PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA) E STF (REPERCUSSÃO GERAL). INAPLICABILIDADE. DISTINÇÃO. FEITO JULGADO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. QUALIDADE DE SEGURADO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. COMPANHEIRA E FILHOS. PROVA MATERIAL E TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO. DESEMPREGO. BAIXA RENDA. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (RESP 1.485.417/MS). TEMA 896. REGIME ANTERIOR À VIGÊNCIA DA
MP 871/2019. TERMO INICIAL. DATA DO RECOLHIMENTO PRISIONAL (AUTORA ABSOLUTAMENTE INCAPAZ). DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO (AUTORA MAIOR E CAPAZ). DATA DO NASCIMENTO (AUTOR NASCIDO APÓS A RECLUSÃO). CORREÇÃO MONETÁRIA.
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...JUROS DE MORA. CUSTAS. MATO GROSSO DO SUL. PRELIMINAR REJEITADA E, NO MÉRITO, APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA, POR FUNDAMENTO DIVERSO.
1 - O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE nº 631.240/MG, resolvido nos termos do artigo 543-B do CPC/73, assentou o entendimento de que a exigência de prévio requerimento administrativo a ser formulado perante o INSS antes do ajuizamento de demanda previdenciária não viola a garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CR/88, art. 5º, XXXV). Ressalvou-se, contudo, a possibilidade de formulação direta do pedido perante o Poder Judiciário quando se cuidar de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, ou ainda, quando notório e reiterado o entendimento do INSS em desfavor da pretensão do segurado.
2 - Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça revisitou sua jurisprudência de modo a perfilhar o posicionamento adotado pela Suprema Corte, o que se deu quando do julgamento do RESP nº 1.369.834/SP, resolvido nos termos do artigo 543-C do CPC/73.
3 - Neste feito, busca-se a concessão de benefício previdenciário de auxílio-reclusão, não sendo, portanto, a hipótese de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido. Da mesma forma, o pleito não se enquadra nos casos em que notória ou reiterada a resistência autárquica.
4 - O caso sub examen, contudo, detém a peculiaridade de já ter sido decidido em primeiro grau de jurisdição. E, se assim o é, há que se fazer a necessária distinção entre a situação posta nesta demanda e aquela presente no julgamento paradigma, de forma a se verificar a ocorrência de similitude fática entre elas.
5 - Malgrado tenha a ação sido proposta após o precedente do C. STF, fato é que o INSS ofereceu contestação abrangendo, tão somente, o mérito, de forma a caracterizar resistência à pretensão formulada, havendo, ainda, o exaurimento da fase instrutória, com a produção de provas e manifestação das partes, tudo a ensejar a prolação de sentença de mérito.
6 - Foge à razoabilidade, portanto, reabrir-se a instrução processual na hipótese em que aperfeiçoados - com a observância do contraditório - todos os atos probatórios, situação que, em boa medida, desprestigiaria o princípio da duração razoável do processo, alçado, inclusive, a preceito constitucional. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
7 - Reconhecida a ausência de similitude fática entre o caso ora posto a julgamento e o precedente firmado pelo STF, razão pela qual se revela desnecessária, aqui, a prévia postulação administrativa.
8 - O auxílio-reclusão “cumprida a carência prevista no inciso IV do caput do art. 25 desta Lei, será devido, nas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado de baixa renda recolhido à prisão em regime fechado que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de pensão por morte, de salário-maternidade, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço” (Art. 80 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 13.846/2019).
9 - Os critérios para a concessão estão disciplinados nos artigos 116 a 119 do Decreto nº 3.048/99, que aprovou o Regulamento da Previdência Social.
10 - O benefício, até a edição da Lei nº 13.846/2019, independia de carência, destacando-se que, nos dias presentes, exige-se o implemento de 24 (vinte e quatro) contribuições mensais. Ademais, para sua concessão, faz-se imperioso o cumprimento dos seguintes requisitos: a) recolhimento à prisão do segurado; b) manutenção da qualidade de segurado do recluso; c) baixa renda do segurado; e d) dependência econômica do postulante.
11 - A comprovação da privação de liberdade, que deve, atualmente, ser obrigatoriamente em regime fechado (admitindo-se, todavia, o regime semiaberto nos casos em que o requerimento do benefício se der em momento anterior às alterações promovidas pela Lei nº 13.846/2019), dar-se-á por meio de certidão do efetivo recolhimento à prisão firmada pela autoridade competente, a ser apresentada trimestralmente.
12 - A manutenção da qualidade de segurado se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
13 - Acerca do requisito da baixa renda, decidiu o STF em sede de repercussão geral, que "a renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes" (RE 587365, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 25/03/2009, DJE 08/05/2009).
14 - Considera-se baixa renda aquela de valor bruto mensal igual ou inferior ao limite legal, considerado o último salário de contribuição percebido pelo segurado à época da sua prisão.
15 - Originalmente, o limite legal foi fixado em R$ 360,00, pela EC nº 20/98, sendo, atualmente, corrigido pelo Ministério da Previdência Social pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.
