. O caso dos autos, todavia, distingue-se dos processos dos quais foi tirada a supracitada orientação, visto que ali se estaria a tratar de aquisição derivada da propriedade (transferência voluntária), ao passo que aqui se está diante de aquisição originária por desapropriação, que tem contornos próprios e distintos. 4. O art. 31 do Decreto-Lei n. 3.365/1941 disciplina que "ficam subrogados no preço quaisquer ônus ou direitos que recaiam sobre o bem expropriado". 5. Hipótese em que o ônus de reparação que recaía sobre o bem (de natureza histórico-cultural) expropriado já foi considerado no preço (justa indenização) que foi desembolsado pelo Município para a aquisição do imóvel, isto é, a Fazenda municipal já descontou o passivo ambiental do valor pago. 6. Diante desse quadro, a condenação da parte expropriada no dever de pagar pela reparação do imóvel desapropriado implicaria violação do postulado do non bis in idem, uma vez que o particular amargaria duplo prejuízo pelo mesmo fato: perceberia indenização já descontada em razão do passivo ambiental e ainda teria que pagá-lo (o passivo) novamente nesta ação. 7. Por outro lado, é possível reformar a decisão da origem para restabelecer a legitimidade passiva da sociedade empresária recorrida em relação ao dever (em tese) de reparar o (suposto) dano moral coletivo, pois, nesse último caso, a obrigação ou o ônus não estão relacionados ao próprio bem, inexistindo sub-rogação no preço. 8. Caso em que a Corte local, diante das peculiaridades fáticas comprovadas, compreendeu que não havia lesão de grandeza suficiente a caracterizar o abalo moral, conclusão que, para ser revista, demandaria o revolvimento do acervo fático-probatório levado em consideração na decisão, providência inviável, em razão do óbice da Súmula 7 do STJ. 9. Agravo conhecido para dar parcial provimento ao recurso especial. (AREsp n. 1.886.951/RJ, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 11/6/2024, DJe de 20/6/2024.) Ante o exposto, amparado no
art. 1.030,
inciso V, do
Código de Processo Civil, inadmito o Recurso Especial. Publique-se. Intimem-se. Salvador (BA), 26 de agosto de 2024. Desembargador José Alfredo Cerqueira da Silva 2º Vice-Presidente fb
(TJ-BA, Classe: Apelação, Número do Processo: 0000021-40.2005.8.05.0016, Órgão julgador: 2ª VICE-PRESIDÊNCIA, Relator(a): JOSE ALFREDO CERQUEIRA DA SILVA, Publicado em: 26/08/2024)