Decisão
Trata-se de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental proposta pela Procuradora-Geral da República em que se aponta, como ato atentatório a preceito fundamental, a decisão judicial proferida pelo Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba, que
homologou Acordo de Assunção de Compromissos firmado entre a Petróleo Brasileiro S/A (Petrobras) e o Ministério Público Federal (MPF), com a finalidade de cumprir obrigações assumidas por aquela empresa perante autoridades públicas dos Estados Unidos,
com relevo para a destinação de US$ 682.560.000,00 (seiscentos e oitenta e dois milhões e quinhentos e sessenta mil dólares) a autoridades brasileiras.
Em paralelo a esta ADPF 568, também foi distribuída à minha relatoria, após declinada a competência pelo eminente Ministro EDSON FACHIN, a RCL
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...33.667, proposta pela Mesa da Câmara dos Deputados, com o mesmo objeto. Alega que a decisão homologatória
violou a competência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, pois parte dos inquéritos e ações penais relacionados à Operação Lava-Jato tramitaram e ainda tramitam perante a CORTE, o que justificou a celebração de acordos perante esta instância, atraindo também a
competência para a homologação do Acordo de Assunção de Compromissos.
A Procuradoria-Geral da República alegou que fatos ilícitos relacionados aos apurados pela Operação Lava-Jato ensejaram, nos Estados Unidos, a celebração de acordo entre a Petrobras e autoridade e órgão de controle e persecução penal daquele país,
como o Non Prosecution Agreement, firmado com o Departamento de Justiça americano, (DoJ), e a expedição de Cease-and-Desist Order pela Security and Exchange Commission (SEC).
A respeito do teor do acordo firmado nos Estados Unidos, a requerente transcreve, em tradução livre, o seguinte trecho do Non Prosecution Agreement:
Consequentemente, depois de considerar (a) até (k) acima, a Seção de Fraude e o Escritório acreditam que a resolução apropriada deste caso é um acordo de não acusação com a Empresa, e uma penalidade criminal com um desconto total de 25% de desconto
a parte inferior da faixa fina das Diretrizes de Condenação dos EUA; que a Seção de Fraude e o Escritório creditarão 80% da penalidade penal contra o valor que a Companhia paga às autoridades brasileiras, de acordo com sua resolução, e 10% da penalidade
penal contra a sanção civil imposta pela SEC. Com base na remediação da Empresa e no estado de seu programa de conformidade, o acordo da Empresa de reportar à Seção de Fraude e ao Escritório, conforme estabelecido no Anexo C deste Contrato (Relatório de
Conformidade Corporativo), e ao fato de a Empresa estar sediada no Brasil e estará participando separadamente de uma resolução com o Brasil e estará sujeito à supervisão das autoridades brasileiras, incluindo o Tribunal de Contas da União e a Comissão
de Valores Mobiliários do Brasil, a Seção de Fraude e o Escritório determinaram que um monitor de conformidade independente era desnecessário.
(...)
