DECISÃO Vistos, etc. Cuidam os autos de Recurso Especial (ID 67712906) interposto CLERISTA SANTOS DE SALES, com fulcro no
art. 105,
inciso III, alínea a, da
Constituição Federal, em face de acórdão que, proferido pela Primeira Turma da Primeira Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, conheceu e negou provimento aos apelos interpostos (ID 66595320). Alega, em suma, que o acórdão vergastado ofendeu os
arts. 59,
61, caput e
inciso II, alínea g, 71, todos do
Código Penal,
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...370, §1º e 564, inciso III, alínea o, ambos do Código de Processo Penal, 5º, incisos LV e LX e 93, inciso IX, ambos da Carta Magna. Contrarrazões apresentadas pelo Ministério Público, ID 68420649. É o relatório. De início cumpre-se esclarecer que a ofensa aos arts.5º, incisos LV e LX e 93, inciso IX, ambos da Carta Magna, é objeto de recurso próprio (recurso extraordinário), não amparado no âmbito do recurso especial, a teor do disposto no art. 102, inciso III, da Carta Política. Exsurge da análise das razões recursais a pretensão do recorrente de reforma do acórdão combatido, ao fundamento de violação aos arts. 59, 61, caput e inciso II, alínea g, 71, todos do Código Penal e 370, §1º e 564, inciso III, alínea o, ambos do Código de Processo Penal, com o fito de nulidade absoluta, em razão da ausência de intimação dos patronos acerca da sessão de julgamento e do acórdão, afastamento da agravante, sob alegação de bis in idem, redução da pena-base para o mínimo legal, e afastamento da aplicação da regra do crime continuado. O apelo nobre em análise não reúne condições de admissibilidade. Com efeito, o acórdão recorrido encontra-se assim ementado (ID 66595320):APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO DUPLAMENTE QUALIFICADO. AFASTADA A TESE DE ABSOLVIÇÃO. ACERVO PROBATÓRIO ROBUSTO CAPAZ DE LASTREAR A DECISÃO DE CONDENAÇÃO DAS RÉS. DEPOIMENTOS COLHIDOS EM JUÍZO QUE APONTAM AS RECORRIDAS COMO AS AUTORAS DO CRIME CORROBORADOS POR LAUDOS PERICIAIS. RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA. PLEITO DE RETIRADA DA AGRAVANTE CONSTANTE NO ART. 61, II, “G”, CP. NÃO PROVIMENTO. ABUSO DE CONFIANÇA E CONCURSO DE PESSOAS EVIDENCIADOS. UMA DAS QUALIFICADORAS UTILIZADA PARA TIPIFICAR O TIPO PENAL DE FURTO QUALIFICADO E A OUTRA APLICADA PARA EXASPERAR A PENA-BASE. PRECEDENTE STJ. CONTINUIDADE DELITIVA DEMONSTRADA. PATAMAR MÁXIMO CORRETAMENTE APLICADO EM VISTA DA ELEVADA QUANTIDADE DE VEZES DA PRÁTICA DELITIVA. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR OUTRAS MEDIDAS DIANTE DO QUANTUM DA PENALIDADE ESTABELECIDA. PREJUÍZO EXPERIMENTADO PELA VÍTIMA DE ALTO VALOR. INDENIZAÇÃO CORRETAMENTE FIXADA. APELAÇÕES CONHECIDAS E NÃO PROVIDAS. I – As Apelantes foram condenadas pela prática do delito previsto no art. 155, §4º, II e IV c/c art. 71, todos do Código Penal, ao cumprimento da pena, por cada uma delas, de 5 anos e 6 meses de reclusão, inicialmente no regime semiaberto (art. 33, §2º, “b”, do Código Penal), e ao pagamento da quantia de R$935.108,98 como reparação dos prejuízos sofridos pela vítima, além das custas processuais, sendo-lhes concedido o direito de recorrer em liberdade. O delito examinado neste recurso consiste na subtração para si de valores pertencentes a um estabelecimento comercial durante um período de mais de 3 (três) anos, totalizando a quantia de R$935.108,98 (novecentos e trinta e cinco mil, cento e oito reais e noventa e oito centavos), resultante de 3.107 transações comerciais sonegadas ardilosamente da contabilidade da empresa. Relata-se que as Apelantes, em unidade de desígnios, aturam da maneira anteriormente descrita quando eram funcionárias do estabelecimento comercial. Enquanto a Segunda Recorrente, exercendo a sua função perante o caixa de saída, separava durante o dia as vendas à vista em