16 - Outro ponto importante gira em torno do segurado que não exerce atividade remunerada abrangida pela Previdência Social quando do seu encarceramento. Tal questão restou decidida pelo C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.485.417/MS, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia, que fixou a seguinte tese: "Para a concessão de auxílio-reclusão (art. 80 da Lei 8.213/1991), o critério de aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição." (REsp 1.485.417/MS, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 22/11/2017, v.u., DJe 02/02/2018).
17 - Insta consignar que a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça instaurou procedimento de revisão da tese firmada no tema em questão, decidindo pela sua reafirmação, ressaltando, contudo, que o regime jurídico objeto da controvérsia é o anterior à inclusão do § 4º do art. 80 da Lei nº 8.213/1991, pela Lei nº 13.846/2019.
18 - O recolhimento à prisão e os requisitos relativos à qualidade de segurado do recluso e dependência econômica dos postulantes menores restaram comprovados, conforme certidão de recolhimento prisional, cópia da CTPS e extrato do CNIS e cópia da certidão de nascimento dos autores (...).
19 - A celeuma cinge-se quanto à qualidade de companheira da coautora Marinalva e ao requisito da baixa renda.
20 - Nos termos do art. 16, inciso I, da Lei nº 8.213/91, com a redação vigente à época dos fatos, são dependentes do segurado: “o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;”.
21 - O §3º do art. 16 da Lei de Benefícios dispõe que: "Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal".
22 - Por sua vez, o Decreto nº 3.048/99, no seu art. 16, § 6º, com a redação vigente à época, considera união estável "aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em comum, enquanto não se separarem.".
23 - Já a Lei nº 9.278/96, que regulamenta o art. 226, § 3º da Constituição Federal, dispõe que: "É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família". Saliente-se que referido conceito consta da atual redação do §6º do art. 16 do RPS e no art. 1.723 do CC.
24 - De acordo com a narrativa delineada na petição inicial, a coautora Marinalva mantinha união estável com o recluso na data do recolhimento prisional.
25 - Para a comprovação do alegado, foram coligidos aos autos documentos, os quais, à exceção do contrato particular de convivência celebrado após o recolhimento prisional, constituem início razoável de prova material e foram devidamente corroborados por idônea e segura prova coletada em audiência realizada em 15/08/2016, na qual foi ouvida uma testemunha.
26 - Os relatos são convincentes no sentido de que a Sra. Marinalva e o Sr. (...) conviviam como marido e mulher, em união pública e duradoura, com o intuito de formarem família à época do encarceramento, não havendo nos autos quaisquer outros elementos que indiquem a inexistência da união estável.
27 - Possível concluir, pela dilação probatória e demais documentos juntados, mormente pela prova oral, com fundamento nas máximas de experiência, conforme disciplina o artigo 375, do Código de Processo Civil, que a coautora Marinalva era companheira do segurado recluso.
28 - Diante disso, havendo nos autos elementos de convicção que comprovam a união estável e duradoura entre a demandante e o recluso, a dependência econômica é presumida, nos termos do art. 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91, e só cederia mediante a produção de robusta prova em contrário, o que não se observa no caso.
29 - Realizado estudo social, a autora informou fazer visitas periódicas ao recluso, levando consigo o coautor (...).
30 - No tocante ao requisito da baixa renda, da análise dos autos, verifica-se que o recolhimento à prisão do segurado se deu em 24/11/2014 e o último vínculo empregatício se iniciou em 05/01/2012, sem data de saída, mas com última remuneração em 09/2014, conforme extrato do CNIS já mencionado.
31 - Infere-se, do mesmo banco de dados, que o segurado recebeu remunerações superiores a R$1.000,00 nas competências 03/2012 a 08/2014, de modo que, a despeito de inexistir anotação do término do vínculo empregatício, tem-se que este ocorreu na competência 09/2014, em razão do ordenado auferido, na ordem de R$252,26, correspondente, portanto, a eventual resíduo.
32 - Assim, estando desempregado quando da reclusão, tem-se a ausência de renda, se aplicando o entendimento consagrado pelo C. STJ, no julgamento do Resp nº 1.485.417/MS, representativo de controvérsia, mantido em sede de revisão da tese repetitiva (Tema 896).
33 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do recolhimento prisional (24/11/2014), em relação à coautora (...), uma vez que se trata de dependente absolutamente incapaz, contra a qual não corre prescrição, nos termos do art. 198, I, do Código Civil. Quanto à coautora (...) deve ser fixado na data do requerimento administrativo (24/02/2015), eis que formulado fora do prazo legal (art. 74, I, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97). Por fim, para o coautor (...) o benefício é devido desde a data do seu nascimento (08/09/2015), vez que nascido quando o segurado já estava recluso.
34 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
35 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
36 - Mantida a condenação da autarquia no pagamento das custas, eis que, em se tratando de processos tramitados perante a Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, deve ser observado o disposto na
Lei Estadual n.º 3.779, de 11.11.2009, que em seu
artigo 24,
§1º expõe que a isenção do recolhimento da taxa judiciária não se aplica ao INSS.
37 - Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação do INSS parcialmente provida. Correção monetária alterada de ofício.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004331-61.2018.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 24/08/2021, Intimação via sistema DATA: 26/08/2021)