DIREITO PENAL MILITAR E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES MILITARES EM TEMPO DE PAZ. ALICIAÇÃO PARA MOTIM E INCITAMENTO. PRELIMINARES DE ILEGALIDADE DA PROVA E CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADAS. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA DESCABIDA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. MANUTENÇÃO DAS PENAS APLICADAS. READEQUAÇÃO, DE OFÍCIO, DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA. RECURSO CONHECIDO E, DE OFÍCIO, PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Quanto à juntada da mídia aos autos, convém destacar que o relatório técnico constante às págs. 09/10 continha a transcrição completa dos áudios, conforme se constata dos arquivos juntados por ocasião da sentença, anexado à pág. 519. É importante ressaltar, ainda, que tal alegação não foi trazida no momento adequado, qual seja a defesa preliminar, somente sendo aventada
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...pelo réu, ora apelante, após a instrução. 2. Ademais, o apelante confirma ser o autor dos áudios, postado em um grupo de policiais militares do qual fazia parte, embora argumente que seria apenas um fragmento de uma mídia mais extensa e que havia outros áudios com conteúdo que revelavam a intenção do acusado de não aderir ao movimento e de convencer outros militares nesse sentido. Todavia, não foi comprovada pela defesa nenhuma adulteração no iter probatório, sendo certo que poderia facilmente comprovar o suposto corte no áudio, anexando a mídia supostamente ¿completa¿, ou ainda apresentando novas mensagens ou áudios que comprovassem a alegação de que aquele trecho que deu azo à denúncia teria sido ¿tirado de contexto¿, como defende. 3. Assim, é nítido que não há se falar em nulidade por ausência de juntada do áudio nem de quebra de cadeia de custódia apta a tornar nula a prova por ausência de perícia, mormente considerando a ausência de prejuízo. 4. No mérito, a defesa do apelante requer, em síntese, a absolvição do réu quanto a ambos os crimes, aduzindo a ausência de provas suficientes para a condenação ou atipicidade em razão da falta de dolo específico. Subsidiariamente, que seja condenado somente na forma tentada quanto ao delito previsto no art. 155 do Código Penal Militar. 5. O áudio enviado pelo apelante através do aplicativo whatsapp em grupo de policiais, que ensejou a abertura do IPM, a teor do que confirmado por ele mesmo, tinha o seguinte teor: ¿Pessoal, quem tá entrando de serviço, assuma a viatura e vem pra BPMA, quem ta entrando de serviço assuma a viatura e vem pra BPMA, todo mundo pra cá, assuma o serviço, sai na moral e vem pra BPMA, aqui é companhia, pode vir pra cá, pode vir pra cá¿. O recorrente argumenta que tal convocação aos colegas de farda seria para aqueles que não aderissem ao movimento paredista, a fim de resguardar as viaturas. A versão apresentada pelo recorrente, todavia, revela-se apartada da realidade, eis que se verifica das provas colhidas durante a instrução o nítido intuito do acusado de aliciar militares para a prática de motim, bem como incitar à desobediência e indisciplina, crimes previstos, respectivamente, nos artigos 154 e 155 do Código Penal Militar, pelos quais foi condenado. 6. Destaque-se também que o acusado não apresentou nenhuma conversa ou mídia do grupo de whatsapp em que postou o áudio de convocação dos militares, de modo a comprovar sua argumentação de que teria finalidade diversa, para resguardar os veículos da polícia, bem como as testemunhas ouvidas não revelam tal versão. Assim, o pleito absolutório apresentado pela defesa do Apelante, sem apresentar elementos específicos que confrontem os demais elementos existentes nos autos, não é suficiente para contrapor o édito condenatório que está em conformidade com as provas colhidas, mormente os áudios e os testemunhos. 7. Quanto ao pleito subsidiário para que seja condenado apenas quanto ao crime de incitamento na forma tentada, também se revela descabido, eis que tal crime se classifica como formal, bastando a incitação para sua consumação, somente sendo admitida a tentativa em caso de interceptação de mensagem antes de chegar ao receptor, por exemplo, o que não ocorreu no presente caso. 8. Portanto, a condenação foi exarada com acerto e está fielmente amparada nos elementos de prova dos autos, não havendo dúvidas de que o Recorrente aliciou militares para a prática de motim, bem como incitou à desobediência e indisciplina, o que decerto configura os delitos previstos crimes previstos, respectivamente, nos artigos 154 e 155 do Código Penal Militar, de modo que não há se falar em ausência de provas nem de dolo para a condenação. 9. Nos termos da Súmula 55 do TJCE, ¿O Tribunal não está adstrito aos fundamentos utilizados na sentença para fixar a pena do réu, podendo reanalisar as provas colhidas e apresentar novas justificativas, desde que idôneas, para atenuar ou manter a pena ou o regime fixados, em recurso exclusivo da defesa, em observância ao amplo efeito devolutivo da apelação¿. 10. No que tange à dosimetria da pena, também não há reparos a fazer na sentença, eis que aplicada a pena mínima de cada um dos crimes. 11. Quanto ao regime inicial de cumprimento da pena, deve ser modificado, uma vez que, consoante o art. 33, parágrafo 2º, alínea ''c'', do Código Penal, a pena deve ser cumprida inicialmente em regime aberto, e não semiaberto, eis que não se trata de réu reincidente nem houve o reconhecimento de circunstâncias negativas a possibilitar a imposição de regime mais gravoso. 12. Por fim, é importante salientar que, consoante já deliberou o STJ, ¿não se aplica aos crimes militares a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, prevista no
art. 44 do
Código Penal, pois o
art. 59 do
Código Penal Militar disciplinou de modo diverso as hipóteses de substituição cabíveis sob sua égide. Precedentes. 13. Recurso conhecido e, de ofício, parcialmente provido.
(TJ-CE; Apelação Criminal - 0264365-39.2020.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) HENRIQUE JORGE HOLANDA SILVEIRA, 3ª Câmara Criminal, data do julgamento: 24/10/2023, data da publicação: 24/10/2023)