A Seção de Fraude, o Escritório e a Empresa concordam, com base na aplicação das Diretrizes de Condenação dos Estados Unidos, que a penalidade criminal total apropriada é de $ 853.200.000 ("Penalidade Criminal Total"). Isso reflete um desconto de
25% da parte inferior da faixa de multa de diretrizes de condenação dos Estados Unidos aplicável para a total cooperação e remediação da empresa. A Seção de Fraude, o Escritório e a Empresa concordam ainda que a Companhia pagará aos Estados Unidos
$85.320.000, equivalente a 10% do total da pena criminal. A Empresa concorda em pagar $85.320.000 ao Tesouro dos Estados Unidos no prazo máximo de cinco dias úteis após o Acordo ser totalmente executado. A Seção de Fraude e o Escritório concordam em
creditar o valor restante da Pena Criminal Total contra o valor que a Companhia paga ao Brasil, até 80% da Pena Criminal Total, equivalente a $682.560.000, e o valor que a Companhia paga à SEC como uma penalidade civil, até 10% do total da penalidade
criminal, equivalente a $85.320.000. As obrigações de pagamento da Companhia para os Estados Unidos estarão completas mediante o pagamento de $85.320.000,00 da Companhia, equivalente a 10 % da Pena Criminal Total, desde que a Companhia pague os valores
remanescentes ao Brasil e à SEC de acordo com seus respectivos contratos. No caso de a Companhia não pagar ao Brasil qualquer parte dos $ 682.560.000 no prazo especificado no contrato entre as autoridades brasileiras e a Empresa, a Companhia será
obrigada a pagar esse valor ao Tesouro dos Estados Unidos, exceto que a Seção de Fraude e o Escritório creditará até 50% desse valor pago à SEC. A Empresa não solicitará ou aceitará direta ou indiretamente reembolso ou indenização de qualquer fonte com
relação aos valores de multa que a Companhia pagar de acordo com este Contrato ou qualquer outro contrato firmado com uma autoridade executiva ou regulador referente aos fatos expostos na Demonstração dos Fatos. Este Contrato não impede a Companhia de
buscar recuperação de acordo com as leis brasileiras, em processos não relacionados à penalidade aqui imposta, daqueles que causaram dano à Companhia. A Empresa reconhece ainda que nenhuma dedução fiscal pode ser solicitada em conexão com o pagamento de
qualquer parte da Pena Criminal Total.
Posteriormente, a título de cumprir essas obrigações, a Petrobras celebrou o referido instrumento nominado Acordo de Assunção de Compromissos com o Ministério Público Federal, na pessoa dos Procuradores da República do Paraná, que exercem suas
funções na Força-Tarefa Lava-Jato. Desse documento, a requerente destaca os seguintes trechos:
2.2. Adicionalmente, tendo em conta os ACORDOS celebrados com as Autoridades norte-americanas (Non-Prosecution Agreement e Cease-And-Desist), as quais consentiram com o pagamento de até 80% (oitenta por cento) do valor previsto nesses ACORDOS seja
satisfeito com base no que for pago no Brasil pela PETROBRAS a Autoridades brasileiras, a PETROBRAS assume a obrigação de depositar o montante que corresponder em reais à quantia de US$ 682.560.000.00, que constituem o valor de US$ 853.200.000.00,
estabelecido nos ACORDOS perante as Autoridades norteamericanas.
2.2.1. O depósito será feito dentro do prazo de 30 dias contados da data da homologação, em conta vinculada ao respectivo Juízo Federal.
(...)
2.3. A destinação do valor depositado no Brasil será a seguinte:
2.3.1. 50% (cinquenta por cento) para o investimento social em projetos, iniciativas e desenvolvimento institucional de entidades e redes de entidades idôneas, educativas ou não, que reforcem a luta da sociedade brasileira contra a corrupção com os
seguintes fins:
(
)
2.3.2. 50% (cinquenta por cento) para a satisfação de eventuais condenações ou acordos com acionistas que investiram no mercado acionário brasileiro(B3) e ajuizaram ação de reparação, inclusive arbitragens, até a data de 08 de outubro de 2017, sendo
certo que a reserva desse montante para tal finalidade não limita a eventual responsabilidade da PETROBRAS em demandas judiciais e arbitrais decorrentes de possíveis prejuízos ocasionados a seus acionistas;
2.4. O valor previsto no item 2.3.1 deverá constituir um endowment (um "fundo patrimonial") para que os rendimentos sejam utilizados para os mencionados fins, garantindo a perenidade deste investimento social.
2.4.1. A administração do fundo patrimonial (endowment) referido no item anterior, será feita por entidade a ser constituída no prazo máximo de 18 meses após a homologação deste ACORDO, na forma de uma fundação de direito privado mantenedora, que:
(...)
