JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. RECURSO INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM COBRANÇA. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL DE PIRES DO RIO. CIRURGIÃ-DENTISTA.
LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N° 4/1991. PROGRESSÃO FUNCIONAL HORIZONTAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. INTERSTÍCIO DE 2 (DOIS) ANOS. DIREITO AO RECEBIMENTO DAS DIFERENÇAS SALARIAIS. INAPLICABILIDADE DOS LIMITES ORÇAMENTÁRIOS PREVISTOS NA
LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL.
TEMA 1075 DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Admissibilidade. A publicação da sentença se dera no dia 18/08/2022 (evento 19). A parte requerida interpusera recurso inominado tempestivamente
...« (+1868 PALAVRAS) »
...no dia 29/08/2022 (evento 20). Dispensado o preparo, por expressa isenção legal. Contrarrazões apresentadas no evento 24. Recurso conhecido. 2. Exordial. (...) ajuizara ação em desfavor do Município de Pires do Rio. Aduzira a parte autora, servidora pública municipal, que, não obstante ter sido admitida em 30/06/2000 para exercer o cargo de ?Cirurgiã Dentista? e ter preenchido todos os requisitos elencados no artigo 101 da Lei Complementar nº 04/91, não obtivera a progressão funcional. Afirmara que deveria estar posicionada na Letra F, mas encontra-se na Letra C, motivo pelo qual ingressara com a presente demanda requerendo o correto enquadramento, bem como o recebimento das diferenças remuneratórias decorrentes da progressão que entende fazer jus. 3. Contestação ? evento 10. O ente público municipal alegara: a) falta de interesse de agir, por ausência de exaurimento da via administrativa; b) para a progressão horizontal, necessário se faz o preenchimento do requisito temporal de cinco anos de efetivo exercício no cargo, bem como aprovação na avaliação de desempenho, requisitos estes não preenchidos pela parte requerente; c) impossibilidade de acolhimento do pedido inicial, em razão da limitação dos gastos públicos a fim de dar cumprimento ao estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. 4. Impugnação à contestação ? evento 13. A parte autora argumentara ser desnecessário o exaurimento da via administrativa, mormente pela desarrazoada demora do andamento do processo. No mais, repisara os argumentos da inicial. 5. Sentença ? evento 16. O juízo singular entendera que, embora não tenha havido processo administrativo aviado pela parte autora, pela observância dos princípios da economia processual e inafastabilidade da jurisdição, bem como considerando a apresentação de contestação ao pleito inicial, não ha que se falar em carência de ação, por falta de interesse de agir. No mérito, entendera que a parte autora preenchera o requisito temporal estatuído pela Lei Complementar nº 04/91, motivo pelo qual julgara procedente o pedido inicial, da seguinte forma: Ex positis, julgo procedente o petitum contido na peça inaugural, para: a) condenar o requerido em obrigação de fazer, consistente em adotar as medidas corretivas para o reposicionamento adequado da autora na carreira (para a Referência ?F?), vez que preenchidos os requisitos previstos no artigo 101 da Lei Complementar nº 04/91; b) condenar o requerido ao pagamento de forma retroativa dos reflexos patrimoniais decorrentes da referida progressão, desde agosto de 2004, observada a prescrição quinquenal, mediante simples cálculos matemáticos; Sobre as verbas em atraso deverão incidir juros moratórios, devidos a partir da citação, com base nos índices oficiais aplicados à caderneta de poupança, nos termos do artigo 1º-F da Lei federal nº 9.494/1997, com a nova redação dada pela Lei federal nº 11.960/2009; bem assim correção monetária, que deverá incidir uma única vez, desde quando as diferenças deveriam ter sido pagas, pelo IPCA-E (nos termos do julgamento do Recurso Extraordinário 870947, de 20/09/2017). 6. Recurso Inominado ? evento 20. Irresignado, o ente público municipal interpusera recurso inominado repisando todas as suas teses da contestação, requerendo, ao final, o provimento do recurso para julgar improcedentes os pedidos exordiais. 7. Contrarrazões ? evento 24. Já a parte autora limitara-se a pleitear a manutenção da sentença. 8. Fundamentos do reexame. 