Redução Salarial: Direitos e Limites do Empregador

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Por Modelo Inicial
11/04/2025  
Redução Salarial: Direitos e Limites do Empregador - Trabalhista
A Reforma trabalhista acabou com a irredutibilidade salarial? Seria o fim da estabilidade financeira? Veja esta e outros tópicos sobre o princípio da irredutibilidade salarial

Neste artigo:
  1. Dos fundamentos legais do princípio da irredutibilidiade salarial
  2. Das Exceções Permitidas
  3. Da perda da gratificação ao deixar cargo de confiança
  4. Direito adquirido - estabilidade financeira
  5. 2º - Aplicação da Lei no tempo - As normas prejudiciais podem ser retroativas?
  6. 3º - Inconstitucionalidade do §2º do Art. 468 da CLT

O princípio da irredutibilidade salarial é um dos fundamentos essenciais do direito trabalhista brasileiro, assegurado pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em seu artigo 7º, inciso VI. Esse princípio estabelece que o salário do empregado não pode ser reduzido unilateralmente pelo empregador, garantindo a manutenção da remuneração acordada, salvo nas situações permitidas por lei.

Dos fundamentos legais do princípio da irredutibilidiade salarial

De acordo com a CLT, o salário é a contraprestação devida pelo empregador ao empregado em virtude do contrato de trabalho, com caráter alimentar e protegido por diversos princípios, incluindo a irredutibilidade.

Este princípio visa proteger o trabalhador de variações arbitrárias ou injustificadas em sua remuneração, proporcionando segurança econômica e estabilidade financeira.

Das Exceções Permitidas

Embora o princípio da irredutibilidade seja geral e absoluto, existem situações específicas previstas em lei nas quais é permitida a redução salarial, tais como:

  1. Acordo ou Convenção Coletiva: Poderá haver negociação entre sindicato dos trabalhadores e sindicato patronal para estipulação de condições de trabalho, com necessidade de redução temporária de salários.

  2. Medidas Provisórias: Durante situações excepcionais, como crises econômicas ou pandemias, o governo pode instituir medidas provisórias permitindo a redução salarial para preservar empregos.

  3. Decisões Judiciais: Em casos específicos, decisões judiciais podem permitir a redução salarial, desde que respeitados os limites legais e constitucionais.

Da perda da gratificação ao deixar cargo de confiança

Em torno da polêmica da Reforma Trabalhista, alguns pontos seguem em plena discussão. Dentre eles podemos destacar a nova redação do Art. 468 da CLT ao dispor:

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

§ 1º Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

§ 2º A alteração de que trata o § 1ºdeste artigo, com ou sem justo motivo, não assegura ao empregado o direito à manutenção do pagamento da gratificação correspondente, que não será incorporada, independentemente do tempo de exercício da respectiva função. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

Esta redação, poder-se-ia concluir que esvaziou a súmula 372 do TST que previa:

GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. SUPRESSÃO OU REDUÇÃO. LIMITES (conversão das Orientações Jurisprudenciais nos 45 e 303 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I- Percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo em vista o princípio da estabilidade financeira. (ex-OJ nº 45 da SBDI-1 - inserida em 25.11.1996)

II- Mantido o empregado no exercício da função comissionada, não pode o empregador reduzir o valor da gratificação. (ex-OJ nº 303 da SBDI-1 - DJ 11.08.2003)

Com a nova redação, após decorridos 10 ou 20 anos, poderia o empregador simplesmente suprimir as gratificações, passando por cima do princípio da "estabilidade financeira"?

Pela leitura fria da lei, após a reforma, sim.

Mas seria este o papel do operador do direito? Apenas aplicar a redação nua e crua? Não pensamos dessa forma. Nesse sentido, trouxemos três debates que merecem ser considerados:

1º - Direito adquirido anterior à vigência da Reforma Trabalhista;

2º - Irretroatividade da Reforma Trabalhista aos contratos anteriores à Lei 13.467/17;

3º - Inconstitucionalidade do §2º do Art. 468 da CLT.

Vejamos cada um deles:

1. Direito adquirido - estabilidade financeira

A jurisprudência majoritária bem como a doutrina, ao lecionar sobre a estabilidade financeira, esclarece:

"(...) o Tribunal Superior do Trabalho houve por bem fixar em dez anos o lapso temporal capaz de identificar aquilo que se convencionou chamar de "estabilidade financeira" (Homero Batista Mateus da Silva, Curso de Direito do Trabalho Aplicado - vol. 5 - Edição 2017, e-book, CAPÍTULO 5. GRATIFICAÇÕES AJUSTADAS)

Trata-se de matéria sumulada desde 20.04.2005 com a seguinte redação:

Súmula nº 372 TST:

"Percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo em vista o princípio da estabilidade financeira".

Ocorre que num piscar de olhos, aquele que laborou por 10, 15 ou 20 anos passa a poder ter suas gratificações suprimidas com base em nova norma vigente.

Ocorre que, como outras discussões já trazidas nesta plataforma, não é razoável aceitar que a nova redação dada pela Reforma Trabalhista, possa alcançar um empregado que tenha adquirido o direito à estabilidade financeira antes da vigência da Reforma.

Trata-se, como já referido em outros artigos, da necessária ponderação da irretroatividade de norma prejudicial ao empregado em observância à SEGURANÇA JURÍDICA e o DIREITO ADQUIRIDO, nos termos de clara redação da Constituição Federal em seu Art. 5º, inc. XXXVI:

"A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada."