2.4.2. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ficará responsável por buscar meios para a constituição de fundação privada (inclusive a redação de sua documentação estatutária), com sede em Curitiba, e poderá contar com o auxílio de entidade(s) respeitada(s)
da sociedade civil do poder público, ou do Ministério Público (p ex. para os fins do art. 65, parágrafo único, do Código Civil e do art. 764, II, do Código de Processo Civil) para conferir o máximo de efetividade às finalidades do acordo.
2.4.3. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL constituirá, ou zelará para que seja constituído um Comitê de Curadoria Social (CCS) até 90 (noventa) dias após a assinatura deste ACORDO, composto por até 5 (cinco) membros, com reputação ilibada e trajetória
reconhecida em organizações da sociedade civil, no investimento social e/ou áreas temáticas cobertas na destinação deste recurso, o qual supervisionará a constituição da fundação.
(...)
2.5. Os valores mencionados no Item 2.3.2. permanecerão depositados em conta judicial remunerada e, decorrido o prazo de 2 (dois) anos, como forma de proporcionar desde logo um benefício social por meio da utilização dos recursos, os acréscimos a
título de correção monetária e rendimentos passarão a ser destinados para a finalidade prevista no item 2.3.1 .
2.5.1. Caso não sejam plenamente utilizados esses valores para a finalidade prevista, no prazo de 5 (cinco) anos, eventual saldo existente será destinado na forma do item 2.3.1.
2.5.2. O prazo referido no item anterior poderá ser prorrogado, a pedido da PETROBRAS, por decisão discricionária do Ministério Público, por 1 (um) ano, renovável em caráter excepcional.
2.5.3. Os valores utilizados para esse fim não implicarão, em nenhuma hipótese: reconhecimento de responsabilidade por dolo ou culpa, nos termos do item 1.4.
2.6. Em nenhuma hipótese, os valores destinados pela PETROBRAS em decorrência do disposto nesta Cláusula permanecerão sob a sua responsabilidade, ou serão a ela restituídos.
2.7. Para a execução deste ACORDO, cada parte se responsabilizará por obter os bens materiais e equipamentos necessários ao desempenho de suas obrigações, ou usará aqueles próprios, não sendo devido nenhum reembolso entre as partes.
CLÁUSULA TERCEIRA - DA FISCALIZAÇÃO
3.1. Fica assegurado ao MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por meios próprios, o direito de fiscalizar o cumprimento das obrigações assumidas na cláusula segunda, sem prejuízo das atribuições próprias do MINISTÉRIO PUBLICO a serem por ele exercidas, como
decorrência da aplicação da legislação vigente.
3.2. Sem prejuízo da disposição supra, a PETROBRAS se compromete a:
(i) manter o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL sempre atualizado dos andamentos dos Processos Judiciais e Arbitrais de que tratam as destinações do item 2.3.21;
(ii) encaminhar ao MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, sempre que solicitado, cópia integral dos autos dos Processos Judiciais e Arbitrais;
(iii) não se opor a eventual pedido de ingresso do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL nos Processos Judiciais e Arbitrais;
(iv) fornecer documentos e informações solicitados pelo MINISTÉRIO PUBLICO FEDERAL em conexão com o objeto do presente ACORDO;.
O Acordo de Assunção de Compromissos realizado pelos Procuradores da República do Paraná (Força-Tarefa Lava-Jato) e Petrobras foi impugnado perante esta CORTE, tendo a PGR, na ADPF 568, apontado que a decisão judicial que homologou o Acordo de
Assunção de Compromissos, ao conferir plena eficácia jurídica aos seus termos, violou preceitos fundamentais da Constituição Federal, como a separação dos Poderes (art. 2º, c/c art. 60, § 4º, III, da CF), sob a perspectiva de divisão funcional de
atribuições constitucionais e de um sistema de controle recíproco dos limites e vedações no exercício dessas funções, a fim de evitar a confusão e concentração excessiva de poderes.
A PGR sustentou ter ocorrido extrapolação de atribuições constitucionais e legais por parte dos membros da Procuradoria da República no Paraná que, sem possuírem legitimidade e por não representarem a Chefia da Instituição do Ministério Público
Federal, firmaram o Acordo de Assunção de Compromissos, em desrespeito às atribuições conferidas pelo texto constitucional a outros órgãos e autoridades, inclusive à própria Procuradoria-Geral da República.