8.1. Da prescindibilidade de requerimento administrativo. Conforme cediço, a ausência de apresentação prévia de requerimento administrativo não obsta a propositura de demanda judicial, por inexistir previsão legal nesse sentido, bem como pelo fato de a Magna Carta garantir a todo cidadão a proteção contra toda e qualquer lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV). Fora firmada a necessidade de prévio requerimento apenas na hipótese do RE nº 631.240, de repercussão geral. Contudo, a tese se restringe aos casos em que é pleiteada a concessão de benefício previdenciário e, no caso em comento, não se debatem valores de contribuição previdenciária indevidamente descontada em folha de pagamento de inativos, mas, sim, o direito ao reenquadramento funcional e recebimento das diferenças decorrentes. Desta feita, dispensável o prévio requerimento e o esgotamento da via administrativa para configurar o interesse processual. Precedente: TJGO, 1ª Turma Recursal, RI nº 5549630-97, Rel. Dr. Wild Afonso Ogawa, julgado dia 11/08/2022, publicado dia 15/08/2022. Preliminar rechaçada. 8.2. Do direito à progressão horizontal. 8.2.1. A Lei Complementar Municipal nº 4/1991, que instituíra o Regime Jurídico dos Servidores (...) do Rio e dá outras providências, assegurara a progressão funcional horizontal, do seguinte modo: Art. 101 - Progressão horizontal é a variação remuneratória correspondente à passagem do servidor de uma para outra referência, dentro da mesma classe, obedecidos os critérios de antiguidade e merecimento. § 1º - Pelo critério de antiguidade o servidor passará de uma para outra referência a cada 02 (dois) anos de efetivo exercício na classe, independente de qualquer outra avaliação. § 2º - A progressão horizontal por merecimento será concedida por ato do Chefe do Poder ao qual o servidor servir. § 3º - O merecimento do servidor será apurado conforme critérios estabelecidos nesta lei. § 4º ? A progressão por merecimento poderá ser efetivada a cada seis meses, reabrindo-se o prazo para a progressão seguinte. § 5º - A antiguidade será determinada pelo tempo líquido de exercício do servidor na classe a que pertencer. § 6º - A antiguidade na classe será contada a partir da data de exercício do servidor, observado o disposto nos §§ 1º e 3º do Art. 23 e no 25 desta lei. § 7º - Para a apuração da antiguidade, computar-se-ão também o tempo de serviço prestado em outro cargo público deste Município, desde que entre um e outro não haja interrupção do exercício por prazo superior a trinta dias.? 8.2.2. Nos idos de 2004, a Lei Ordinária Municipal n° 2.835/04, que regulamenta o Plano de Cargos e Remuneração (PCR), alterara, por meio do art. 12, inciso XVIII, o direito à progressão, sob a condição de efetivo exercício de cargo a cada 5 (cinco) anos. Contudo, a Lei Orgânica do Município de Pires do Rio estabelecera, expressamente no artigo 95, inciso VI, que o Regime Jurídico dos Servidores Municipais deve ser veiculado por lei complementar e não por lei ordinária. Senão vejamos: Art. 95 - São objetos de lei complementar as seguintes matérias, dentre outras estabelecidas nesta lei: I - o Plano Diretor; II - o Código Tributário Municipal; III - o Código de Obras e Edificações; IV - o Código de Posturas; V - o Código de Parcelamento e uso do Solo; VI - o Regime Jurídico dos Servidores Municipais; 8.2.3. Dessa forma, considerando que a Lei nº 001/1991 é complementar e que a Lei nº 2.835/2004, que aumentara o prazo é ordinária, devem as disposições constantes na Lei Complementar prevalecerem sobre as contidas na Lei Ordinária. Assim, ao contrário do alegado pelo recorrente, a disposição da Lei Municipal nº 2.835/04, que condiciona o direito à progressão ao efetivo exercício no cargo por cinco anos e avaliação de desempenho, não deve ser aplicada na presente demanda. No mesmo sentido: EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM COBRANÇA. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL DE PIRES DO RIO. TÉCNICO EM ILUMINAÇÃO. LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N° 4/1991. PROGRESSÃO FUNCIONAL HORIZONTAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. INTERSTÍCIO DE 2 (DOIS) ANOS. CONCESSÃO. AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO RESULTADO FAVORÁVEL. TERMO A QUO PARA O PAGAMENTO VINDICADO. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DIREITO AO RECEBIMENTO DAS DIFERENÇAS SALARIAIS DESDE A DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DOS LIMITES ORÇAMENTÁRIOS PREVISTOS NA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. DIREITO SUBJETIVO INTANGÍVEL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO INOMINADO NÃO PROVIDO. (TJGO, Recurso Inominado Cível 5349126-70.2022.8.09.0127, Rel. Dr. Oscar de Oliveira Sá Neto, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 28/09/2022, DJe de 28/09/2022). EMENTA: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE COBRANÇA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. PROMOÇÃO. PROGRESSÃO HORIZONTAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS (ART. 101 DA LEI COMPLEMENTAR Nº. 004/1991). REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES. MATÉRIA RESERVADA À LEI COMPLEMENTAR. PAGAMENTO RETROATIVO. SENTENÇA MANTIDA. (TJGO, Recurso Inominado Cível 5381136-70.2022.8.09.0127, Rel. Dioran Jacobina Rodrigues, 4ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 06/10/2022, DJe de 06/10/2022). 