PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. CAUSA MADURA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RUÍDOS. QUÍMICOS. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA EM PARTE. REAFIRMAÇÃO DA DER. REQUISITOS CUMPRIDOS. BENEFÍCIO DEFERIDO.
1. No caso concreto, a r. sentença reconheceu tempo de serviço especial e determinou a implantação do benefício de aposentadoria se preenchidos os requisitos legais a tanto. A sentença condicional é nula a teor do
parágrafo único do
artigo 492 do
Código de Processo Civil. De outro lado, o julgamento imediato é possível, pela teoria da causa madura, nos termos do
artigo 1.013...« (+1769 PALAVRAS) »
..., § 3º, inciso II, do Código de Processo Civil.2. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei Federal nº 8.213/91. A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei Federal nº 8.213/91.3. É cediço que a sentença trabalhista é admitida como início de prova material para fins previdenciários; contudo, o título judicial só pode ser considerado se fundado em elementos que demonstrem o labor exercido e os períodos alegados pelo trabalhador, nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, excetuado, portanto, os casos originados pela decretação da revelia da reclamada ou de acordo entre as partes, ante a inexistência de provas produzidas em Juízo.4. No caso em análise, não houve o comparecimento da reclamada à audiência ou a produção de quaisquer provas a fim de resolver a controvérsia sobre a existência do vínculo empregatício, o qual foi reconhecido em razão da revelia.5. A sentença trabalhista alicerçada apenas na revelia do empregador não constitui meio idôneo para o reconhecimento do período para fins previdenciários.6. Nesse caso, portanto, o período de 27/02/2002 a 03/10/2006 não pode ser averbado como tempo comum.7. O artigo 57 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei Federal nº. 9.032/1995: “A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei”.8. Com relação aos agentes químicos, a sua simples manipulação, em especial em se tratando de hidrocarbonetos, gera presunção de risco em razão da exposição a produtos potencialmente cancerígenos. A presença da substância no ambiente é suficiente para expor a risco a saúde do trabalhador, com eventuais danos irreversíveis.9. Ademais, “segundo o Anexo 13 da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a agentes químicos à base de hidrocarbonetos e organofosforados têm sua intensidade medida a partir de análise qualitativa, bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor. Para o agente nocivo químico, por ser qualitativo, não há falar em medição de intensidade, constando do formulário a efetiva exposição sofrida pelo autor, de modo habitual e permanente” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApelRemNec 0014409-39.2017.4.03.9999, Intimação via sistema: 05/03/2021, Rel. Des. Fed. INES VIRGINIA PRADO SOARES).10. Em se tratando de agente nocivo ruído, a comprovação da exposição demanda avaliação técnica para se aferir o nível em relação aos limites de tolerância estabelecidos nos diversos períodos. Trata-se, como já visto, de avaliação quantitativa.11. Nesse sentido, o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.12. O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.13. De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.14. A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.15. O STJ, no julgamento do REsp. nº 1.398.260/PR (1ª Seção, j. 14/05/2014, DJe: 05/12/2014, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN), representativo de controvérsia, reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06-03-1997 a 18-11-/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.16. Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, ressalto que inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado.17. Quanto à especialidade, a controvérsia nos presentes autos corresponde ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 06/05/1979 a 02/08/1984, 03/11/1987 a 06/06/1995, 06/03/1997 a 13/02/1998, 16/02/1998 a 26/04/2001, 04/06/2001 a 14/12/2001 e 30/08/2007 a 01/12/2010.18. 06/05/1979 a 02/08/1984 (REDE ARTIGOS ESPORTIVOS LTDA). Neste período, o Laudo Pericial (fls. 04 ID 153175439) apenas relata que a parte autora fazia redes para trave de futebol manualmente e o matéria prima era nylon, trabalhou na prensa para corte de couro fazer os gomos da bola de futebol. A parte autora não provou o exercício de atividade especial, porque no Laudo Pericial (fls. 04 ID 153175439) não há prova da exposição a agentes considerados nocivos à saúde de maneira habitual e permanente e que legitimem o cômputo de tempo especial.19. 03/11/1987 a 06/06/1995 (CENTRAL CITRUS INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA). Nesse período, a parte autora trabalhou no cargo de “auxiliar de linha de produção”, exposta a ruído de 95,2 dB (A), enquadrado no código 1.1.6, Anexo do Decreto Federal nº 53.831/64 (Laudo Técnico Judicial – fls. 09, ID 153175439). Nesse caso, porque o nível do ruído é superior ao limite estabelecido, deve ser reconhecido como especial.20. 