PREVIDENCIÁRIO. CUMULACAO (DE BENEFICIOS) - PEDIDOS GENERICOS RELATIVOS AOS BENEFICIOS EM ESPECIE.
1. Pedido de cancelamento do benefício NB: 162.635.190-0, com a concessão de outro benefício mais vantajoso; bem como o cancelamento do contrato de empréstimo consignado realizado por terceiros em seu benefício, e a reparação dos danos morais sofridos.
2. Sentença de parcial procedência lançada nos seguintes termos:
"(...)
Aduz que, após a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição acima citado, resolveu renunciá-lo, objetivando obter benefício mais vantajoso.
Contudo, terceira pessoa passou a receber o benefício como se fosse o autor, realizando empréstimo consignado e seguro junto à CEF, com documentos
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...falsos.
Nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95, está dispensado o relatório.
Passo diretamente ao julgamento.
Rejeito a preliminar de inépcia da inicial, sustentada pela CEF, uma vez que a pretensão do autor é clara, possibilitando a defesa dos requeridos. Da mesma forma, não há falar em ilegitimidade passiva do INSS, porquanto o ato de direcionamento do benefício para a CEF se deu na própria autarquia, que também poderia ter verificado melhor a identificação do requerente.
Passo ao exame do mérito.
Em relação ao primeiro pedido (cancelamento do benefício), trata-se de típica pretensão de desaposentação, conforme claramente se verá pelo procedimento administrativo anexado no arquivo 3, fls. 07/95.
No dia 30/07/2013, o autor compareceu ao INSS, requerendo o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (fls. 08/09 do arquivo 3), informando seu endereço na rua Dona Mariquinha, 57, Vila Rodini, Araras/SP, nomeando como seu procurador, o contabilista (...).
O benefício foi indeferido a fls. 54 do arquivo 3, por falta de tempo de contribuição. A notificação contendo a decisão de indeferimento do benefício foi recebida por Vanda Silva, esposa do autor, em 11/09/2013 (fls. 56).
Inconformada com o indeferimento administrativo, a parte autora apresentou recurso a fls. 58/59 do arquivo 3, deferido a fls. 78, concedendo o benefício a partir da DER (30/07/2013), com correspondência enviada ao endereço do autor em 29/10/2013, recebida pela esposa do autor, que assim assinou no AR de fls. 95 do arquivo 3, em 29/10/2013: "(...) R. B. (...)".
Logo, o pedido de desfazimento do ato de concessão do benefício, apresentado em 09/12/2015, não se justifica, porquanto representa hipótese de desaposentação.
A desaposentação foi assim muito bem conceituada pela eminente Desembargadora Federal Marisa Ferreira dos Santos (Direito Previdenciário Esquematizado, São Paulo: Saraiva, 2011, p. 326) "a desconstituição do ato de concessão da aposentadoria, que depende da manifestação de vontade do segurado.".
A correspondência endereçada ao INSS pelo autor, consoante suas alegações na inicial, emitida 30 (trinta) dias após a concessão do benefício, não aparece nos autos.
Com isso, o pleito de cancelamento do benefício não pode prevalecer, na medida em que não pode aquele que se beneficiou da solidariedade emanada de um sistema de repartição simples vir, agora, contra legem, postular medida judicial que faça prevalecer modelo previdenciário diverso, a saber, o de capitalização, tal como bem ensina (...) (Direito Previdenciário Esquematizado, São Paulo: Saraiva, 2011, p. 328-332).
Chega a ser bastante curiosa a intenção de fundar a desaposentação na Constituição e no sistema jurídico como um todo quando é clara a contradição não apenas jurídica, mas até ética, de majoração de benefício previdenciário de forma individual daqueles que para aposentar-se foram beneficiados amplamente por toda a Sociedade, negando-se, agora, a colaborar com os demais que os ajudaram a jubilar-se, não raramente, mais cedo do que seria possível na maior parte dos países do globo terrestre nos quais praticamente inexistem jubilações antes dos 60, 65 anos.
A ilegalidade do pleito emerge clara da leitura do art. 18, § 2º, da Lei de Benefícios, cuja redação é a que segue:
"§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social - RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional."
Veja-se que há ainda, outra previsão legal impeditiva da desaposentação, a saber, o art. 96, II, ainda da Lei de Benefícios e, por fim, a previsão regulamentar do art. 181 -B do Decreto 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social).
