PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª Vice Presidência Processo: APELAÇÃO CRIMINAL n. 0000103-69.2016.8.05.0183 Órgão Julgador: 2ª Vice Presidência APELANTE: Luan Costa Santos Advogado(s): UBIRATAN
(...) (OAB:BA10587-A) APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA Advogado(s): DECISÃO Preambularmente, cadastre-se no presente feito o novo Advogado constituído por
(...), o Bel. Alison Conceição da Silva (OAB/BA 63.595), consoante procuração de ID 355127771. Cuida-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado da Bahia, com fundamento no
artigo 105,
III,
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...alínea “c”, da Constituição Federal, contra o Acórdão proferido pela Primeira Turma da Primeira Câmara Criminal, que negou provimento à Apelação Criminal articulada por (...). Alega o recorrente, em síntese, a existência de dissídio jurisprudencial no que concerne à aplicação do artigo 601, do Código de Processo Penal, bem como a caracterização de ofensa ao princípio da dialeticidade e da ampla defesa, decorrente do julgamento da Apelação Criminal sem as razões da defesa. Argumenta a respeito do dissídio que “diante da desídia do defensor constituído em apresentar as razões recursais, inicialmente, deve-se intimar o réu para indicar novo defensor de sua confiança e, somente em caso de inércia, remeter os autos à Defensoria Pública”. Afirma, ainda, que “a devolutividade da apelação interposta em face de decisões proferidas pelo juízo singular, mesmo diante da previsão contida no art. 601, do CPP, não dispensa a apresentação das razões, na medida em que tal peça é essencial para materialização do princípio da dialeticidade, permitindo ao Tribunal, e à própria parte adversa, uma análise detida de todos os aspectos do inconformismo recursal”. (...) apresentou contrarrazões. É o relatório. Sustenta o Ministério Público nas razões da irresignação excepcional a existência de divergência jurisprudencial e conseguinte cerceamento do direito de defesa de Luan Costa Santos, em face do Acórdão que julgou a Apelação Criminal defensiva desprovida de razões. Acerca da matéria, o Acordão recorrido assentou o seguinte: APELAÇÃO CRIMINAL – TRIBUNAL DO JÚRI – HOMICÍDIO QUALIFICADO – AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE RAZÕES RECURSAIS PELO APELANTE APESAR DE DEVIDAMENTE INTIMADO ATRAVÉS DE SEU ADVOGADO CONSTITUÍDO – IRRELEVÂNCIA – EFEITO DEVOLUTIVO AMPLO DO APELO QUE ENSEJA A APRECIAÇÃO DE OFÍCIO DE TODA A MATÉRIA RECORRÍVEL –MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO DEVIDAMENTE CONFIGURADOS, INCLUSIVE EM FACE DA CONFISSÃO DO RÉU – TESES DE LEGÍTIMA DEFESA, HOMICÍDIO PRIVILEGIADO E EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA SUSTENTADO PELO APELANTE EM PLENÁRIO NÃO ACOLHIDAS PELOS JURADOS – DECISÃO QUE NÃO SE CONFIGURA MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS – ADOÇÃO DE UMA DAS VERSÕES CONSTANTES NO PROCESSO – DOSIMETRIA – PENA-BASE EXACERBADA – EXCLUSÃO DE ALGUMAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS CONSIDERADAS DESFAVORÁVEIS – ACRÉSCIMOS DESFUNDAMENTADOS – APELO IMPROVIDO – PENA REDUZIDA DE OFÍCIO. [...] II - Quanto ao mérito, nota-se, ab initio, que não foram apresentadas razões ao presente recurso, apesar de o apelante ter sido devidamente intimado através de seu advogado constituído. Assim, vê-se que o pleito ministerial quanto a intimação do réu acertadamente não mereceu acolhimento pelo relator, pois a falta desta diligência, além de não configurar prejuízo para a defesa, evita a eventual procrastinação do processo, considerando, inclusive, que, na hipótese de deferimento, o novo defensor eventualmente constituído poderia também ser omisso, forçando a realização de intermináveis diligências envolvendo, até intimação por Edital. Além disso, constata-se que o réu apelou da sentença condenatória através de advogado constituído (fls. 231). Destarte, considerando que o efeito devolutivo do recurso em matéria penal é amplo, conforme lembrado nos atos ordinatórios de fls. 250 e 257, não há de se cogitar da existência de prejuízo para a defesa. Neste sentido: EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. INÉRCIA DA DEFESA INTIMADA PARA APRESENTAÇÃO DAS RAZÕES E CONTRA-RAZÕES RECURSAIS: CERCEAMENTO DE DEFESA: NÃO CARACTERIZAÇÃO. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que a ausência de razões de apelação e de contra-razões à apelação do Ministério Público não é causa de nulidade por cerceamento de defesa, se o defensor constituído pelo réu foi devidamente intimado para apresentá-las. Precedentes. 