PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (
LOAS) – DEFICIENTE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.
1. Pedido de concessão de benefício assistencial ao deficiente.
2. Conforme consignado na sentença:
“(...)
No caso dos autos, com relação ao requisito da deficiência, no laudo médico produzido em juízo, atestou o perito que "A periciada tem a doença de luxação congênita do quadril. Não se relaciona com doença profissional ou acidente de trabalho. Está realizando tratamento, inclusive em recuperação pós operatória de cirurgia." (Id 265521221).
Não obstante a doença que acomete a parte demandante, segundo o expert, não restou
...« (+2344 PALAVRAS) »
...evidenciada deficiência e tampouco incapacidade para o trabalho ou para a vida independente: "A periciada apresenta uma doença que se inicia logo após o nascimento e pode evoluir de diversas formas. Apresenta sintomas , exames , receitas e relatórios médicos compatíveis com a doença apresentada. A doença não caracteriza deficiência até o momento." Portanto, não entende que a autora é pessoa com deficiência, assim conceituada pela Lei nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993.
Para a concessão de benefício de prestação continuada da Assistência Social, o requisito exigido é o da existência de impedimento de longo prazo que dificulta a participação plena e efetiva da pessoa em sociedade, com uma duração mínima de 02 anos (§§ 2º e 10, do art. 20, da Lei nº 8.742/93), o qual não restou comprovado no caso em tela.
A parte requerente impugnou o laudo médico. Todavia, não logrou êxito em colacionar elementos aptos a afastar as conclusões da especialista no Id 593882365, ônus probatório que lhe cabia, nos termos do art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil.
Nesse contexto, impende ressaltar que eventual constatação de incapacidade laborativa não ensejaria automaticamente a conclusão de se tratar de pessoa com deficiência, caso não reste também caracterizada e suficientemente comprovada a existência de impedimento de longo prazo com duração superior a 2 anos. Assim é o conteúdo do enunciado da Súmula nº 48 da TNU, a qual assim dispõe nos seguintes termos:
Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação.
De fato, a perícia judicial não identificou elementos suficientes para revelar que existe deficiência, uma vez que não concluiu que a parte autora possui impedimentos de longo prazo. Por sua vez, a parte autora não produziu provas em sentido contrário.
Em razão da previsão constante do § 3º do art. 1º da Lei nº 13.876/2019, que limitou a designação de uma única perícia médica por processo judicial, inviável a realização de outra perícia.
Ressalte-se que, embora o juiz não esteja adstrito à prova pericial (arts. 371 e 479 do CPC), verifica-se não existir contradição alguma objetivamente aferível e que pudesse desqualificar o parecer do perito judicial, profissional equidistante das partes e de confiança do juízo, cujas conclusões que exarou são claramente peremptórias.
Ausente, portanto, a comprovação de deficiência na espécie, despicienda a análise sobre se resta ou não caracterizado o requisito da hipossuficiência econômica, consoante teor da Súmula nº 77 da TNU.
Logo, à vista do exposto, a demanda é de ser rejeitada.
Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, extinguindo o processo com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Não há incidência de custas nem de verba honorária (art. 55 da Lei nº 9.099/95 c.c. o art. 1º da Lei nº 10.259/01).
Havendo interposição de recurso inominado, intime-se a parte recorrida para, querendo, apresentar contrarrazões, no prazo de 10 dias.
A seguir, encaminhem-se os presentes autos para a Turma Recursal, sendo desnecessário o juízo de admissibilidade nesta instância, nos termos do Enunciado nº 34 do FONAJEF.
Sem recurso, certifique-se o trânsito em julgado. Na sequência, proceda-se ao arquivamento dos autos, com as cautelas de praxe.
Sentença registrada eletronicamente.
