Eis a ementa do precedente de observância obrigatória:
DIREITO CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. EQUIPARAÇÃO DO PRAZO DA LICENÇA-ADOTANTE AO PRAZO DE LICENÇA-GESTANTE.
1. A licença maternidade prevista no
artigo 7º,
XVIII, da
Constituição abrange tanto a licença gestante quanto a licença adotante, ambas asseguradas pelo prazo mínimo de 120 dias. Interpretação sistemática da Constituição à luz da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre filhos biológicos e adotados, da doutrina da proteção integral, do princípio da prioridade e do interesse superior do menor.
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... As crianças adotadas constituem grupo vulnerável e fragilizado. Demandam esforço adicional da família para sua adaptação, para a criação de laços de afeto e para a superação de traumas. Impossibilidade de se lhes conferir proteção inferior àquela dispensada aos filhos biológicos, que se encontram em condição menos gravosa. Violação do princípio da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente.3. Quanto mais velha a criança e quanto maior o tempo de internação compulsória em instituições, maior tende a ser a dificuldade de adaptação à família adotiva. Maior é, ainda, a dificuldade de viabilizar sua adoção, já que predomina no imaginário das famílias adotantes o desejo de reproduzir a paternidade biológica e adotar bebês. Impossibilidade de conferir proteção inferior às crianças mais velhas. Violação do princípio da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente.4. Tutela da dignidade e da autonomia da mulher para eleger seus projetos de vida. Dever reforçado do Estado de assegurar-lhe condições para compatibilizar maternidade e profissão, em especial quando a realização da maternidade ocorre pela via da adoção, possibilitando o resgate da convivência familiar em favor de menor carente. Dívida moral do Estado para com menores vítimas da inepta política estatal de institucionalização precoce. Ônus assumido pelas famílias adotantes, que devem ser encorajadas.5. Mutação constitucional. Alteração da realidade social e nova compreensão do alcance dos direitos do menor adotado. Avanço do significado atribuído à licença parental e à igualdade entre filhos, previstas na Constituição. Superação de antigo entendimento do STF.6. Declaração da inconstitucionalidade do art. 210 da Lei nº 8.112/1990 e dos parágrafos 1º e 2º do artigo 3º da Resolução CJF nº 30/2008.7. Provimento do recurso extraordinário, de forma a deferir à recorrente prazo remanescente de licença parental, a fim de que o tempo total de fruição do benefício, computado o período já gozado, corresponda a 180 dias de afastamento remunerado, correspondentes aos 120 dias de licença previstos no art. 7º, XVIII,CF, acrescidos de 60 dias de prorrogação, tal como estabelecido pela legislação em favor da mãe gestante.8. Tese da repercussão geral: Os prazos da licença adotante não podem ser inferiores aos prazos da licença gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações. Em relação à licença adotante, não é possível fixar prazos diversos em função da idade da criança adotada.
(RE 778889, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 10/03/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-159 DIVULG 29-07-2016 PUBLIC 01-08-2016)
Conforme estatuto dos servidores do município de Nova Venécia, em seu art. 101, À funcionária gestante e aquela que tenha adotado criança de até um mês de idade, ser-lhe-á concedida licença com vencimentos pelo prazo de cento e oitenta dias(¿)., dispositivo que a teor do julgamento do Supremo Tribunal Federal antes citado, garante a licença pelo tempo previsto à mãe adotante, considerando a vedação imposta para fixar prazos diversos à licença em função da idade da criança em processo de adoção.
A alegação de ausência de prova pré-constituída da adoção, sob o argumento de que não ocorrera a adoção mas a mera concessão de guarda provisória, de caráter precário, não tem o condão de desconstituir o direito reconhecido.
É que inexiste qualquer óbice para a concessão da licença quando da concessão da guarda do menor, ainda que provisória, sobretudo considerando que nos termos do art. 46 do ECA, a adoção deve ser precedida de prévio estágio de convivência. Logo, indubitável que se o menor deve estar na companhia da adotante antes que lhe seja deferida definitivamente a adoção, imprescindível que esta lhe preste toda a assistência necessária nesses primeiros dias de convivência. (TJ-SE - MS: 00022164420128250000, Relator: Maria Aparecida Santos Gama da Silva, Data de Julgamento: 10/10/2012, TRIBUNAL PLENO).