2. Habeas corpus denegado (STF, 1ª Turma, HC 91251/ RJ, Rel. Min. Carmen Lúcia, DJ 17/08/2007). DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO DE ACÓRDÃO NULO. FALTA DE OFERECIMENTO DAS RAZÕES RECURSAIS. JULGAMENTO DETALHADO E COMPLETO DA APELAÇÃO. IMPROVIMENTO. 1. O recurso ordinário sustenta a nulidade do julgamento do recurso de apelação, pelo Tribunal de Justiça, devido à circunstância da defesa técnica não haver apresentado as razões de apelação, nos termos do art. 600, § 4°, do Código de Processo Penal. 2. Nenhum ato processual será declarado nulo, se da nulidade não tiver resultado prejuízo para qualquer uma das partes (CPP, art. 563), conforme o brocardo "pas de nullité sans grief". 3. Os aspectos a seguir indicados apontam para a ausência de prejuízo do paciente: a) o paciente tinha seus interesses representados por defensor constituído; b) houve regular intimação da defesa técnica para oferecimento das razões de apelação, nos termos do art. 600, § 4°, do Código de Processo Penal; c) o tribunal de justiça apreciou todas as hipóteses de cabimento de apelação contra sentença proferida com base no julgamento do tribunal do júri. 4. Levando em conta que a falta da apresentação das razões recursais não impediu que o Tribunal de Justiça apreciasse de forma detalhada e completa a irresignação do paciente contra a sentença condenatória. 5. Recurso ordinário improvido. (STF, 2ª Turma, RHC 91070 / SE, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 26/09/2008). A não apresentação de razões da apelação por defensor constituído, desde que intimados para arrazoarem o recurso, não caracteriza cerceamento de defesa. (STF, Segunda Turma, HC 77270, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ 27/04/2001). (Trechos do Acórdão recorrido). No entanto, diferentemente do critério decisório erigido pelo Colegiado, o Superior Tribunal de Justiça entende que: “em respeito às garantias constitucionais do contraditório e ampla defesa, se o advogado intimado a apresentar razões recursais quedar-se inerte, é imprescindível que seja oportunizada ao réu a nomeação de outro causídico, sob pena de nomeação de advogado dativo pelo Juízo, nos termos do art. 263 do Código de Processo Penal. Precedentes”. Confiram-se os precedentes: AGRAVO REGIMENTAL EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM HABEAS CORPUS. AGRAVO REGIMENTAL CONTRA A CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS. WRIT SUBSTITUTIVO DE REVISÃO CRIMINAL. FALTA DE CABIMENTO. ROUBOS CIRCUNSTANCIADOS. RECURSO DE APELAÇÃO. INÉRCIA DO ADVOGADO CONSTITUÍDO EM APRESENTAR RAZÕES RECURSAIS NA INSTÂNCIA SUPERIOR. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO RÉU PARA A CONSTITUIÇÃO DE NOVO PATRONO. CONFIGURADO CERCEAMENTO DE DEFESA. PRECEDENTES DO STJ. EVIDENTE ILEGALIDADE APTA A SER CORRIGIDA DE OFÍCIO. 1. A decisão atacada deve ser mantida por seus próprios fundamentos, uma vez que a circunstância de não ter sido dada ao acusado a oportunidade de constituir novo defensor para fins de apresentação das razões recursais na superior instância configura flagrante ilegalidade, nos termos da consolidada jurisprudência desta Corte, apta a ser corrigida de ofício. 2. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no HC n. 722.142/RS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 19/4/2022, DJe de 25/4/2022.). HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE RAZÕES RECURSAIS EM SEGUNDA INSTÂNCIA. TEXTO DA INTIMAÇÃO DO DIÁRIO DE JUSTIÇA QUE NÃO É IDÊNTICO AO DESPACHO DO MAGISTRADO. IRRELEVÂNCIA. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. ATO APTO A PRODUZIR SEUS EFEITOS. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DAS RAZÕES RECURSAIS. INÉRCIA DO ADVOGADO CONSTITUÍDO INTIMADO VIA IMPRENSA OFICIAL. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO RÉU OPORTUNIZANDO A CONSTITUIÇÃO DE NOVO DEFENSOR. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Muito embora seja de todo recomendável a fidelidade do texto publicado com a decisão exarada pelo Magistrado, no caso concreto, o teor da publicação era apto a atingir a sua finalidade, fazendo referência a dispositivo do Código de Processo Penal que trata da apresentação de razões recursais em segunda instância. Assim, o princípio da instrumentalidade das formas deve ser prestigiado, não havendo nulidade a ser reconhecida no que diz respeito à publicidade da intimação para arrazoar o recurso de apelação efetuada por meio do Diário de Justiça. 