DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. QUEIXA-CRIME. REJEIÇÃO DA INICIAL. CRIMES CONTRA A HONRA E INFRAÇÕES DE AÇÃO PENAL PÚBLICA. PREJUDICIAL DE MÉRITO. OCORRÊNCIA DA DECADÊNCIA. LAPSO TEMPORAL SUPERIOR A SEIS MESES ENTRE A CIÊNCIA DA AUTORIA E O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. ILEGITIMIDADE ATIVA "AD CAUSAM" QUANTO AOS CRIMES DE AÇÃO PÚBLICA. AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA. INEXISTÊNCIA DE INÉRCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ATUAÇÃO MINISTERIAL QUE CONCLUIU PELA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA E PELA LICITUDE DA CONDUTA DOS AGENTES ESTATAIS. OBSERVADO IRREGULARIDADE NA REPRESENTAÇÃO
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...PROCESSUAL. PROCURAÇÃO GENÉRICA. ART. 44 DO CPP. POSSIBILIDADE DE FLEXIBILIZAÇÃO QUANTO À DESCRIÇÃO FÁTICA QUE NÃO ISENTA A NECESSIDADE DE MENÇÃO AO TIPO PENAL. PROCURAÇÃO QUE NÃO NARRA OS FATOS E SEQUER APONTA OS DISPOSITIVOS LEGAIS OU O NOMEN IURIS DOS DELITOS. INÉPCIA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. PENAS MÁXIMAS EM ABSTRATO INFERIORES A DOIS ANOS. TRANSCURSO DE MAIS DE QUATRO ANOS SEM MARCO INTERRUPTIVO VÁLIDO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
I. Caso em exame:
1. Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto contra decisão que rejeitou queixa-crime ajuizada para apurar supostos crimes de constrangimento ilegal, injúria, difamação, lesão corporal, abuso de autoridade e prevaricação, ocorridos durante evento público em outubro de 2019. A recorrente alega ter sido retirada à força do local por policiais e civis, sofrendo vexame e lesões. O juízo de origem rejeitou a inicial por inépcia e ausência de justa causa. A recorrente busca o recebimento da peça acusatória.
II. Questão em discussão:
2. Há três questões em discussão, saber se: (I) operou-se a decadência do direito de queixa, considerando o lapso temporal entre o fato e o protocolo da ação; (II) a querelante possui legitimidade para propor ação penal privada subsidiária da pública, a depender da configuração ou não da inércia ministerial; e (III) A procuração outorgada atende aos requisitos do art. 44 do CPP. (IV) Ocorreu a prescrição da pretensão punitiva estatal.
III. Razões de decidir:
3. A decadência é causa extintiva da punibilidade. Os fatos ocorreram em 13/10/2019, com ciência imediata da autoria, mas a queixa-crime foi oferecida apenas em 17/09/2020, ultrapassando o prazo de seis meses previsto no art. 38 do CPP e art. 103 do CP.
4. Quanto aos crimes de ação pública (lesão corporal, abuso de autoridade), não cabe ação subsidiária, pois não houve inércia do Ministério Público. O Parquet atuou ativamente, analisando o inquérito e concluindo pela licitude da conduta policial (estrito cumprimento do dever legal) e imputando crime de resistência à própria recorrente.
5. O instrumento de mandato não preenche os requisitos do art. 44 do Código de Processo Penal. Embora a jurisprudência admita flexibilidade dispensando a descrição pormenorizada dos fatos quando há indicação do dispositivo legal, a procuração destes autos não preenche sequer esse requisito mínimo, pois não descreve o fato criminoso nem faz menção à tipificação legal ou ao “nomen iuris” dos delitos.
6. Reconhecimento, de ofício, da prescrição da pretensão punitiva. Os fatos ocorreram em 2019 e, considerando que as penas máximas abstratas são inferiores a 2 (dois) anos, o prazo prescricional é de 4 (quatro) anos (art. 109, V, do CP). A decisão de rejeição da queixa não interrompe a prescrição, encontrando-se a punibilidade extinta pelo decurso do tempo.
IV. Dispositivo e tese:
7. Recurso conhecido e desprovido.
Teses de julgamento:
“1. O prazo para o exercício do direito de queixa é de 6 (seis) meses, contados do dia em que o ofendido vem a saber quem é o autor do crime, operando-se a decadência se não exercido tempestivamente.
2. A ação penal privada subsidiária da pública pressupõe a inércia do Ministério Público, não se caracterizando esta, quando o órgão ministerial atua no feito, concluindo pela ausência de justa causa, ainda que em sentido contrário aos interesses da vítima.
3. Ainda que a jurisprudência flexibilize a necessidade de descrição fática na procuração, é inepta a queixa-crime quando o instrumento de mandato não descreve os fatos e sequer indica os dispositivos legais ou a denominação jurídica do crime, violando o art. 44 do CPP.
4. A decisão que rejeita a denúncia ou queixa não constitui marco interruptivo da prescrição; transcorrido o lapso temporal previsto no art. 109 do Código Penal, impõe-se o reconhecimento da extinção da punibilidade estatal."
Dispositivos relevantes citados:
CP, arts. 38, 103, 107, IV, 109, V e VI, 129, 139, 140, 1º, I, 141, 145, III, 146. CPP, arts. 29, 38, 44, 395, II e III, 568, 806. Lei nº 13.869/19, arts. 9º e 12.
Jurisprudências relevantes citados:
STF, Pet: 10294 DF, Rel. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, j. 13.03.2023.
STF, HC 247135, Rel. Min. Cristiano Zanin, Primeira Turma, j. 19.11.2024.
STJ, AgRg no REsp: 1978298 CE, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, j. 28.02.2023.
STJ, AgRg no REsp: 1508560 SP, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 06.11.2018.
STJ, AgRg no REsp 2101698, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, j. 18.12.2023.
TJ-MG, AP: 29747353920228130000, Rel. Des. Fortuna Grion, 3ª Câmara Criminal, j. 18.04.2023.
TJ-DF, 07286671420228070001, Rel. Esdras Neves, 1ª Turma Criminal, j. 03.08.2023.
TJ-BA, RSE: 00003856620188050077, Rel. Des. Nagila Maria Sales Brito, 2ª Turma Criminal, j. 26.08.2024.
(TJ-MT, N.U 1002298-26.2020.8.11.0046, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 03/12/2025, Publicado no DJE 03/12/2025)