Afinal, a aplicação de uma nova norma que reflita negativamente nas vantagens do trabalhador só poderiam atingir contratos originados após a vigência da Reforma, entendimento já pinçado na redação da Súmula 51 do TST:

Súmula nº 51 do TST:

I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento. (ex-Súmula nº 51 - RA 41/1973, DJ 14.06.1973)

Sob este prisma, a jurisprudência do TST, tem aplicado o seguinte entendimento:

RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE - GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO PERCEBIDA POR MAIS DE DEZ ANOS - IMPLEMENTAÇÃO DA CONDIÇÃO TEMPORAL EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 - SUPRESSÃO - INCORPORAÇÃO - APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 372 DO TST. O entendimento desta Corte é no sentido de que, se a destituição do cargo comissionado ocorrer em data posterior ao advento da Lei nº 13.467/2017, mas o trabalhador já tiver completado mais de dez anos do recebimento da gratificação de função antes da vigência da lei, a incorporação deve levar em consideração o disposto no art. 468 da CLT, sem a introdução do § 2º, e na Súmula nº 372, I, do TST. Precedentes.

(TST, RRAg - 690-13.2019.5.10.0017, Relatora Desembargadora Convocada: Margareth Rodrigues Costa, Data de Julgamento: 13/03/2024, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 22/03/2024)

Razões pelas quais podemos entender por razoável a compreensão de que o §2º do Art 468 atingiria apenas os contratos originados após a Reforma, ou, em última análise àqueles que não tenham adquirido o direito antes da referida vigência.

2º - Aplicação da Lei no tempo - As normas prejudiciais podem ser retroativas?

Em tese, a Reforma Trabalhista não teria eficácia para retirar direitos do trabalhador cuja relação jurídica é anterior à Lei 13.467/17, em observância pura à segurança jurídica inerente ao Estado Democrático de Direito, e ao DIREITO ADQUIRIDO, nos termos da redação constitucional em seu Art. 5º:

XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

Este entendimento já foi concretizado pela Súmula 191 do TST que entendeu em caso análogo a não aplicação de lei norma por ser prejudicial ao empregado:

Súmula nº 191 ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. INCIDÊNCIA. BASE DE CÁLCULO (cancelada a parte final da antiga redação e inseridos os itens II e III)
(...)
III - A alteração da base de cálculo do adicional de periculosidade do eletricitário promovida pela Lei nº 12.740/2012 atinge somente contrato de trabalho firmado a partir de sua vigência, de modo que, nesse caso, o cálculo será realizado exclusivamente sobre o salário básico, conforme determina o § 1º do art. 193 da CLT.

Trata-se de aplicação do princípio da irretroatividade de norma nova, disposto no Decreto-Lei nº 4.657/42 (LIDB):

Art. 6º. A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

Assim, mesmo que em vigor, a lei que estabeleça alterações que prejudique algum direito do trabalhador, tem-se a necessidade de se ponderar sobre a irretroatividade da norma, pra fins de que produza efeitos, quando prejudiciais, somente para os contratos de trabalho celebrados a partir 11/11/2017, em respeito à cláusula pétrea de proteção ao direito adquirido.

Todavia, trata-se de um tema polêmico e sem análise do judiciário ainda.

3º - Inconstitucionalidade do §2º do Art. 468 da CLT

Outra polêmica gerada seria sobre a possível inconstitucionalidade do §2º do Art. 468, ao configurar nítida redução do salário protegido pela Constituição Federal:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;

Assim, referida reforma ao configurar nítida permissão à redução salarial, contraria a nitidamente jurisprudência consolidada pelo STF, que declarou a constitucionalidade do instituto da estabilidade financeira (AI 675.287-AgR, Min. Rel. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe de 10.02.2015)

A doutrina, no mesmo sentido, destaca a inconstitucionalidade da norma:

"A retirada da gratificação ao cabo de 10 anos representa efetiva redução salarial. O salário-condição tornou-se salário-base. Isso é irrespondível. Como a Súmula 372 do TST foi calcada no princípio da irredutibilidade salarial e como esse princípio está constitucionalizado, o caminho não tem volta. Mera alteração na redação da lei ordinária, propondo que o caso seja considerado de ausência de direito adquirido, não é o bastante para suplantar a CF/88. Há semente de inconstitucionalidade no art. 468, § 2º, portanto." (Homero Batista Mateus da Silva, Comentários à Reforma Trabalhista - Edição 2018, e-book, Art. 1º - Lei 13.467/2017)

O direito à incorporação da gratificação de função consolidado pela Súmula 372, I, do TST, que concretiza o Princípio da Estabilidade Financeira, possui decorrência lógica da combinação do Princípio da Irredutibilidade Salarial (art. 7º, VI, da CF), do Princípio da Proteção da Confiança e da Segurança Jurídica (art.s 1º e , XXXVI, da CF) e do Princípio da Boa-fé Objetiva (arts. 1º, III, e , I, da CF), reforçando a tese da inconstitucionalidade do §2º do Art. 468 da CLT.

Portanto, tratam-se de temas ainda latentes ao debate que merecem maior aprofundamento no judiciário, mas que já exigem do operador de direito o seu desenvolvimento nas peças iniciais, conforme modelo que disponibilizamos aqui.

Queremos saber também da sua opinião sobre os futuros desdobramentos deste tema.

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Comentários

E se, fosse uma mudança na LEI Penal que autoriza-se a pena de morte? poderia esta suprimir a Constituição Federal. Ao meu ver ignorar anos de jurisprudência e entendimento que regularam a sumula 372, não podem ser ignorados por um acordo entre legisladores.
Responder
muito bom e oportuno.
Responder
Excelente abordagem, incomparável a qualquer outra. Parabéns.
Responder
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