Na Reclamação 33.667, a Câmara dos Deputados alegou que a decisão homologatória violou a competência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, pois parte dos inquéritos e ações penais relacionados à Operação Lava-Jato tramitaram e ainda tramitam perante a CORTE,
o que justificou a celebração de acordos nesta instância, atraindo também a competência para a homologação do Acordo de Assunção de Compromissos. Além disso, da mesma maneira que a PGR, apontou a existência de clara usurpação de competências de outros
órgãos por parte da Procuradoria da República no Paraná.
Determinei a tramitação conjunta dos dois processos e, presentes os requisitos necessários, em especial por se tratar de acordo implementado por órgãos incompetentes, em 15 de março do presente ano, concedi a medida cautelar postulada na ADPF, ad
referendum do Plenário (art. 5º, § 1º, da Lei 9.882/1999), para, com base no art. 5º, § 3º, da Lei 9.882/1999:
(a) suspender todos os efeitos da decisão judicial proferida pelo Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba, que homologou o Acordo de Assunção de Obrigações firmado entre a Petrobras e os Procuradores da República no Paraná (Força-Tarefa Lava-Jato),
bem como a eficácia do próprio acordo;
(b) determinar o imediato bloqueio de todos os valores depositados pela Petrobras, bem como subsequentes rendimentos, na conta corrente designada pelo juízo da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba que, a partir desta decisão, deverão permanecer em
depósito judicial vinculado ao mesmo Juízo, proibida qualquer movimentação de valores sem expressa decisão do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL;
(c) determinar a suspensão de todas as ações judiciais, em curso perante qualquer órgão ou Tribunal, ou que, eventualmente, venham a ser propostas e que tratem do objeto impugnado na presente ADPF;
(d) comunicar, com urgência, ao Juízo da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba, solicitando-lhe informações, no prazo de 10 (dez) dias, na forma do art. 6º da Lei 9.882/1999;
(e) intimar todos os subscritores do acordo homologado perante a 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba para a apresentação de informações, no prazo de 10 (dez) dias;
(f) intimar a Câmara dos Deputados, a Advocacia-Geral da União, o Presidente da Petróleo Brasileiro S/A, para a apresentação de informações, no prazo comum de 10 (dez) dias;
(g) oficiar ao Tribunal de Contas da União, solicitando-lhe informações sobre a eventual existência de procedimento no âmbito daquela Corte, com objeto semelhante.
Os processos foram devidamente instruídos.
O Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba prestou informações (peça 31) indicando, inclusive, que os valores depositados em juízo foram geridos pela Caixa Econômica Federal mediante o expediente de conta gráfica, de rentabilidade mais vantajosa, tendo
sido autorizada por esta Relatoria a continuidade desse procedimento (despacho de 19/3/2019, peça 48).
A PGR promoveu, em conformidade com o art. 192, parágrafo único, do Código de Processo Civil, a juntada de traduções juramentadas dos termos de acordo firmados pela Petrobras nos EUA (peça 50).
Em ofício enviado ao Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba (peça 51), a Caixa Econômica Federal esclareceu que o saldo total do acordo homologado encontra-se bloqueado em conta gráfica e apenas será movimentado mediante decisão da Suprema Corte.
A CEF informa ainda que a conta gráfica somente poderia ser acessada pela Tesouraria da Caixa e, em razão disso, não constava do sistema informatizado da agência. E mais, apontou que o valor depositado na conta gráfica é remunerado mensalmente pela taxa
SELIC, e que incide um desconto mensal no valor de R$ 12.500,00 em favor da CEF, referente à taxa de manutenção.
