Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO QUARTA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 Ação: Procedimento do Juizado Especial Cível Recurso nº 0002455-69.2023.8.05.0113 Processo nº 0002455-69.2023.8.05.0113 Recorrente(s): UNIMED NACIONAL COOPERATIVA CENTRAL Recorrido(s): OLIVIA DIAS DE MATOS SANTOS VOTO-EMENTA AGRAVO INTERNO EM FACE DE DECISÃO MONOCRÁTICA PROFERIDA NOS AUTOS DO RECURSO INOMINADO. HIPÓTESE DE RECURSO INTERNO, CONSOANTE
ART. 15,
INC. XI,
RESOLUÇÃO N° 02/2021 DO TJ/BA E
ARTIGO 932...« (+1843 PALAVRAS) »
... DO CPC. CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDAS. MERO INCONFORMISMO. AUSÊNCIA DE VÍCIO NA DECISÃO MONOCRÁTICA A SER CORRIGIDO PELA VIA DO AGRAVO INTERNO. MATÉRIA OBJETO DE RECURSO INOMINADO COM ENTENDIMENTO PACIFICADO NA TURMA RECURSAL. PRECEDENTES. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE, LASTREADA NAS PROVAS DOS AUTOS E, NOS TERMOS DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E DO CPC, COM A JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS SOBRE O TEMA DEVE SER MANTIDA INTEGRALMENTE. RECURSO INTERNO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Trata-se de Agravo Interno contra a decisão monocrática proferida em observância ao que dispõe o art. 15, INC. XI, da Resolução n° 02/2021 DO TJ/BA e 932 do CPC. A parte Agravante, em suas razões, requer a reconsideração do Recurso Inominado pelo Órgão Colegiado. Nos termos dos incs. XI e XII, art. 15, do Regimento Interno das Turmas Recursais, existe a previsão taxativa de interposição de recurso interno para a hipótese da parte sucumbente pretender desafiar a decisão monocrática do(a) Relator(a) que "negar seguimento, nas Turmas Recursais Cíveis, em decisão monocrática, a recurso inadmissível, improcedente, prejudicado ou em desacordo com súmula ou jurisprudência dominante das Turmas Recursais ou da Turma de Uniformização ou ainda de Tribunal Superior", ou que "dar provimento, nas Turmas Recursais Cíveis, em decisão monocrática, a recurso se a decisão estiver em manifesto confronto com súmula do Tribunal Superior ou jurisprudência dominante do próprio Juizado", podendo o Juízo Colegiado, uma vez tempestivamente provocado, ratificar ou não o quanto decidido de forma monocrática. Da análise minudenciada do conjunto fático probatório, evidencia-se restar autorizada a inversão do ônus da prova, ante a presença dos requisitos preconizados pela norma de proteção consumerista, nos termos do art. 6°, inciso VIII. Não há discussão sobre os reajustes anuais. Percebe-se que a partir do reajuste em fevereiro de 2019 (faixa etária de 50 anos), após a parte autora completar 50 anos, houve um aumento aplicado de mais de 100%. Primeiramente, cumpre salientar, que não há qualquer ilegalidade na alteração do valor pela faixa etária, desde que não haja abusividade, conforme entendimento recente do STJ. Nesse diapasão, cumpre destacar que remansosa jurisprudência assentou entendimento da invalidade de aumento em decorrência da mudança de faixa etária, haja vista o teor do artigo 15, § 3º, “É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade”, da Lei 10.741/03. Vejamos: PLANO DE SAÚDE. CONTRATO CELEBRADO SOB A VIGÊNCIA DO CDC. IMPLEMENTO DA IDADE DE 60 ANOS JÁ NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 10.741/03 (ESTATUTO DO IDOSO). ABUSIVIDADE DO REAJUSTE DA MENSALIDADE EXCLUSIVAMENTE COM BASE NA ALTERAÇÃO DA FAIXA ETÁRIA. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA AFASTADAS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.” (TJ-RS – COLENDA SEGUNDA TURMA RECURSAL CÍVEL – Nº 71002203255). Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça, em recente julgamento, firmou entendimento que o aumento decorrente de mudança de faixa etária não é abusivo por si só, devendo o julgador ater-se a razoabilidade e proporcionalidade na caracterização de eventual ilícito civil. Senão vejamos: Terceira Turma DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. REAJUSTE DE MENSALIDADE DE SEGURO-SAÚDE EM RAZÃO DE ALTERAÇÃO DE FAIXA ETÁRIA DO SEGURADO. É válida a cláusula, prevista em contrato de seguro-saúde, que autoriza o aumento das mensalidades do seguro quando o usuário completar sessenta anos de idade, desde que haja respeito aos limites e requisitos estabelecidos na Lei 9.656/1998 e, ainda, que não se apliquem índices de reajuste