8.2.4. No caso em apreço, a parte autora fora admitida em 30/06/2000, conforme se extrai da ficha financeira em evento 01, arquivo 06. Não há nos autos nenhum elemento de prova que afaste a alegação da autora de ter exercício sua função de forma ininterrupta. Cabe lembrar que os documentos da vida funcional do servidor público, como por exemplo, folhas de ponto ou fichas funcionais, constam do banco de dados do ente federado, cabendo, portanto, ao recorrente o ônus de provar quaisquer fatos impeditivos, extintivos ou modificativos do direito da parte recorrida, na dicção do artigo 373, inciso II do CPC. Percebe-se que a parte recorrente nada juntara, devendo, agora, assumir o ônus de sua desídia. Conclui-se que razão assiste à parte autora, pois deveria estar posicionada na Letra F desde 30/06/2012, mas, em razão da prescrição quinquenal, cediço que a obrigação do requerido ao pagamento de forma retroativa dos reflexos patrimoniais decorrentes da referida progressão, deve-se ater aos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação (22/06/2017). 8.2.5. Por fim, acerca da impossibilidade de implementação do direito requerido face aos decretos limitadores de despesas editados com o escopo de dar cumprimento aos limites fixados pela Lei de Responsabilidade Fiscal, melhor sorte não assiste ao recorrente. A matéria aventada já fora objeto de apreciação em sede de recurso repetitivo pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1878849/TO, em que se debatia a legalidade do ato de não concessão de progressão funcional do servidor público, quando atendidos todos os requisitos legais, sob o argumento de que foram superados os limites orçamentários previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, referentes a gastos com pessoal de ente público (Tema 1075). Do julgamento, restara fixada a seguinte tese: É ilegal o ato de não concessão de progressão funcional de servidor público, quando atendidos todos os requisitos legais, a despeito de superados os limites orçamentários previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, referentes a gastos com pessoal de ente público, tendo em vista que a progressão é direito subjetivo do servidor público, decorrente de determinação legal, estando compreendida na exceção prevista no inciso I do parágrafo único do art. 22 da Lei Complementar 101/2000. 8.2.6. Dessa maneira, incabível a tese de que a LRF possa vedar a exceção prevista em seu próprio dispositivo legal (art. 22, I da LRF: determinação legal de pagamento de vencimentos). Além disso, já há muito sedimentado também pelo Superior Tribunal de Justiça que não é possível a invocação dos gastos com pessoal como justificativa para o não cumprimento de direitos subjetivos do servidor público: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO. NOMEAÇÃO. LIMITE DE GASTOS COM PESSOAL. LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. DECISÃO JUDICIAL. EXCEÇÃO. COMPROVAÇÃO DE VIOLAÇÃO DA LRF. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. A jurisprudência do superior tribunal de justiça se firmou no sentido de que os limites orçamentários previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, no que se refere às despesas com pessoal do ente público, não podem servir de fundamento para o não cumprimento de direitos subjetivos do servidor, sobretudo na hipótese de despesas provenientes de decisão judicial. 2. Não há no acórdão combatido informações a respeito da comprovação pelo recorrente da impossibilidade de nomeação da parte agravada em virtude de violação da LRF. dessa forma, para se aferir tal questão, seria imprescindível o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que é defeso na via eleita, em razão do óbice da
súmula 7/STJ. 3. Agravo Interno a que se nega provimento. (AgInt no AResp 1186584/DF, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 12/06/2018, DJE 18/06/2018). 8.2.7. Por todo o exposto, mantém-se incólume a sentença proferida. 9. Dispositivo. Recurso conhecido e desprovido. Condenada a parte recorrente ao pagamento de honorários advocatícios, sendo estes fixados em 15% sobre o valor da condenação.
(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Recurso Inominado Cível 5365972-65.2022.8.09.0127, Rel. WILD AFONSO OGAWA, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 17/10/2022, DJe de 17/10/2022)