Note-se que a solidariedade previdenciária já tinha se manifestado com toda sua formação quando da abolição do benefício previdenciário do "pecúlio" pela Lei Federal 8.870/94, de forma que a desaposentação busca judicialmente reformar o ordenamento jurídico em sentido oposto ao resultado da deliberação política regular ocorrida anos atrás. Ainda que a jurisdição constitucional tenha viés contra majoritário, não se vê como poderia ser compreendida a revisão almejada via desaposentação seria uma cláusula pétrea e/ou uma defesa de uma minoria contra uma maioria ocasional.
Tal cenário normativo nada mais representa do que um debate já feito em sede política onde já foi afastada a desaposentação como bem explica (...) (Direito Previdenciário Esquematizado, São Paulo: Saraiva, 2011, p. 330 e 331), de forma que inequívoca a opção legislativa democraticamente adotada no sentido de evitar a manobra da desaposentação.
No mesmo sentido, veja-se aresto relatado pelo eminente Desembargador Federal Peixoto Júnior:
(...)
O argumento lançado no aresto acima é irrespondível: a desaposentação não é uma verdadeira renúncia, pois busca majorar aposentadoria, ao invés do puro ato de deixar de percebê-la, hipótese na qual, aí sim, haveria verdadeira renúncia.
Em igual sentido, acórdão da relatoria da Desembargadora Federal Marisa Ferreira dos Santos:
(...)
Em sede de Embargos Infringentes, uniformizando entendimento e inclusive com mudança de posicionamento por parte de Desembargador Federal, veja-se o julgado do TRF2 que mostra ser completamente falsa a propaganda que vem sendo feita nos meios jurídicos no sentido de que a única controvérsia que remanesceria seria a de ser a desaposentação impositiva ou não dos valores já recebidos:
(...)
Note-se, também, ser a desaposentação uma questão que reprisa a polêmica sobre a contribuição sobre os valores percebidos até mesmo na inatividade, sendo que o Supremo Tribunal Federal posicionou-se pela constitucionalidade da exação. Qual o fundamento?
A solidariedade devida entre os indivíduos, sob pena de isolados negarmos nossa condição gregária, tratando-nos como seres-para-si e descurando também sermos seres-com-os-outros.
Por fim, em decisão histórica proferida em 26/10/2016, o E. STF pacificou a matéria no mesmo entendimento deste magistrado, declarando a constitucionalidade do art. 18, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, para fixar o entendimento de que somente a lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias. Eis o tópico síntese do julgado:
(...)
Assim, o pedido de cancelamento do benefício formulado nestes autos, seguido de nova concessão, não pode ser acolhido.
Já em relação ao recebimento das parcelas do benefício por terceira pessoa, as alegações do autor se mostram verossímeis, sem prejuízo da manifesta concorrência de culpas, quando se percebe que o autor também foi negligente com seu pedido de benefício previdenciário, seguido de recurso administrativo e posterior desistência sem fundadas razões.
A esposa do autos recebeu uma correspondência do INSS, informando a concessão do benefício (fls. 95 do arquivo 3), à disposição no Banco Mercantil do Brasil (banco 389 - fls. 96). Todavia, relatou o autor na inicial que procurou orientações do Banco Mercantil e da Caixa Econômica Federal? Por que a Caixa Econômica Federal, se o benefício estava à disposição no Banco Mercantil do Brasil?
Pelo que consta nos autos, quem direcionou o benefício para a Caixa Econômica Federal de Hortolândia/SP, abriu uma conta poupança naquele município e para lá direcionou as rendas mensais do benefício do autor foi a pessoa que assinou o nome do autor no documento de fls. 99 do arquivo 3 em 29/05/2014, apontada como o falsário que se passou pelo autor.
Nesta data, o autor já sabia da concessão do benefício no Banco Mercantil do Brasil (fls. 95/96), mas não deveria ter qualquer conhecimento de sua transferência fraudulenta para a CEF de Hortolândia/SP.
Assim, seja porque não houve qualquer comprovação do pedido do autor formulado ao INSS, objetivando cancelar o benefício em tempo, seja porque suas alegações se mostram um tanto incongruentes, na procura de informações na CEF, quando seu benefício estava disponível no Banco Mercantil do Brasil, não há falar em reparação por danos morais em desfavor dos requeridos.