espécie, que era do seu interesse, ocultando os boletos e os seus valores correspondentes, a Primeira Apelante, que trabalhava no setor administrativo, incumbia-se de emitir o relatório final sem constar os devidos boletos omitidos, através de recurso oferecido pelo sistema de informática que realizava o processamento do caixa. A vítima, funcionários do estabelecimento comercial e clientes prestaram depoimentos em ambas as ocasiões apresentando relatos semelhantes, apontando as Apelantes como as autoras do delito. Laudos Periciais acerca do exame realizado nos documentos e mídias referentes à esfera contábil do estabelecimento comercial também apontaram a fraude por elas operada. Estas, por sua vez, negaram a prática delitiva, tanto na delegacia, quanto em Juízo. II - Inconformada, a Primeira Recorrente pugna pelo decote da agravante constante no art. 61, II, “g”, do Código Penal, por configurar bis in idem, diante do uso do abuso de confiança como justificativa para exasperar a pena-base. Requer, ainda, o afastamento da aplicação da regra do crime continuado, diante da inexistência de comprovação acerca da alegação de o crime teria sido cometido por 3.107 vezes, ou, subsidiariamente, pela redução do patamar aplicado ao mínimo previsto, estabelecendo-se a menor pena constante no art. 155, do Código Penal, substituindo-se a penalidade de reclusão por outras medidas. A Segunda Apelante, por sua vez, também apresentou suas razões recursais, suplicando por sua absolvição diante da insuficiência de provas para a condenação (art. 386, II, V e VII, do Código de Processo Penal). Subsidiariamente, pugna por reforma na dosimetria para reduzir a pena ao mínimo legal, afastando-se a agravante constante no art. 61, II, “g”, do Código Penal, e a circunstância do crime continuado, ou, alternativamente, a aplicação deste no seu patamar mínimo, estabelecendo-se a pena no mínimo legal e substituindo-a por medida diversa da privativa da liberdade. Por fim, requer o afastamento do valor arbitrado para reparação do dano, por entender não ter restado evidenciado o suposto prejuízo sofrido pela vítima. III – Do exame do conjunto probatório, constata-se que a materialidade e a autoria delitivas encontram-se suficientemente demonstradas a partir dos depoimentos da vítima, dos funcionários e dos clientes do estabelecimento comercial, prestados em ambas as oportunidades, extra e judicial, estando harmônicos e convergentes com os resultados apresentados nos laudos das perícias realizadas nos documentos e arquivos do sistema utilizado na empresa. A negativa apresentada nas ocasiões pelas Apelantes encontra-se isoladas no caderno processual. Por outro lado, observa-se ter sido formulado na instrução criminal conjunto probatório constituído por provas produzidas sob o contraditório e a ampla defesa que guardam harmonia e coerência entre si indicando as Apelantes como os autores do fato delitivo. Saliente-se inexistirem motivos para desmerecer ou desacreditar do depoimento da vítima e das testemunhas, sendo a prova válida, quando amparada nas demais provas constantes no processo, e suficiente para ensejar a condenação. O entendimento da jurisprudência, de maneira uníssona, é no sentido de reconhecer relevante importância à narrativa do ofendido quando se trata de crimes patrimoniais (AgRg no AREsp n. 2.192.286/RS, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 16/5/2023, DJe de 19/5/2023). Da mesma forma, o concurso de pessoas e o abuso de confiança, restaram devidamente evidenciados a partir dos relatos da vítima e das testemunhas em ambas as oportunidades, as quais afirmaram, de maneira uníssona, que, enquanto uma das Apelantes separava durante o dia as vendas à vista em espécie, que era do seu interesse, ocultando os boletos e os seus valores correspondentes, a outra incumbia-se de emitir o relatório