Em complemento às informações prestadas nos autos (peça 52), o Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba afirmou ter determinado à CEF que o numerário em questão deverá permanecer vinculado ao juízo, com o bloqueio já determinado, vedada qualquer
movimentação sem expressa decisão do Supremo Tribunal Federal, mantidos os critérios de correção e de juros aplicados até o momento, definidos na denominada conta gráfica. Além disso, encaminhou as informações recebidas em relação às condições
contratuais em que depositados os valores pagos pela Petrobras.
O Tribunal de Contas da União veio aos autos (peça 84), informando que existem naquela Corte três processos envolvendo o objeto da ADPF, destacando-os: (a) o TC 005.557/2019-4 trata de denúncia contra o Acordo de Assunção de Compromissos celebrado
entre membros da Procuradoria da República no Paraná e a Petrobras, em que os autos se encontram instruídos aguardando pronunciamento do Ministro Relator; (b) o TC 005.840/2019-8 se refere à representação formulada pelo Subprocurador-Geral do MP no TCU,
cujo objeto diz respeito às possíveis irregularidades no acordo extrajudicial celebrado entre o MPF e a Petrobrás; e (c) o TC 005.844/2019-3, que tem por objeto representação formulada por Deputados Federais em face do mencionado acordo celebrado
entre o MPF e a Petrobras. Destaca, ao final, que os dois últimos processos estão em fase de instrução.
Em despacho de 29/3/2019 (peça 88), determinei a expedição de ofício à CEF para que apresentasse cópia de documentos relacionados às tratativas sobre a transferência de valores e opção de investimento negociada; bem como à Petrobras para juntada de
cópia de atas de Assembleias Gerais, reuniões do Conselho de Administração e atos deliberativos a respeito do acordo tratado na ação.
Em sua manifestação (peça 89), o Advogado-Geral da União pleiteou a procedência do pedido, requerendo:
(a) o reconhecimento da nulidade do Acordo de Assunção de Obrigações celebrado entre o MPF e a Petrobras; (b) que a sanção aplicada nos EUA seja reconhecida como multa prevista na Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013), de natureza administrativa e de
competência da Controladoria-Geral da União para sua aplicação; (c) que seja reconhecida a competência da Controladoria-Geral da União para representar a sociedade e Estado brasileiro em relação à internalização das sanções impostas pelos Estados
Unidos à Petrobras, ou, subsidiariamente, que essa atribuição seja da Advocacia-Geral da União; (d) que os valores objeto das sanções impostas pelos EUA se revertam, na sua integralidade, à União; (e) que os valores recebidos pelo Estado brasileiro
sejam destinados e utilizados em conformidade com as normas constitucionais e legais de natureza financeira e orçamentária; e (f) o reconhecimento, em medida excepcional, pela legítima destinação fundiária dos valores devidos à União na espécie,
mediante aplicação analógica da legislação do FUNPEN (artigo 2º, inciso IV, da LC 79/1994).
A Câmara dos Deputados apresentou informações (peça 94), aduzindo, em síntese, que o acordo firmado entre o MPF do Paraná e a Petrobras somente poderia ser homologado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, além de sustentar que o MPF não possui competência
para dispor sobre a destinação de valores pertencentes ao Tesouro Nacional, sob pena de violar o princípio da separação de poderes e princípios orçamentários. Por fim, requereu a cassação do ato impugnado e a determinação para que os valores depositados
pela Petrobras sejam transferidos ao Tesouro Nacional.
Em sua manifestação, a Procuradora-Geral da República (peça 95) refutou a tese levantada quanto à possibilidade de aplicação, por analogia, do disposto na Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), ao argumento de que a Petrobras foi vítima de um esquema
criminoso. Além disso, rememora a vedação constante no acordo firmado entre os EUA e a Petrobras, quanto à impossibilidade de a verba depositada se reverter em favor da estatal, e afirma que há mecanismos de ingresso desses valores no orçamento da
União, em ações orçamentárias específicas e que não impliquem em transferência, direta ou indireta, para a Petrobras.