06/03/1997 a 13/02/1998 (MEFSA MECANICA E FUNDICAOSANTO ANTONIO LTDA). Nesse período, a parte autora trabalhou no cargo de “ajudante de produção”, exposto a ruído de 95,2 dB (A), enquadrado no código 2.0.1, Anexo IV do Decreto Federal nº 2.172/97 (Laudo Técnico Judicial – fls. 09, ID 153175439). Nesse caso, portanto, porque o nível do ruído é superior ao limite estabelecido, deve ser reconhecido como especial.21. 16/02/1998 a 26/04/2001 (FISCHER S/A AGROINDÚSTRIA). Nesse período, a parte autora trabalhou no cargo de “operador de refrigeração”, exposto a ruído de 92,1 dB (A), enquadrado no código 2.0.1, Anexo IV do Decreto Federal nº 2.172/97 (Laudo Técnico Judicial – fls. 09, ID 153175439). Nesse caso, portanto, porque o nível do ruído é superior ao limite estabelecido, deve ser reconhecido como especial.22. 04/06/2001 a 14/12/2001 (LOUIS DREYFUS COMMODITIES AGROINDUSTRIAL S/A). Nesse período, a parte autora trabalhou no cargo de “servente industrial”, exposto a ruído de 95,2 dB (A), enquadrado no código 2.0.1, Anexo IV do Decreto Federal nº 2.172/97 (Laudo Técnico Judicial – fls. 09, ID 153175439). Nesse caso, portanto, porque o nível do ruído é superior ao limite estabelecido, deve ser reconhecido como especial.23. 30/08/2007 a 01/12/2010 (MEFSA MECANICA E FUNDICAOSANTO ANTONIO LTDA). Nesse período, a parte autora trabalhou no cargo de “servente de obra”, exposta a agentes químicos (tolueno e xileno), enquadrados nos códigos 1.2.11, Anexo do Decreto nº 53.831/64, 1.2.10, Anexo I, do Decreto nº 83.080/79, 1.0.17, Anexo IV, do Decreto nº 2.172/97 e 1.0.17, Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99 (PPP – fls. 11, ID – 153175439). A análise da especialidade em resultante da exposição a agentes químicos inseridos no Anexo 13 da Norma Regulamentadora nº 15 é qualitativa e não depende de limites de tolerância. Portanto, deve ser reconhecida a especialidade do período de 30/08/2007 a 01/12/2010.24. Devem ser considerados como especiais os períodos de 03/11/1987 a 06/06/1995, 06/03/1997 a 13/02/1998, 16/02/1998 a 26/04/2001, 04/06/2001 a 14/12/2001 e 30/08/2007 a 01/12/2010.25. Os períodos registrados em CTPS são suficientes para garantir o cumprimento da carência, de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei Federal nº 8.213/1991.26. O Superior Tribunal de Justiça, no regime de que tratava o artigo 543-C, do Código de Processo Civil de 1.973, fixou a seguinte tese: “É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir” (1ª Seção, REsp 1.727.064/SP, DJe 02/12/2019, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).27. Ademais, no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Especial Repetitivo nº 1.727.063, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que: “Quanto à mora, é sabido que a execução contra o INSS possui dois tipos de obrigações: a primeira consiste na implantação do benefício, a segunda, no pagamento de parcelas vencidas a serem liquidadas e quitadas pela via do precatório ou do RPV. No caso de o INSS não efetivar a implantação do Superior Tribunal de Justiça benefício, primeira obrigação oriunda de sua condenação, no prazo razoável de até quarenta e cinco dias, surgirão, a partir daí, parcelas vencidas oriundas de sua mora. Nessa hipótese deve haver a fixação dos juros, embutidos no requisitório de pequeno valor (STJ, 1ª Seção, EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1727063/SP, j. 19.05.2020, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES)”.28. Desse modo, computando-se os períodos de atividades especiais reconhecidos nos autos, até a data em que a parte autora preencheu os requisitos (11/07/2012), totaliza-se o tempo necessário para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, conforme planilha anexa.29. Assim, reconhece-se o direito da parte autora à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da reafirmação da DER em 21/08/2019.30. Considerando que a documentação necessária ao reconhecimento do direito ao benefício não foi apresentada no âmbito administrativo, mas apenas nesta demanda judicial, o termo inicial dos efeitos financeiros do benefício deverá ser fixado na fase de cumprimento de sentença, conforme entendimento que vier a ser consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no exame do tema 1.124.
31. Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora na esfera administrativa.
32. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947, até a edição da
EC 113/2021, a partir de quando será aplicada exclusivamente a taxa Selic.
33. Sentença anulada de ofício. Pedido inicial parcialmente procedente. Apelação do INSS prejudicada.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5039647-33.2021.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal JEAN MARCOS FERREIRA, julgado em 25/04/2024, DJEN DATA: 02/05/2024)