Desta forma, em que pese o desconforto do autor em ver seu benefício pago a pessoa desconhecida, não verifico, no caso, hipótese de reparação por danos morais, considerando o descaso do autor com o ato de concessão de seu benefício sem qualquer interesse de sua parte, o que possibilitou a atuação de falsários, diante de sua inércia.
Registre-se a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o aborrecimento, sem consequências graves, por ser inerente à vida em sociedade - notadamente para quem escolheu viver em grandes centros urbanos -, é insuficiente à caracterização do abalo, tendo em vista que este depende da constatação, por meio de exame objetivo e prudente arbítrio do magistrado, da real lesão à personalidade daquele que se diz ofendido. Como leciona a melhor doutrina, só se deve reputar como dano moral a dor, o vexame, o sofrimento ou mesmo a humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, chegando a causar-lhe aflição, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Precedentes. (AgRg no REsp 1269246/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/05/2014, DJe 27/05/2014).
O INSS deverá pagar todas as parcelas do benefício ao autor (NB: 162.635.190-0), desde a DIB, uma vez que o erro de direcionamento das parcelas do benefício ocorreu em suas dependências (fls. 96/99), com a atuação de falsários e, a toda evidência, os valores não foram recebidos pelo autor.
A CEF, por sua vez, deverá cancelar o empréstimo consignado e o seguro em nome do autor, cujos contratos e conta poupança foram abertos sem o seu conhecimento, por terceiros.
A prova oral confirmou a situação de fraude no recebimento das parcelas do benefício, mas não trouxe maiores esclarecimentos acerca da conduta dos réus, que também foram vítimas, mas deverão responder pelo descuido na identificação do segurado (INSS), pagando novamente as rendas mensais, agora à pessoa certa; e na identificação do correntista (CEF), cancelando o empréstimo consignado e seguro contratados, sem custo ao autor.
Ademais, o que demonstram as máximas da experiência é que segurados que insistem nos recursos administrativos dificilmente discordam do ato de concessão que atendeu sua pretensão recursal, de modo que a parcial procedência do pedido é medida que mais se adequa ao presente feito.
DISPOSITIVO
Posto isso, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido do autor, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do NCPC, para condenar o INSS a restabelecer o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao autor (NB: 162.635.190-0), pagando-lhe as parcelas atrasadas desde à DIB; bem como condenar a CEF a cancelar o empréstimo consignado e o seguro prestamista realizados por interposta pessoa em nome do autor na agência da Caixa em Hortolândia, nos termos da fundamentação supra.
Nos termos do art. 497 do NCPC, determino ao INSS a implementação do benefício suspenso, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena das sanções inerentes à espécie. Fixo a DIP em 01/12/2018. Oficie-se à APSDJ".3. Recurso da parte autora: requer "seja modificada parcialmente a respeitável sentença referente a data de aposentadoria, sendo esta a partir do abril de 2016, com o computo das contribuições do recorrente até a data da entrada nos autos".4. Não obstante a relevância das razões apresentadas pelo (a) recorrente, o fato é que todas as questões suscitadas pelas partes foram corretamente apreciadas pelo Juízo de Primeiro Grau, razão pela qual a r. sentença deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95.5. RECURSO A QUE NEGA PROVIMENTO.6. Condeno o recorrente ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação, limitados a seis salários-mínimos. Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência judiciária gratuita, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do
artigo 98,
§ 3º, do
CPC.7. É o voto.
ACÓRDÃO
Visto, relatado e discutido este processo, em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Primeira Turma Recursal do Juizado Especial Federal Cível da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Juíza Federal Relatora. Participaram do julgamento os Senhores Juízes Federais: Maíra Felipe Lourenço, Paulo Cezar Neves Junior e Luciana Melchiori Bezerra.
São Paulo, Sessão Virtual de 28 a 30 de abril de 2020.
(TRF 3ª Região, 11ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO, 16 - RECURSO INOMINADO - 0000938-27.2016.4.03.6333, Rel. JUIZ(A) FEDERAL MAIRA FELIPE LOURENCO, julgado em 30/04/2020, e-DJF3 Judicial DATA: 11/05/2020)