PROCESSO Nº: 0802977-02.2020.4.05.8100 - APELAÇÃO CÍVEL
APELANTE:
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ADVOGADO:
(...)
APELADO: CONSELHO REGIONAL DE SERVICO SOCIAL 3 REGIAO - CRESS/CE
ADVOGADO: Sabrine
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RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Francisco Roberto Machado - 1ª Turma
JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal George Marmelstein Lima
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. ENSINO SUPERIOR. CONSELHO PROFISSIONAL. CRESS. INSCRIÇÃO DE DIPLOMA CANCELADO ADMINISTRATIVAMENTE. IMPOSSIBILIDADE. APELAÇÃO IMPROVIDA.
1. Apelação interposta por
(...) contra sentença proferida
...« (+1835 PALAVRAS) »
...pelo Juízo da 3ª Vara Federal da Seção Judiciária do Ceará que julgou improcedente o pedido inicial, nos termos do art. 487, I, do CPC, condenando a parte autora ao pagamento de honorários de sucumbência, fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (art. 85, §3º, I, do CPC), observando-se, entretanto, a suspensão da exigibilidade em razão da concessão da gratuidade de justiça, na forma do art. 98, § 3º, do CPC. 2. No caso dos autos, a apelante concluiu o Curso de Graduação em Serviço Social da Faculdade Cidade de Guanhães - FACIG em dez/2014 . Todavia, em maio/2016, seu pedido de registro profissional no Conselho Regional de Serviço Social do Ceará-CRESS/CE foi indeferido, sob o fundamento de que "a instituição que lhe outorgou o diploma não tem autorização para ministrar o curso de Serviço Social fora da sua sede, que se localiza na cidade de Guanhães em Minas Gerais", bem como que "a requerente foi aluna do Curso de Extensão em Teoria e Práticas em Serviço Social do Município de Quixadá no Estado do Ceará, ofertado pelo Centro de Educação e Tecnologia Castelo Branco, verificando-se em decorrência disso que a mesma, provavelmente, aproveitou a formação nesse curso de extensão como parte do que deveria ser a formação no Curso de Graduação em Serviço Social", destacando que "O entendimento do Conselho Nacional de Educação (CNE) é pacífico quando resolve sobre o assunto no sentido que não pode haver aproveitamento acadêmico de disciplinas em cursos de níveis diferentes". Registre-se ainda que após procedimento administrativo realizado pelo Ministério da Educação e Cultura, a referida instituição de ensino foi descredenciada e os diplomas expedidos cancelados, dentre os quais o da recorrente, nos termos da Portaria nº 770/2018. 3. O cerne da questão diz respeito à possibilidade de registro profissional da parte autora no Conselho réu, em que pese o cancelamento superveniente do diploma. 4. O art. 22, inciso XVI, da Constituição Federal dispõe expressamente que é competência privativa da União legislar sobre "diretrizes e bases da educação nacional". Com a finalidade de regulamentar o mandamento constitucional, a Lei nº 9.394/96 estabelece no art. 9º as atribuições do ente federal, in verbis: "VII - baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação; VIII - assegurar processo nacional de avaliação das instituições de educação superior, com a cooperação dos sistemas que tiverem responsabilidade sobre este nível de ensino; IX - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino". 5. Ademais, observa-se ainda que é a Secretaria de Educação Superior-SERES, do Ministério da Educação-MEC, o órgão responsável pela fiscalização de irregularidades nos cursos de graduação, nos termos do art. 45 do Decreto nº 5.773/2006, o qual determina que "a Secretaria competente exercerá as atividades de supervisão relativas aos cursos de graduação e sequenciais e às instituições de educação superior que os ofertam". Logo, infere-se que a apuração de irregularidades existentes no âmbito do ensino superior é atribuição do MEC, não cabendo aos Conselhos profissionais impor restrições contra os egressos de instituições de ensino superior autorizadas pelo MEC. 6. Nesta perspectiva, infere-se que o CRESS/CE extrapolou de suas atribuições ao obstar a inscrição profissional da parte autora, uma vez que a atuação do Conselho discrepa de sua atividade institucional, que corresponde à fiscalização profissional e não valoração da formação acadêmica dos graduados. Assim, "aos conselhos profissionais, de forma geral, cabem tão somente à fiscalização e o acompanhamento das atividades inerentes ao exercício da profissão, o que certamente não engloba nenhum aspecto relacionado à formação acadêmica. Esta compreensão não retira o papel fiscalizador do CONFEA e dos CREA's no tocante aos cursos superiores de Engenharia e Agronomia; muito pelo contrário, esta tarefa é deveras relevante, porquanto qualquer irregularidade descoberta deve ser imediatamente comunicada aoMinistério da Educação, a fim de que tome as atitudes pertinentes" [STJ - REsp 1453336/RS - Primeira Turma - Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho - Julgamento: 26/08/2014]. 