Publique-se. Intimem-se. Oficiem-se. Cumpra-se.”3. Recurso da parte autora: aduz que é portadora de doença que lhe incapacita para o trabalho e de ter uma vida independente, conforme atestado e receituário médico em anexo aos autos. Desta feita, o critério de renda per capita familiar de ¼ do salário mínimo não é requisito restritivo, podendo ser considerado as condições concretas de cada caso. Nas situações concretas em que a renda familiar seja insuficiente para suprir as necessidades básicas da recorrente e sua família, o benefício deve ser concedido, é o caso dos autos. Saliente-se que a recorrente devido a sua condição de saúde necessita de medicamentos, bem como tratamento especializado, que por sua vez comprometem a renda familiar. O benefício pretendido restabelecerá as condições para que a recorrente possa ter garantido suas condições mínimas de sobrevivência. Requer que seja dado provimento ao presente recurso, reformando a r. sentença monocrática, para julgar procedente a presente ação, condenando a recorrida a conceder o Benefício de Prestação Continuada de Assistência Social a Pessoa com deficiência e a pagar, definitivamente, esse beneficio a recorrente no valor mensal de 01 (um) salário mínimo.4. Requisitos para concessão do benefício: deficiência/idade e hipossuficiência econômica. 5. O STF manifestou entendimento no sentido de que o critério preconizado no art. 20, § 3º, Lei nº 8.742/93 não mais se coaduna com o ordenamento vigente, ante as mudanças econômico-sociais. (RE 567.985/MT, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes e RE 580.963/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgados em 18/4/2013). 6. Comprovação da carência financeira, para fins de concessão do benefício assistencial, deve considerar outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivíduo. Possível interpretação sistemática com normas que disciplinaram as políticas de amparo e assistência social promovidas pelo governo federal, que estabelecem o critério de ½ salário mínimo como patamar definidor da linha da pobreza (Leis n.º 10.836/01 (Bolsa-família), nº 10.689/03 (Programa Nacional de Acesso à Alimentação), nº 10.219/01 (Bolsa-escola).7. Por sua vez, o STJ decidiu, em sede de recursos repetitivos, que “em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar” (Resp 1.112.557/MG). Também possui precedentes no sentido de que deve ser excluído, do cálculo da renda mensal familiar, os benefícios percebidos por membro do núcleo familiar no valor de 01 (um) salário mínimo. Precedentes: Resp 1.226.027/PR; AgRg no Resp 1.392.529/MG, dentre outros.8. De uma análise conjugada destes precedentes, reputo que há de prevalecer, de qualquer forma, o conjunto probatório do caso concreto. Com efeito, o critério objetivo, que pode ser modificado pela exclusão de benefício no valor de um salário mínimo, não é exclusivo, devendo ser cotejado com o critério subjetivo de cada caso concreto. Neste passo, deve ser realizada uma análise do critério objetivo, que pode ser confirmado ou infirmado pelo subjetivo, devendo prevalecer, a meu ver, este último, caso contrarie o primeiro. 9.CASO CONCRETO:
Laudo pericial médico: Autora (13 anos) apresenta luxação congênita do quadril. Segundo o perito: “XI – DISCUSSÃO a) Relatório acerca da deficiência ou doença incapacitante, se compatível ou não com os sintomas descritos e com os exames, receitas e relatórios médicos apresentados: A periciada apresenta uma doença que se inicia logo após o nascimento e pode evoluir de diversas formas. Apresenta sintomas, exames, receitas e relatórios médicos compatíveis com a doença apresentada. A doença não caracteriza deficiência até o momento. b) Outras observações: sem mais. XII – CONCLUSÃO Informar, com base nos dados da perícia e demais elementos constantes nos autos: a) se a parte autora é considerada pessoa com deficiência ou pessoa com doença: a autora é considerada doente (não há deficiência) b) no caso de pessoa com deficiência, se a parte autora possui impedimento de longo prazo e quais a funções corporais acometidas: não se aplica ao caso. c) qual o nível de independência para o desempenho dos seguintes domínio/atividades (sensorial, comunicação, mobilidade, cuidados pessoais, educação, trabalho e vida econômica e socialização e vida comunitária): não há prejuízos para as funções dos domínios descritos acima. d) se em decorrência dos impedimentos de longo prazo ou doença ou lesão diagnosticada, a parte autora encontra-se incapacitada para o trabalho: impossível avaliar por hora, pois a periciada é menor de idade e ainda está em tratamento da doença, com possibilidade de evolução favorável a função e integridade do aparelho locomotor. e) no caso de menor de 16 anos, se em decorrência dos impedimentos de longo prazo ou doença ou lesão diagnosticada, a parte autora pode desempenhar as atividades próprias da idade (escola, lazer) em igualdade de condições com as pessoas da mesma idade: impossível avaliar no momento, pois está em recuperação pós operatória (cirurgia realizada em julho de 2022).”
Consta no laudo: “1.1. A doença ou lesão decorre de doença profissional ou acidente de trabalho? 1.2. O periciando comprova estar realizando tratamento? R: A periciada tem a doença de luxação congênita do quadril. Não se relaciona com doença profissional ou acidente de trabalho. Está realizando tratamento, inclusive em recuperação pós operatória de cirurgia. 2. Em caso afirmativo, esta doença ou lesão o incapacita para seu trabalho ou sua atividade habitual? Discorra sobre a lesão incapacitante tais como origem, forma de manifestação, limitações e possibilidades terapêuticas. R: Impossível avaliar isso no momento ( sugere-se ser reavaliada aos 18 anos de idade para avaliar esta capacidade). 3. Caso a incapacidade decorra de doença, é possível determinar a data de início da doença? R: Estima-se que a doença iniciou ao nascimeto. 4. Constatada a incapacidade, é possível determinar se esta decorreu de agravamento ou progressão de doença ou lesão? 4.1. Caso a resposta seja afirmativa, é possível estimar a data e em que se baseou para fixar a data do agravamento ou progressão. R: Não se aplica ao caso, periciada é menor de idade, e em tratamento de uma doença que pode melhorar com os tratamentos e seguimento médico”.
