Trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade com pedido de liminar ajuizada pela Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social - ANMP, em face do
art. 3° da
Medida Provisória 849, de 31 de agosto de 2018, que posterga e cancela
aumentos remuneratórios de pessoal civil da administração pública federal para os exercícios subsequentes.
A requerente argumenta que o dispositivo impugnado, que adia os reajustes remuneratórios concedidos por lei aos integrantes das Carreiras de Perito Médico Previdenciário e de Supervisor Médico-Pericial, [...] está eivado de nítida
inconstitucionalidade, já reconhecida expressamente em decisão proferida pelo Ministro RICARDO LEWANDOWSKI
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...na ADI n. 5.809/DF (pág. 6 da inicial).
Aduz, então, que, ao editar norma com conteúdo idêntico ao da MP n. 805/17, o Chefe do Poder Executivo não só replica as mesmas inconstitucionalidades, como acrescenta lesões ainda mais graves ao Estado Democrático de Direito brasileiro (pág. 9 da
inicial).
Sustenta, ademais, a ocorrência de violação das garantias constitucionais dos servidores ao direito adquirido (art. 5º, XXXVI) e à irredutibilidade de vencimentos (art. 37, XV), haja vista que,
[c]om a edição da MP n. 765/16 e com sua posterior conversão na Lei n. 13.464/17, os reajustes remuneratórios concedidos aos integrantes das Carreiras representadas pela ANMP foram incorporados aos seus respectivos patrimônios jurídicos nos exatos
termos consignados nesses atos normativos e passaram a ser alvo da proteção constitucional conferida ao direito adquirido.
Na medida em que o art. 3º da MP n. 849/18 posterga os momentos de implementação do aumento dos vencimentos previstos em normas anteriores, contraria expressamente o dispositivo constitucional que garante a imutabilidade das situações jurídicas
consolidadas.
Há de considerar também na hipótese vertente o direito constitucional à irredutibilidade vencimental (art. 37, XV) (págs. 10-11 da inicial).
Na sequência, a requerente assevera que se faz necessária a concessão de medida liminar, haja vista que o ato combatido suspenderá a implementação financeira da parcela do reajuste prevista para o mês de janeiro de 2019.
Os autos foram a mim distribuídos livremente em 5/9/2018 (documento eletrônico 15). No mesmo dia, determinei que o Presidente do Congresso Nacional fosse oficiado para manifestação sobre a incidência, na espécie, da vedação constante do art. 62, §
10, da Constituição Federal (documento eletrônico 16).
O Ofício 17167/2018-STF foi recebido naquela Casa em 18/9/2018 (documento eletrônico 19).
Todavia, a Secretaria certificou nestes autos que não havia registro da manifestação do Presidente do Congresso Nacional (documento eletrônico 20).
Dada a relevância da opinião, em 30/10/2018, reiterei a solicitação da manifestação do Parlamento. No mesmo ato, e sem prejuízo da oportunidade da manifestação do Presidente do Congresso Nacional, nos termos do art. 10 da Lei 9.868/1999, determinei
a oitiva do Presidente da República, da Advogada-Geral da União e da Procuradora-Geral da República, no prazo de 3 dias (documento eletrônico 24).
Em 8/11/2018, o Presidente do Congresso Nacional trouxe aos autos o OFÍCIO Nº 51/2018-PRESID/ADVOSF, por meio do qual informou que, [...] de acordo com a análise da Advocacia do Senado Federal, o conteúdo da Medida Provisória n° 805/2017 guarda
similaridade com a Medida Provisória 849/2018, atraindo a incidência da vedação do art. 62, § 10, da Constituição Federal [...] (pág. 1 do documento eletrônico 36).
Em 19/11/2018, o Presidente da República juntou informações, confeccionadas pela Advocacia-Geral da União, nos termos do art. 4°, V, da Lei Complementar 73/1993, nas quais foi afirmada a ilegitimidade ativa ad causam da entidade de classe autora, a
improcedência da alegação de desrespeito à decisão monocrática proferida na ADI 5.809/DF, a constitucionalidade do ato normativo atacado e a ausência dos requisitos necessários à concessão da medida liminar.
A Advocacia-Geral da União opinou pelo não conhecimento da ação direita e, no mérito, pela indeferimento da cautelar. A manifestação foi assim ementada:
Servidor público. Regime remuneratório. Artigo 3° da Medida Provisória n° 849/2018, que posterga e cancela aumentos remuneratórios de pessoal civil da administração pública federal para exercícios subsequentes. Preliminar. Ilegitimidade ativa da
requerente. Mérito. Ausência de afronta à autoridade da decisão monocrática proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5809. Inexistência de fumus boni iuris. Medida provisória que atinge efeitos financeiros futuros não pode ser equiparada,
para fins da limitação do artigo 62, § 1°, inciso II, da Constituição, a intervenções destinadas a bloquear recursos sob disponibilidade dos seus titulares. Compatibilidade com os artigos 2°; 5°, inciso XXXVI; e 37, inciso XV da Constituição de 1988.
Enquanto pendente o implemento de condição e termo, o direito à remuneração pela prestação de serviço público não pode ser considerado adquirido, pois não se verifica acréscimo de disponibilidade econômica ou jurídica à situação patrimonial do servidor.