7. Todavia, conforme narrado acima, fatos supervenientes alteraram a situação da recorrente, de modo que o cancelamento do registro do diploma impossibilita a inscrição almejada. Ressalte-se que a Lei nº 8.662/93, que dispõe sobre a profissão de Assistente Social e dá outras providências, determina expressamente no art. 2º, inciso I, que "Somente poderão exercer a profissão de Assistente Social: I - Os possuidores de diploma em curso de graduação em Serviço Social, oficialmente reconhecido, expedido por estabelecimento de ensino superior existente no País, devidamente registrado no órgão competente". Adiante, o art. 10, inciso I, estabelece que "Compete aos CRESS, em suas respectivas áreas de jurisdição, na qualidade de órgão executivo e de primeira instância, o exercício das seguintes atribuições: I - organizar e manter o registro profissional dos Assistentes Sociais e o cadastro das instituições e obras sociais públicas e privadas, ou de fins filantrópicos". 8. Neste contexto, reproduzo excerto da sentença combatida que adoto como razão de decidir: "Conforme citado pelo CRESS em sua contestação, a Faculdade Cidade de Guanhães encontra-se atualmente extinta, o que se evidencia por meio de uma simples consulta ao sitio do Ministério da Educação (https://emec.mec.gov.br/emec/consulta-cadastro/detalhamento-ies-descredenciadas/d96957f455f6405d14c6542552b0f6eb/NDQ0Ng==/da89e1f8b4a1484def4a2d634e4dea8c/MQ==- acessado em 06/08/2020). Naquele sítio verifica-se que a referida IES foi descredenciada por meio de Portaria MEC de n.º 770/2018, em ato do Poder Público que trouxe sérias repercussões a uma grande parcela dos diplomas por ela expedidos, conforme abaixo pode se ver: PORTARIA Nº 770, DE 29 DE OUTUBRO DE 2018 Dispõe sobre a aplicação de penalidade de descredenciamento à Faculdade Cidade de Guanhães-FACIG (código e-MEC nº 4446), mantida pela Sociedade Educacional de Guanhães Ltda - EPP (cód. e-MEC 2814), CNPJ nº 0.336.817/0001-84. Processo administrativo de supervisão nº 23000.023729/2016-25. O SECRETÁRIO DE REGULAÇÃO E SUPERVISÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR, no uso das atribuições que lhe confere o Decreto nº 9.005, de 14/03/2017, tendo em vista o Decreto nº 9.235, de 15/12/2017, e a Portaria MEC nº 315, de 04/04/2018, adotando os fundamentos expressos na Nota Técnica nº 108/2018/CGSOTÉCNICOS/DISUP/SERES determina: Art. 1º A aplicação da penalidade de descredenciamento à Faculdade Cidade de Guanhães -FACIG (cód. e-MEC 4446), mantida pela Sociedade Educacional de Guanhães Ltda. -EPP, (cód. e-MEC 2814), e a desativação de seus cursos, nos termos do art. 73, inciso II, alínea a e d do Decreto 9.235/2017. Art. 2º A identificação e o cancelamento imediato, pela Faculdade Cidade de Guanhães (cód. e-MEC 4446), de eventuais diplomas expedidos de cuja análise fique evidenciada a sua irregularidade a partir da identificação de uma das seguintes situações, entre outras, que violem o marco regulatório educacional: I) oferta de educação superior sem o devido ato autorizativo; II) oferta de educação superior em desconformidade com os atos autorizativos da IES, entre eles o quantitativo de vagas autorizadas para os seus cursos de graduação e o local autorizado para a oferta; III) terceirização de atividade finalística educacional, sob quaisquer designações, incluindo cursos livres equivocadamente caracterizados como de extensão, na oferta de educação superior; IV) convalidação ou aproveitamento irregular de estudos ofertados por instituições credenciadas ou não para a oferta de educação superior, sob quaisquer denominações, incluindo cursos livres equivocadamente caracterizados como de extensão, para acesso à educação superior; V) diplomação de estudantes cuja formação tenha ocorrido em desconformidade com a legislação educacional; VI) expedição de diplomas de alunos não declarados no Censo da Educação Superior do Inep. Art. 3º Serão considerados regulares