2. A remansosa jurisprudência desta Corte Superior orienta-se no sentido de que, em respeito às garantias constitucionais do contraditório e ampla defesa, se o advogado intimado a apresentar razões recursais quedar-se inerte, é imprescindível que seja oportunizada ao réu a nomeação de outro causídico, sob pena de nomeação de advogado dativo pelo Juízo, nos termos do art. 263 do Código de Processo Penal. Precedentes. 3. Ordem concedida para declarar a nulidade da remessa dos autos da apelação criminal à primeira instância, que fora efetuada para Segunda Câmara Criminal do TJ/GO mesmo sem a análise do referido recurso pela Corte Estadual. Em consequência, desconstitui-se o trânsito em julgado da sentença e determina-se que o Tribunal Estadual proceda a intimação do réu para nomear defensor de sua confiança, dentro de prazo determinado por aquela Corte, para apresentação das razões de apelo, sob pena de incidência das disposições do artigo 263 do Código de Processo Penal. (HC n. 341.981/GO, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 19/9/2017, DJe de 27/9/2017.) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ADVOGADO CONSTITUÍDO DEVIDAMENTE INTIMADO. INÉRCIA NA APRESENTAÇÃO DAS RAZÕES RECURSAIS. NECESSIDADE DA PRÉVIA INTIMAÇÃO DO RÉU PARA CONSTITUIR NOVO PATRONO. FALTA DE NOMEAÇÃO DE DEFENSOR PÚBLICO OU DATIVO PARA SUPRIR A FALTA. CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO. PRECEDENTES. ACÓRDÃO DA APELAÇÃO ANULADO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. OCORRÊNCIA. 1. Tendo o réu manifestado pessoalmente o desejo de recorrer da sentença condenatória, deve ser suprida a sua falta de capacidade postulatória, com a apresentação de razões por advogado. Havendo advogado constituído, se esta permanece inerte, deve ser o acusado intimado para constituir novo defensor, e, não o fazendo, deve-se-lhe nomear defensor dativo para tanto (HC n. 71.054/SC, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 10/12/2007). 2. Interposta a apelação, cumpre ser arrazoada em 1a. ou 2a. instâncias (não se confunde com a sustentação oral). Exigência do "due process of law" (Const. art. 5., LV) - REsp n. 88.194/GO, Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, DJ 9/6/1997. 3. É nulo o julgamento sem que o recurso tenha sido arrazoado (HC n. 39.678/RS, Ministro Nilson Naves, Sexta Turma, DJe 2/6/2005). 4. Numa interpretação histórico-evolutiva não é de se aceitar, hoje em dia, a aplicação literal do disposto no art. 601 do CPP, que cerceando o direito do réu, se apresenta fora do contexto processual penal, quer constitucional quer infraconstitucional (REsp n. 125.680/RS, Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJ 13/10/1998). 5. Há respaldo jurisprudencial para a conclusão de ocorrência de nulidade absoluta no caso, o que autoriza a concessão da ordem, até mesmo de ofício, se se entendesse pela falta de cabimento do habeas corpus. 6. Não há falar em instrução deficiente dos autos de habeas corpus pela ausência de cópia da ata da sessão de julgamento da apelação para se verificar se ali estava presente ou não o defensor do réu. Diante do caráter absoluto da nulidade cabalmente demonstrada na espécie, torna-se indiferente ter sido arguida, ou não, por defensor, durante o julgamento, a ausência das razões da apelação. 7. De acordo com a pena fixada, o lapso prescricional é de 4 anos, conforme preceitua o art. 109, V, do Código Penal, prazo este transcorrido entre o último marco interruptivo, consistente na publicação da sentença condenatória, em 30/7/2007, e 5/9/2013. 8. A liminar deferida pelo então Relator não teve o condão de suspender o lapso prescricional. 9. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 179.776/ES, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 13/5/2014, DJe de 2/6/2014.). Desse modo, evidenciada a plausibilidade da arguição do Ministério Público do Estado da Bahia em face do acórdão vergastado, bem como o preenchimento dos pressupostos de admissibilidade recursal exigidos na espécie, notadamente, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça acerca do objeto da irresignação, verifico a possibilidade do trânsito do apelo nobre à instância de superposição. Ante o exposto, admito o recurso especial. Remetam-se os autos ao Superior Tribunal de Justiça com as homenagens de estilo. Publique-se. Intime-se. Desembargadora Márcia Borges Faria 2ª Vice-Presidente
(TJ-BA, Classe: Apelação, Número do Processo: 0000103-69.2016.8.05.0183, Órgão julgador: 2ª VICE-PRESIDÊNCIA, Relator(a): MARCIA BORGES FARIA, Publicado em: 25/10/2022)