final sem constar os devidos boletos omitidos, através de recurso oferecido pelo sistema de informática que realizava o processamento do caixa. A continuidade delitiva, por sua vez, também se encontra evidenciada conforme os laudos periciais que atestaram a ocorrência das omissões de vendas nos relatórios por elas apresentados por mais de 3.000 vezes. Restam, portanto, suficientemente demonstradas a autoria e a materialidade delitivas, mantendo-se a condenação das Apelantes como incursas nas penas do art. 155, § 4º, II e IV, c/c art. 71, todos do Código Penal, não merecendo guarida o pleito absolutório. IV – Na dosimetria, verifica-se que, para ambas as rés, o magistrado aplicou a agravante prevista no art. 61, II, “g”, do Código Penal, em vista de ter sido o delito praticado com abuso de confiança. Observa-se que, em verdade, o Juízo a quo utilizou uma das qualificadoras pelas quais os sentenciados foram condenados, qual seja o abuso de confiança (art. 155, §4º, II, do Código Penal), para exasperar a pena-base, aplicando o concurso de pessoas para tipificar a conduta como furto qualificado (art. 155, §4º, IV, do Código Penal), não havendo que se falar em bis in idem. Da mesma forma, o crime continuado restou expressivamente evidenciado, a partir dos laudos periciais que concluíram pela prática do delito por 3.107 vezes, inexistindo dúvidas de que se deve aplicar o maior patamar previsto no arr. 71 do Código Penal ao caso concreto. É nesse sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no HC n. 892.118/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 15/4/2024, DJe de 18/4/2024.). V - Assim, mantendo-se a penalidade estabelecida na sentença vergastada, de 5 anos e 6 meses de reclusão, não é possível acolher a súplica de substituição da pena privativa de liberdade por outras medidas, por tratar-se de quantum superior a 4 anos (art. 44, I, do Código Penal). VI - Por fim, a condenação ao pagamento do valor de R$935.108,98 como reparação dos prejuízos sofridos pela vítima está suficientemente justificado diante do desfalque volumoso causado pelas Apelantes, em conformidade com o quanto previsto no art. 387, IV, do Código de Processo Penal. Desta feita, também não há razão para acolher os pleitos subsidiários formulados pelas Apelantes, estando a dosimetria da pena operada em conformidade com a legislação e a jurisprudência pátrias. VII - Por todo o exposto, julga-se pelo conhecimento e não provimento do apelo, mantendo-se integralmente a sentença vergastada. O pleito do recorrente de infirmar as conclusões do acórdão recorrido, referente a redução da pena-base para o mínimo legal e afastamento da aplicação da regra do crime continuado, demandaria, necessariamente, indevida incursão no acervo fático-probatório delineado nos autos, providência que se revela inviável, nos termos da Súmula 7, do Superior Tribunal de Justiça, vazada nos seguintes termos: […] 2. Não há falar em ofensa aos arts. 59 e 68 do Código Penal, pois o Tribunal de origem fundamentou a avaliação negativa das circunstâncias judiciais em elementos concretos, extraídos da dinâmica delitiva específica do caso e não inerentes ao tipo penal, os quais justificam a necessidade de agravamento da sanção. 3. A revisão da dinâmica delitiva com o objetivo de afastar os argumentos empregados na dosimetria da pena pelas instâncias ordinárias exigiria reexame fático-probatório, o que encontra óbice da Súmula n. 7/STJ. 4. Agravo regimental desprovido.(AgRg no AREsp n. 2.009.827/CE, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 22/11/2022, DJe de 28/11/2022). […] 6. Esta Corte tem entendido que a dosimetria da pena só pode ser reexaminada em recurso especial quando se verificar, de plano, a ocorrência de erro ou ilegalidade, o que não se constata na hipótese. 