apenas os diplomas expedidos e registrados em nome de estudantes que tenham concluído cursos de graduação no endereço de funcionamento da Faculdade Cidade de Guanhães - FACIG (cód. e-MEC 4446) até 2015, em conformidade com os dados constantes na última declaração da IES ao Censo da Educação Superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (...) - Inep. (grifo nosso) [...] Dessa forma, o art. 3º da referida Portaria dispõe que 'serão considerados regulares apenas os diplomas expedidos e registrados em nome de estudantes que tenham concluído cursos de graduação no endereço de funcionamento da Faculdade Cidade de Guanhães - FACIG (cód. e-MEC 4446) até 2015, em conformidade com os dados constantes na última declaração da IES ao Censo da Educação Superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (...) - Inep'. Nesse contexto, em consulta ao sítio mantido pela própria Instituição de Ensino UNIG ( http://191.252.66.195/diplomas/principal/ - acessado em 06/08/2020), é possível observar que o diploma da autora teve seu registro cancelado, fato este que inclusive foi admitido pela própria autora em petição de id. n.º 4058100.18137937". 9. Diante do exposto, depreende-se que o cancelamento do diploma da parte autora após procedimento administrativo efetuado pelo MEC obsta o registro no Conselho profissional, visto que se trata de documento inapto a concretizar tal pretensão. 10. Neste sentido, "Ocorre que o respectivo diploma apresentado pela Autora, teve o seu registro cancelado pela própria IES, tendo em vista as irregularidades apontadas no Processo administrativo de Supervisão nº 23000.023729/2016-25, culminando com o descredenciamento da FACIG, por meio da publicação da Portaria nº 770, de 29 de outubro de 2018, conforme documentação acostada aos autos. De acordo com o art. 3º, da referida Portaria, o cancelamento do diploma da Autora determinado pelo MEC deu-se em função de a Instituição de Ensino ter ofertado curso de Serviço Social fora de sua sede, que é na cidade de Guanhães/MG. Dessa forma, o CRESS não extrapolou seu âmbito de atribuição ao negar o Registro Profissional da Autora nos seus quadros diante do cancelamento do seu Diploma por meio de ato normativo da própria Instituição de Ensino. Considerando que já existe pronunciamento expresso do MEC acerca da irregularidade dos Diplomas de cursos de graduação realizados pela FACEOPAR fora do endereço de funcionamento daquela Instituição de Ensino (Laranjeiras do Sul/PR), não há que falar em de direito líquido e certo da Apelante ao Registro Profissional no CRESS. Precedente: (TRF5 - Processo 0800816-10.2020.4.05.8200 - Rel. Desembargador Federal Rogério Fialho, julgado em 06/05/2021)" [TRF5 - Processo nº 08055938120194058100 - Terceira Turma - Rel. Des. Fed. Cid Marconi - Julgamento: 05/08/2021]. 11. Conforme ressaltado na sentença: "Em que pese a tese autoral, e o fato de que à época do indeferimento perpetrado pelo Conselho Profissional o diploma estar válido, o que autorizaria o seu registro, não há como desprezar a realidade atual de que o diploma da autora foi cancelado, no contexto de ação fiscalizatória promovida pelo Ministério da Educação - MEC, com o claro intuito de coibir irregularidades que foram promovidas pela IES. Pelo que se depreende de tudo que foi apresentado nos autos, a Faculdade Cidade de Guanhães foi obrigada a promover o cancelamento de diplomas que estivessem em situação de clara violação do marco regulatório educacional, conforme disposto no art. 2º da Portaria MEC n.º 770/2018, dentre eles o da autora. Dessa forma, ante tal fato superveniente ao ato de indeferimento promovido pelo CRESS, não há como o Judiciário chancelar a tese delineada na exordial: tendo a autora plena ciência do ocorrido com o seu diploma em 2018, ao ajuizar a presente demanda agora em desfavor do CRESS/CE no ano de 2020, busca a autora, mesmo que por via reflexa, uma espécie de 'revalidação' do seu diploma, com a finalidade única de efetivar o registro da autora junto ao Conselho Profissional, fazendo-se uso de documento cuja irregularidade na expedição foi reconhecida pela própria IES, estando o mesmo efetivamente cancelado. Nesses termos, não há como prosperar tal pretensão". Precedentes.
12. Apelação improvida.
(TRF-5, PROCESSO: 08029770220204058100, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL LEONARDO AUGUSTO NUNES COUTINHO (CONVOCADO), 1ª TURMA, JULGAMENTO: 28/04/2022)