desarrazoados ou aleatórios, que onerem em demasia o segurado. Realmente, sabe-se que, quanto mais avançada a idade do segurado, independentemente de ser ele enquadrado ou não como idoso, maior será seu risco subjetivo, pois normalmente a pessoa de mais idade necessita de serviços de assistência médica com maior frequência do que a que se encontra em uma faixa etária menor. Trata-se de uma constatação natural, de um fato que se observa na vida e que pode ser cientificamente confirmado. Por isso mesmo, os contratos de seguro-saúde normalmente trazem cláusula prevendo reajuste em função do aumento da idade do segurado, tendo em vista que os valores cobrados a título de prêmio devem ser proporcionais ao grau de probabilidade de ocorrência do evento risco coberto. Maior o risco, maior o valor do prêmio. Atento a essa circunstância, o legislador editou a Lei 9.656/1998, preservando a possibilidade de reajuste da mensalidade de seguro-saúde em razão da mudança de faixa etária do segurado, estabelecendo, contudo, algumas restrições a esses reajustes (art. 15). Desse modo, percebe-se que ordenamento jurídico permitiu expressamente o reajuste das mensalidades em razão do ingresso do segurado em faixa etária mais avançada em que os riscos de saúde são abstratamente elevados, buscando, assim, manter o equilíbrio atuarial do sistema. Posteriormente, em razão do advento do art. 15, § 3º, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) que estabelece ser "vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade", impõe-se encontrar um ponto de equilíbrio na interpretação dos diplomas legais que regem a matéria, a fim de se chegar a uma solução justa para os interesses em conflito. Nesse passo, não é possível extrair-se do art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso uma interpretação que repute, abstratamente, abusivo todo e qualquer reajuste que se baseie em mudança de faixa etária, mas tão somente o aumento discriminante, desarrazoado, que, em concreto, traduza verdadeiro fator de discriminação do idoso, por visar dificultar ou impedir a permanência dele no seguro-saúde; prática, aliás, que constitui verdadeiro abuso de direito e violação ao princípio da igualdade e divorcia-se da boa-fé contratual. Ressalte-se que o referido vício - aumento desarrazoado - caracteriza-se pela ausência de justificativa para o nível do aumento aplicado. Situação que se torna perceptível, sobretudo, pela demasiada majoração do valor da mensalidade do contrato de seguro de vida do idoso, quando comparada com os percentuais de reajustes anteriormente postos durante a vigência do pacto. Igualmente, na hipótese em que o segurador se aproveita do advento da idade do segurado para não só cobrir despesas ou riscos maiores, mas também para aumentar os lucros há, sim, reajuste abusivo e ofensa às disposições do CDC. Além disso, os custos pela maior utilização dos serviços de saúde pelos idosos não podem ser diluídos entre os participantes mais jovens do grupo segurado, uma vez que, com isso, os demais segurados iriam, naturalmente, reduzir as possibilidades de seu seguro-saúde ou rescindi-lo, ante o aumento da despesa imposta. Nessa linha intelectiva, não se pode desamparar uns, os mais jovens e suas famílias, para pretensamente evitar a sobrecarga de preço para os idosos. Destaque-se que não se está autorizando a oneração de uma pessoa pelo simples fato de ser idosa; mas, sim, por demandar mais do serviço ofertado. Nesse sentido, considerando-se que os aumentos dos seguros-saúde visam cobrir a maior demanda, não se pode falar em discriminação, que somente existiria na hipótese de o aumento decorrer, pura e simplesmente, do advento da idade. Portanto, excetuando-se as situações de abuso, a norma inserida na cláusula em análise - que autoriza o aumento das mensalidades do seguro em razão de o usuário completar sessenta anos de idade - não confronta o art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso, que veda a discriminação negativa, no sentido do injusto. Precedente citado: REsp 866.840-SP, Quarta Turma, DJe 17/8/2011. REsp 1.381.606-DF, Rel. originária Min. Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Min. João Otávio De Noronha, julgado em 7/10/2014. Informativo nº 0543. Período: 13 de agosto de 2014. Pela intelecção do julgado supracitado, conclui-se que: o reajuste decorrente da mudança de faixa etária não é inválido a priori, ao revés, é válido e atende à natureza do contrato, vez que autorizado pela Lei 9.656/98, em seu art. 15, o qual se aplica prevalecendo sobre o CDC, vez que em relação a este é norma especial, reguladora de uma espécie de contrato de consumo. Por outro lado, conclui-se, também, que o CDC incidirá como sobre norma, de forma que seus princípios e regras se aplicam igualmente ao contrato, tanto diretamente, como em conjunto com as normas específicas da Lei 9.656/98 e ainda na interpretação das normas contratuais. Ante as premissas apresentadas e, levando em consideração os argumentos assentados pelo Superior Tribunal de Justiça, forçoso concluir que aumento, no presente caso, decorrente da mudança de faixa etária, FORA abusivo, pelas razões que passo a expor. Tendo em vista os requisitos do art. 15 c/c 16, IV da Lei 9.656/98 e os princípios do Código de Defesa do Consumidor, pode-se afirmar que a validade da cláusula que estabeleça o reajuste pressupõe: a) Previsão expressa no contrato inicial, com indicação dos percentuais de reajuste para cada faixa etária; b) Que desta(s) cláusula(s) se dê ciência prévia ao usuário do plano, sendo ônus da operadora comprová-la; c) Que a cláusula esteja grafada com o devido destaque e em termos que facilitem sua compreensão, tornando-a de fácil visualização para o consumidor; d) Que os percentuais fixados atendam a critérios de razoabilidade, de modo a evitar que a prestação do consumidor seja desproporcional, colocando o fornecedor em vantagem excessiva, hipótese em que incidirá o disposto no art. 6º, inc. V, do CDC; e) Não esteja caracterizada a exceção prevista no parágrafo único do art. 15 da Lei 9.656/98 (consumidor com mais de 60 anos de idade e mais de 10 anos de contrato). Para se concluir, assim, pela validade ou não da cláusula contratual que estabelece o reajuste por mudança de faixa etária , há que se verificar em cada caso concreto se estes requisitos de validade foram atendidos. Assim, a resposta negativa a qualquer deles acarreta a invalidade da cláusula, quer por força do art. 15 da Lei 9.656/98 (itens a e d), quer por força das normas do CDC. Contudo, no caso em análise, o aumento ocorrido em fevereiro de 2019 no percentual de mais de 100% não se justifica dentro dos limites estabelecidos e dos parâmetros de razoabilidade, principalmente levando em consideração as variações contratuais durante o vínculo e não demonstrados pela acionada em defesa. Desta sorte, pelo contexto fático jurídico apresentado em ressonância com as provas dos autos, verifica-se que o aumento se mostrou abusivo a ponto de autorizar revisão. Ademais, não restou demonstrada previsão contratual acerca das faixas de idade, para justificar o aumento imposto ao consumidor, as operadoras e estipulantes de planos de saúde devem apresentar aos autos demonstrativos de cálculo que fundamentem como legítimo o percentual aplicado ao contrato de cada consumidor, sendo certo que tais percentuais devem refletir a variação dos custos referente ao grupo em que o consumidor é enquadrado, contudo, o sinalagma deve permanecer com os mesmos parâmetros inicialmente estabelecidos quando da contratação, sob pena de criação de impedimento a própria fruição do contrato. Diante de tal quadro, restou assentado à caracterização do ilícito civil. Desta forma mantenho a sentença em seus próprios termos. Com essas razões, foi NEGADO PROVIMENTO ao recurso da parte acionada, mantendo a sentença recorrida em seus próprios termos e fundamentos. Custas e honorários pela recorrente, estes fixados em 20% do valor da causa, nos termos do
art. 55 da
Lei 9.099/95. Ante o exposto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao Recurso Interno, por conseguinte restando ratificada, in totum, a decisão monocrática recorrida. ACÓRDÃO Realizado Julgamento do Recurso do processo acima epigrafado. A QUARTA TURMA decidiu, à unanimidade de votos, NEGAR PROVIMENTO ao Recurso Interno, por conseguinte restando ratificada, in totum, a decisão monocrática recorrida. Salvador, data registrada no sistema MARTHA CAVALCANTI SILVA DE OLIVEIRA Juíza Presidente MARY ANGÉLICA SANTOS COELHO Juíza Relatora
(TJ-BA, Classe: Recurso Inominado, Número do Processo: 0002455-69.2023.8.05.0113, Órgão julgador: QUARTA TURMA RECURSAL, Relator(a): MARY ANGELICA SANTOS COELHO, Publicado em: 17/10/2023)