Neste sentido:
(¿) deve-se eleger como termo inicial da licença-maternidade o momento em que é concedida, judicialmente, a guarda provisória, pois é a partir desta data em que o menor passa a conviver, com habitualidade, no novo ambiente familiar. Não há que se esperar a conclusão formal do processo de adoção para tanto, que pode se arrastar durante anos, sob pena de frustrar o objetivo da licença em comento.
(¿) embora os institutos da guarda provisória, guarda definitiva e guarda para fins de adoção não se confundam, a finalidade precípua da licença adotante é viabilizar a fruição dos direitos do menor adotado, que devem ser garantidos pela sociedade, pela família e pelo Estado, consoante o artigo 227, caput, da Constituição Federal. Não se pode inviabilizar o regular exercício dos direitos da mãe adotante e do menor em razão de formalismos legais e de nomenclaturas.
(TST - ARR: 103034320155150119, Relator: Claudio Mascarenhas Brandao, Data de Julgamento: 12/02/2020, 7ª Turma, Data de Publicação: 07/08/2020)
O período de licença-maternidade objetiva a estruturação familiar e a formação dos vínculos afetivos entre o filho, seja ele biológico ou adotado, sobretudo logo que inserido o infante em família substituta, como ocorreu quando da concessão da guarda provisória.
Além da proteção à mulher e à maternidade, a licença em questão é voltada para o filho, resguarda o bem-estar da criança ou do adolescente e viabiliza a eficácia dos direitos que lhe são garantidos pelos artigos 227, caput, da CF, e 3º e 4º do ECRIAD.
Neste sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. LICENÇA-MATERNIDADE. LICENÇA ADOTANTE. GUARDA JUDICIAL PROVISÓRIA. PRINCÍPIO DA ISONOMIA ENTRE OS FILHOS. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA E CONFORME A CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
O período de licença-maternidade tem como espoco principal, não só o restabelecimento físico e psíquico após o parto no caso da mãe biológica, mas também a estruturação familiar e a formação dos vínculos afetivos entre o filho, seja ele biológico ou adotado, e os pais, especificamente, a mãe. A par da proteção à mulher e à maternidade, a licença em questão é voltada para o filho, resguarda o bem estar da criança ou do adolescente e viabiliza a eficácia dos direitos que lhe são garantidos pelos artigos 227, caput, da Constituição Federal, e 3º e 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente. Nesse diapasão, qualquer distinção entre a concessão da licença-maternidade para a mãe biológica ou adotiva ofende, em última análise, a isonomia jurídica entre os filhos (biológicos ou adotados, matrimoniais ou extramatrimoniais), garantida nos artigos 227, § 6º, da Constituição Federal, 19 e 20 do Estatuto da Criança e do Adolescente, e 1.596 do Código Civil. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem registrou ser incontroverso que a empregada obteve a guarda provisória de menor em 03/11/2014, a qual, em 25/03/2015, foi convertida em guarda definitiva. Ademais, consignou que não foi possível o desfecho do processo de adoção em virtude de ainda se encontrar em andamento ação de interdição da mãe biológica. Desta feita, concluiu ser perfeitamente possível a equiparação da guarda provisória à guarda para fins de adoção, e a concessão da licença-maternidade, tendo em vista que ficou evidente o propósito da adoção. Considerando todo o explanado, embora os institutos da guarda provisória, guarda definitiva e guarda para fins de adoção não se confundam, a finalidade precípua da licença adotante é viabilizar a fruição dos direitos do menor adotado, que devem ser garantidos pela sociedade, pela família e pelo Estado, consoante o artigo 227, caput, da Constituição Federal. Não se pode inviabilizar o regular exercício dos direitos da mãe adotante e do menor em razão de formalismos legais e de nomenclaturas. Verifica-se, por conseguinte, que a Corte a quo, mediante exegese teleológica e conforme a Constituição Federal, deu a exata subsunção dos fatos ao sistema jurídico pátrio, privilegiando os Princípios e Direitos assegurados na Constituição Federal, em observância às regras de hierarquia das normas do ordenamento jurídico brasileiro, segundo as quais a Magna Carta consiste em Lei suprema e fundamental. Agravo de Instrumento conhecido e não provido.