Em petição (peça 103), a Petrobras requer confidencialidade para juntada de documentos nos autos, com a finalidade de resguardar informações de natureza negocial da Companhia, uma vez que os documentos a serem juntados dizem respeito ao que foi
tratado e decidido em âmbito do respectivo órgão deliberativo.
Em despacho de 24/4/2019 (peça 122), requisitei informações adicionais ao Presidente da República, ao Congresso Nacional, à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e à Secretaria do Tesouro Nacional.
O Conselho Federal da OAB (peça 130) pugnou pela procedência do pedido, sob o fundamento de que o acordo firmado entre o MPF e a Petrobras violou (a) os princípios da legalidade e da impessoalidade; (b) os limites das funções ministeriais; (c) o
princípio da separação dos poderes; e (d) os princípios orçamentários.
O Presidente da República, em sua manifestação (peça 145), sustentou, em síntese, que o Ministério Público Federal não possui competência para celebrar acordo de cumprimento das obrigações da Petrobras assumidas perante o Governo dos EUA, mas sim a
Controladoria-Geral da União. Alega também que os recursos depositados pela estatal devem ser incorporados ao orçamento da União e revertidos ao Tesouro Nacional.
A Câmara dos Deputados, em nova manifestação (peça 154), reitera as informações prestadas nos autos (peça 94) e afirma que, na conformidade do acordo celebrado entre a Petrobras e os EUA, o valor devido pela estatal seria feito em nome das
autoridades brasileiras e do Brasil, e não do Ministério Público. Também aduz que o MPF não poderia ter estabelecido a destinação do valor pago pela estatal, sendo competente para tanto o Congresso Nacional. Quanto à alegação de que o pagamento
realizado pela Petrobras não poderia ser feito à União, tendo em vista que o ente é acionista majoritário da estatal, sustenta que a transferência seria ao Tesouro Nacional, e isso não implicaria na sua reversão, sequer indireta, em favor da estatal.
Por fim, registra que a Petrobras cumpriu sua obrigação perante as autoridades brasileiras, estando pendente apenas decisão quanto à destinação dos valores depositados.
Nos termos do artigo 6º, § 2º, da Lei 9.882/1999 e dos artigos 3º, § 2º, e 139, V, do Código de Processo Civil, esta Relatoria realizou audiências e presidiu reuniões multilaterais com as autoridades e os órgãos e envolvidos, visando à efetiva
solução do litígio, em respeito aos Princípios da Razoável Duração do Processo (CF, art. 5º, LXXVIII) e da Eficiência (CF, art. 37, caput).
Participaram das reuniões a Procuradora-Geral da República e equipe, o Presidente da Câmara dos Deputados, o Presidente do Senado Federal, o Advogado-Geral da União, o Ministro da Secretaria-geral da Presidência da República, a Ministra da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o Procurador-Geral da Fazenda Nacional e representantes dos Ministérios da Economia e da Defesa.
Além de suas manifestações por escrito, os participantes reconheceram, nas reuniões, de maneira unânime: a ilicitude do Acordo de Assunção de Compromissos realizado pela Petrobras e Procuradores da República no Paraná (Força-Tarefa Lava-Jato); ser
a União a destinatária dos valores depositados pela Petrobras; a impossibilidade de os valores depositados serem revertidos para os órgãos que atuam perante a Justiça, inclusive o próprio Ministério Público, ou serem revertidos para a Petrobras; bem
como a condição de vítima da União e da Petrobras, em virtude dos atos ilícitos praticados por agentes públicos e terceiros.
Por fim, houve pedido de homologação do Termo de Acordo firmado em 5/9/2019 (peças 197 e 200), no SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, pela Procuradora-Geral da República, pelo Presidente da Câmara dos Deputados e pelo Advogado-Geral da União, com a
interveniência do Presidente do Senado Federal e do Procurador-Geral da Fazenda Nacional.
É o relatório.
(STF, ADPF 568, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Decisão Monocrática, Julgado em: 17/09/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-203 DIVULG 18/09/2019 PUBLIC 19/09/2019)