APELAÇÃO. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CONSIGNATÓRIA EM PAGAMENTO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. SENTENÇA ULTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA EM SENTENÇA QUE VISAVA SOMENTE DAR EFETIVIDADE AO JULGADO. PES. PERÍCIA CONTÁBIL. COMPROVADO DESCOMPASSO NA ATUALIZAÇÃO DA DÍVIDA E CLÁUSULAS DO CONTRATO. EFEITOS DA MORA. DEPÓSITO INTEGRAL DAS PARCELAS. PROVIDÊNCIA NÃO ATENDIDA PELOS AUTORES. EFETUADO O PAGAMENTO A MENOR, CONTINUAM INCIDINDO ENCARGOS MORATÓRIOS SOBRE OS VALORES REMANESCENTES. APELOS NÃO PROVIDOS.
1.A antecipação de tutela na sentença,
... +865 PALAVRAS
...com respaldo no artigo 273, inciso I do CPC/73 não configura por si só o alegado julgamento ultra petita, na medida em que não foi proferida decisão de natureza diversa do pedido formulado na exordial.
2. As decisões ultra petita não ensejam a nulidade no julgado, haja vista a possibilidade de decote da parte que extrapola o pedido da parte autora.
3. A antecipação dos efeitos da tutela, destinou-se, na realidade, a dar plena efetividade ao julgado, dentro dos limites do pedido formulado e reconhecido pela sentença ora impugnada, ainda mais se tratando de ação de consignação em pagamento e não viola o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/2073, vigente na ocasião.
4. Da leitura do contrato de mútuo, vê-se que foram adotados, para o reajuste das prestações, o Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional - PES/CP; para o reajuste do saldo devedor, os mesmos índices de correção das cadernetas de poupança livres; e para a amortização do débito, a Tabela Price.
5. O Sistema Financeiro de Habitação - SFH, foi instituído pela Lei nº 4.380, de 21 de agosto de 1964, com o objetivo de estabelecer políticas públicas a fim de facilitar e promover a construção e a aquisição da casa própria ou moradia, especialmente pelas classes de menor renda da população.
6. Com fundamento na legislação que veio regulamentar a matéria, ficou estabelecido que, a partir de 1985, o reajuste das prestações mensais do mútuo habitacional seria realizado de acordo com o percentual de aumento salarial da categoria profissional do mutuário.
7. A partir de 1991, com a entrada em vigor da Lei nº 8.177, de 1 de março de 1991, estabeleceu-se para o reajuste do saldo devedor e das prestações dos contratos do SFH, o mesmo índice utilizado para corrigir os depósitos da poupança.
8. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido da validade dessas modificações legislativas acerca dos critérios de atualização do saldo devedor e reajuste das prestações mensais, vinculadas aos contratos de mútuo habitacional, celebrados sob as regras do Sistema Financeiro da Habitação.
9. Na hipótese dos autos, realizada a perícia técnica contábil, conclui o expert nomeado pelo D. Juízo a quo, que a CEF a ré descumpriu, em certos períodos, a cláusula que garantia aos autores observância do critério acima descrito no reajuste das prestações, principalmente pela não observância da periodicidade.
10. Nos termos do artigo 370 do CPC/15 (correspondente ao artigo 130 do CPC/73), a realização da perícia se faz necessária, quando as razões e documentos consignados nos autos, não se mostram suficientes para convencer o magistrado acerca da verossimilhança das alegações. Entretanto, não se configura cerceamento de defesa quando do indeferimento de diligências inúteis ou meramente protelatórias, cabendo ao juízo determinar as provas necessárias à instrução do processo.
11. Apelante que deixou de trazer aos autos elementos suficientes para afastar as conclusões apontadas pelo Perito, se limitando a reiterar genericamente os argumentos exarados em manifestações anteriores.
12. Na ausência de qualquer elemento que desabone o laudo pericial, há de se conferir prevalência aos seus apontamentos, mesmo porque o expert nomeado pelo juízo é agente processual da confiança do magistrado sentenciante, assumindo posição equidistante das partes.
13. A consignação em pagamento, prevista no artigo 335, do Código Civil/2002 tem por finalidade afastar os efeitos da mora nas hipóteses de recusa ou impossibilidade do credor em receber o pagamento ou dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento. Trata-se, portanto, de alternativa liberatória para o sujeito passivo, sempre que se tornar inviável o pagamento voluntário da obrigação, como na hipótese dos autos, em que se verifica a divergência quanto ao método de atualização da dívida.
14. O procedimento vinha regulamentado nos artigos 890 e seguintes do CPC/73, vigente à ocasião do ajuizamento da ação, mas é o artigo 336 do Código Civil que disciplina acerca de sua validade e força de pagamento, ao dispor que o depósito judicial compreenda o mesmo objeto que seria preciso prestar para que o pagamento pudesse extinguir a obrigação.
15. Assim, conforme entendimento consolidado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, que reflete, inclusive, na redação da Súmula 380, somente o depósito integral das prestações, tem o condão de ilidir os efeitos da mora.
16. Mesmo havendo dúvida razoável acerca do valor da prestação, passível de ser dirimida somente mediante a realização de perícia técnica contábil, a jurisprudência dos tribunais é firme ao considerar que, somente mediante o depósito judicial das parcelas vencidas e também daquelas que se vencerem no curso da ação, em sua integralidade, considerando, portanto, tanto os valores controversos, como aqueles incontroversos, o mutuário obterá a suspensão dos efeitos da mora.
17. Na hipótese dos autos, além de não vislumbrar o depósito integral das parcelas desde o ajuizamento da ação, até no mínimo a prolação da sentença, o próprio laudo pericial denota que houve a insuficiência dos valores efetivamente depositados, não havendo que se falar em extinção da obrigação, tampouco no afastamento dos efeitos da mora, conforme pretendem os Apelantes.
18. A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que a consignação em pagamento somente afasta a mora em relação aos valores depositados, de modo que, efetuado o pagamento a menor, continuam incidindo encargos moratórios sobre os valores remanescentes. (AgInt no REsp 1873375/DF, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 23/11/2020, DJe 17/12/2020)
19. A manutenção da condenação dos autores ao pagamento das diferenças entre os valores depositados e aqueles efetivamente apurados após a revisão das prestações, incidindo, em relação a essas parcelas, os efeitos da mora, nos termos do contrato firmado pelas partes, é medida que se impõe.
20. Recursos de apelação a que se nega provimento.
(TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0701116-35.1996.4.03.6106, Rel. Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, julgado em 10/03/2023, DJEN DATA: 14/03/2023)