Laudo social: autora reside com os pais e 02 irmãos menores em imóvel próprio. Consta do laudo: “A mãe da autora relata que estão passando por dificuldades financeiras pois ela está desempregada em decorrência da deficiência da filha que precisa de seus cuidados constantes dessa forma não pode trabalhar, seu marido trabalha esporadicamente na lavora e recebe um valor próximo de R$800,00 sendo assim não tem uma renda fixa por mês, o valor que recebe vem sendo insuficiente para suprir as necessidades básicas da família, disse ainda que o núcleo familiar não se beneficia de nenhum programa de transferência de renda, isso vem afetando os compromissos com a manutenção básica da família. IV –INFRAESTRUTURA E CONDIÇÕES GERAIS DE HABITABILIDADE E MORADIA A moradia e própria. A construção de alvenaria, contendo 5 cômodos sendo 2 quartos, sala, cozinha e banheiro. Possui telha de barro, cerâmica. O imóvel está em bom estado de conservação V- MEIOS DE SOBREVÍVÊNCIA A família sobrevive com o valor de R$ R$800,00 (aproximadamente) VI-RENDA PER CAPITA 1-Receitas e despesas As despesas do autor foram declaradas: -Luz:R$100,00 (cem reais) -Gás: R$ 120,00 (cento e vinte reais) - Água R$ 70,00 (setenta reais) - Farmacia:R$100.00 (cem reais) - Alimentação R$ 800,00 (oitocentos reais) Total de despesas relatadas: R$ 1.190,00 (um mil cento e noventa reais) 2-Cálculo da RENDA PER CAPITA FAMILIAR . Componentes do grupo familiar: 5 pessoas. Renda bruta mensal: R$ 800,00 Renda per capita familiar: R$ 160,00 (cento e sessenta reais) VII-CONSIDERAÇÕES E CONCLUSÕES Considerando os relatos e dados apresentados no momento da visita, a família vive em situação de vulnerabilidade, tem enfrentado várias dificuldades financeiras, pois conta com apenas com aproximadamente R$800,00 provido do trabalho informal que seu pai realiza na lavora quando tem, sendo insuficiente para garantir e assegurar uma boa qualidade de vida para a família”.10. Posto isso, a despeito das alegações recursais, reputo que a sentença analisou corretamente todas as questões trazidas no recurso inominado, de forma fundamentada, não tendo a recorrente apresentado, em sede recursal, elementos que justifiquem sua modificação. Com efeito, a parte autora não trouxe aos autos elementos bastantes que infirmassem as conclusões do laudo pericial médico anexado aos autos. A mera existência da doença não impõe, por si, a concessão do benefício objeto da presente demanda. O perito nomeado possui capacitação técnico-científica para apreciar eventual deficiência/incapacidade decorrente das patologias alegadas. Parte autora foi submetida à perícia judicial por médico perito qualificado, compromissado, de confiança do Juízo e equidistante das partes. O laudo encontra-se fundamentado e baseado em seu exame clínico e nos documentos médicos anexados aos autos, não se verificando qualquer irregularidade, nulidade, necessidade de nova perícia ou de esclarecimentos. Desnecessidade, ainda, de novas perícias em especialidades diversas, tendo em vista a capacitação do perito médico judicial para exame das patologias alegadas que, ademais, foram devidamente analisadas.11. Anote-se, por oportuno, que, de acordo com o artigo 20 da Lei nº 8.742/93, na redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. Ainda, nos termos do § 2º do referido dispositivo legal, para efeito de concessão do benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015). Neste sentido, no caso do menor, há que se considerar se, no caso concreto, o menor apresenta, em virtude de suas enfermidades e/ou deficiências, limitação ao desempenho das atividades próprias e compatíveis com sua idade e/ou prejuízo para sua integração e participação social, o que, porém, não restou demonstrado nestes autos.12. Prejudicada a análise do requisito da miserabilidade, tendo em vista a necessidade de atendimento integral e cumulativo de ambos os requisitos (incapacidade/idade e hipossuficiência socioeconômica).13. Não obstante a relevância das razões apresentadas pela recorrente, o fato é que todas as questões suscitadas foram corretamente apreciadas pelo Juízo de Origem, razão pela qual a r. sentença deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do
art. 46 da
Lei nº 9.099/95. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
14. Recorrente condenada ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa. Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência judiciária gratuita, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do
artigo 98,
§ 3º do
CPC.
(TRF 3ª Região, 11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL - 5000698-50.2021.4.03.6341, Rel. Juiz Federal LUCIANA MELCHIORI BEZERRA, julgado em 17/05/2024, DJEN DATA: 29/05/2024)