7. As instâncias ordinárias destacaram elementos concretos para a valoração negativa da conduta social, motivos, circunstâncias e consequências do crime. Rever esse entendimento, como pretende o recorrente, com o fim de reduzir a pena-base, demanda, impreterivelmente, revolvimento do conteúdo fático-probatório, providência vedada em sede de recurso especial. […] 10. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AgRg no AREsp n. 2.160.693/SC, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 13/6/2023, DJe de 16/6/2023.) […] 6. Tendo sido comprovada a prática do delito em pelos duas oportunidades, a aplicação da fração de 1/6 para a continuidade delitiva não diverge da jurisprudência desta Corte Superior. 7. A apreciação das alegações referentes à não configuração da condição de tio por afinidade e de não demonstração da continuidade delitiva demandariam o reexame fático-probatório, o que é vedado pela Súmula n. 7/STJ. 8. A tenra idade da vítima, que possuía 3 anos de idade na época dos delitos, é fator que legitima a exasperação da pena-base para além do mínimo legal, razão pela qual a reprimenda foi redimensionada. 9. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 2.020.401/PR, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 27/11/2023, DJe de 30/11/2023.) Outrossim, ao afastar a tese da defesa referente a violação ao art. 61, caput e inciso II, alínea g, do Código Penal, o acórdão combatido decidiu a matéria em conformidade com jurisprudência pacificada no Superior Tribunal de Justiça. Nesse sentido: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ART. 299. DOSIMETRIA DA PENA. ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM. INO CORRÊNCIA. 1. Não houve bis in idem na aplicação da pena imposta ao paciente, uma vez que fatos distintos justificaram a exasperação da pena-base, de um lado, e a aplicação da circunstância agravante prevista no art. 61, II, "g", do Código Penal, de outro. 2. Agravo Regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 1.815.026/PR, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 27/3/2023, DJe de 30/3/2023.) Assim, a consonância do acórdão recorrido com jurisprudência dominante no Superior Tribunal de Justiça atrai a aplicação do enunciado 83 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, vazada nos seguintes termos: SÚMULA 83: Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida. Por fim, impende destacar que a matéria concernente aos arts. 370, §1º e 564, inciso III, alínea o, ambos do Código de Processo Penal, não foram abordadas pelo acórdão recorrido, o que explicita a ausência do essencial prequestionamento, atraindo a incidência dos enunciados das súmulas n.ºs 282 e 356 do STF, aplicáveis à espécie por analogia. Consoante entendimento assente no Superior Tribunal de Justiça: I - A ausência de análise sobre a matéria, ensejaria a oposição de embargos de declaração para sanar a omissão e viabilizar o necessário debate. Contudo, a parte recorrente não atuou de forma a viabilizar o conhecimento do recurso especial, acarretando a incidência dos óbices contidos nas das Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal, respectivamente: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada"; "O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento".[...] Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 1.931.099/PR, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 17/8/2021, DJe de 24/8/2021.) Ante o exposto, nos termos do
art. 1.030,
inciso V, do
Código de Processo Civil, inadmito o presente recurso especial. Publique-se. Intimem-se. Salvador (BA), em 02 de setembro de 2024. Desembargador José Alfredo Cerqueira da Silva 2º Vice-Presidente acsl
(TJ-BA, Classe: Apelação, Número do Processo: 0000322-41.2011.8.05.0027, Órgão julgador: 2ª VICE-PRESIDÊNCIA, Relator(a): JOSE ALFREDO CERQUEIRA DA SILVA, Publicado em: 03/09/2024)