(...)
(TST - ARR: 103034320155150119, Relator: Claudio Mascarenhas Brandao, Data de Julgamento: 12/02/2020, 7ª Turma, Data de Publicação: 07/08/2020)
MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CURADOR. GUARDA JUDICIAL. GOZO DE LICENÇA MATERNIDADE. NECESSIDADE. GENITORA ADOTANTE. EQUIPARAÇÃO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. SEGURANÇA CONCEDIDA.1. O mandado de segurança serve para resguardar direito líquido e certo de lesão ou ameaça de lesão, considerando-se direito líquido e certo aquele que pode ser demonstrado de plano mediante prova pré-constituída, tratando-se de direito manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração.2. De acordo com o artigo 1.778 do Código Civil, a autoridade do curador estende-se à pessoa e aos bens dos filhos do curatelado. Assim, é dever legal da impetrante, por deter a guarda provisória do infante, ser curadora da genitora do menor e ante a incapacidade do genitor, reger e proteger a criança.3. Considerando a ratio legis do artigo 26 da Lei Complementar 769/2008, conclui-se que, in casu, a impetrante se encontra em situação semelhante à mãe adotante, porquanto, embora não almeje adotar a criança, tem por dever legal empreender todos os seus esforços quanto aos cuidados desta em tão tenra idade, sendo-lhe lícito, nesses termos, o gozo da licença maternidade pleiteada.4. Segurança concedida.
(TJ-DF 07069637920218070000 DF 0706963-79.2021.8.07.0000, Relator: SIMONE LUCINDO, Data de Julgamento: 07/06/2021, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 17/06/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)
A partir de tais premissas, somente é possível interpretar as normas infralegais de forma teleológica e conforme a Constituição Federal, no que se evidencia com tranquilidade o direito à licença desde o momento da inserção do infante em família substituta.
No caso, a guarda provisória da infante foi concedida à impetrante no dia 20/02/2020, para cumprir estágio de convivência com o adotando, conforme termo de guarda sem prazo determinado (à fl. 12), em consequência de decisão proferida em processo de destituição dos poderes familiares ajuizado pelo Ministério Público em face dos genitores do infante.
De simples consulta às informações do processo no sítio eletrônico deste Tribunal é possível verificar que a guarda provisória concedida foi posteriormente mantida, no que se considerou, inclusive, a vontade declarada da impetrante e seu companheiro em adotar o menor e que já se encontrava em curso o devido procedimento de habilitação para adoção, no que proferida sentença destituindo os poderes familiares dos genitores do menor e determinando a intimação da impetrante e seu companheiro para que ajuizassem ação de adoção.
Ainda, em consulta ao andamento processual, verifiquei que a impetrante ajuizou a ação de adoção em 24/09/2020, distribuída sob o n.° 0001508-60.2020.8.08.0008, por dependência aos autos da ação n.° 00056346120178080008, sentenciada para julgar procedente o pedido de adoção deduzido pela impetrante e por J.
C.R, conforme se extrai da publicação no diário da justiça estadual do dia 22/04/2021.
Por tais razões, nego provimento ao recurso de apelação e julgo prejudicado o reexame necessário.
Intimem-se.
Publique-se na íntegra.
Vitória, 24 de agosto de 2022.
Desembargador Fabio Clem de Oliveira
Relator
(TJ-ES, Classe: Apelação / Remessa Necessária, 0000961-27.2020.8.08.0038 (766984), Relator(a): FABIO CLEM DE OLIVEIRA, Órgão julgador: PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 24/08/2022)