Não há direito adquirido a determinado regime legal de cálculo ou reajuste de vencimentos ou vantagens funcionais. Ausência do periculum in mora. Precedentes desse Supremo Tribunal Federal. Manifestação pelo não conhecimento da ação direta e, no mérito,
pelo indeferimento da cautelar (pág. 1 do documento eletrônico 41).
Em 27/11/2018, a Procuradoria-Geral da República manifestou-se pelo deferimento da medida, em parecer assim ementado:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEGITIMIDADE ATIVA EXCEPCIONAL DE FRAÇÃO DE CATEGORIA FUNCIONAL. NORMA QUE ATINGE DIVERSAS CATEGORIAS FUNCIONAIS. IDÊNTICA INCONSTITUCIONALIDADE PARA TODOS OS SEUS DESTINATÁRIOS. CONHECIMENTO AMPLO DA AÇÃO.
MEDIDA PROVISÓRIA 849/2018. REEDIÇÃO, NA MESMA SESSÃO LEGISLATIVA, DE MEDIDA PROVISÓRIA QUE PERDEU EFICÁCIA POR DECURSO DE PRAZO. INCIDÊNCIA DO ART. 62-§10 DA CONSTITUIÇÃO. POSTERGAÇÃO DOS EFEITOS FINANCEIROS DE REAJUSTES CONCEDIDOS A SERVIDORES DO
PODER EXECUTIVO FEDERAL. AFRONTA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO ADQUIRIDO E DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS.1. Fração de categoria funcional tem legitimidade para impugnar, em ação direta de inconstitucionalidade, norma cujos efeitos repercutam apenas na parcela da categoria por ela representada. Precedente: ADI 4.462-MC, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJ
14.11.2011.2. A ação direta ajuizada contra dispositivo de lei cuja inconstitucionalidade apontada seja idêntica para os demais destinatários da norma deve ser conhecida de forma ampla (ADI 4.203/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 2.2.2015). O pedido, embora
limitado à categoria representada pela entidade requerente, deve ser estendido para abranger as demais categorias de servidores atingidas pelos efeitos da Medida Provisória 849/2018.3. Não cabe ao Presidente da República reeditar o conteúdo de medida provisória que perdeu eficácia por decurso de prazo na mesma sessão legislativa, sob pena de perpetuação de seus efeitos jurídicos e consequente afronta ao art. 62-§10 da
Constituição.4. A vigência de leis concessivas de reajustes a servidores públicos não se confunde com seus efeitos financeiros. A aquisição do direito aos reajustes na forma disciplinada pelos diplomas concessivos não fica afastada pela circunstância de seus
efeitos financeiros ainda não terem sido implementados. Existência de direito adquirido e não de mera expectativa de direito. Precedentes: ADIs 4.013 e 5.809-MC.5. A postergação dos efeitos financeiros de reajustes remuneratórios para exercícios subsequentes subtrai dos servidores beneficiados a disponibilidade financeira desses recursos no período em que adiada a sua implementação e, dessa forma, ocasiona
decesso vencimental vedado pelo art. 37-XV da Constituição.
Parecer pelo conhecimento amplo da ação e pela procedência extensiva da medida cautelar para suspender a eficácia da integralidade da Medida Provisória 849/2018 (pág. 1 do documento eletrônico 43).
Por dependência à presente ação, me foram distribuídas as ADIs 6.008 e 6.009/DF, que impugnam toda a Medida Provisória 849/2018.
A ADI 6.008/DF, ajuizada pela Confederação dos Servidores Públicos do Brasil - CSPB, aponta o desrespeito à decisão por mim proferida nos autos da ADI 5.809/DF, na qual suspendi a MP 805/2017.
Nessa direção, sustenta a ocorrência de violação do direito adquirido e do princípio da irredutibilidade de vencimentos, constantes dos arts. 5°, XXXVI e 37, XV, da Constituição Federal.
Além do mais, indica que o ato normativo combatido contraria o disposto no art. 62, § 1°, II, da CF, o qual veda a edição de medida provisória que vise a detenção de ativos financeiros.
Requer, então, seja concedida a medida cautelar, por considerar que
[o] perigo na demora, por sua vez, decorre da aplicação ampla e irrestrita dos inconstitucionais preceitos normativos trazidos pela MP n. 849/18, já no início do próximo ano (suspensão dos aumentos remuneratórios em janeiro de 2019).
A Administração Pública, a pretexto de adotar medidas de ajuste fiscal, imputa o ônus integral da recuperação econômica do país aos servidores públicos mediante a apropriação indevida de parcela significativa de seus rendimentos (tópico III.d).
[
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As consequências práticas da entrada em vigor da MP n. 849/18 são extremamente lesivas aos servidores públicos ora representados, visto que operam grave decesso em seus vencimentos (pág. 20 da inicial da ADI 6.008/DF).
Por sua vez, a ADI 6.009/DF, com pedido de cautelar, foi ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade - PSOL para declarar a inconstitucionalidade da integralidade da MP 849/2018.
Em síntese, o partido requerente aduz que o texto impugnado afronta,
[...] simultaneamente: i) os pressupostos exigidos pela Constituição para a edição de medidas provisórias (art. 62, caput, da CR); e ii) o inc. XXXVI do art. 5º, assim como o inc. XV do art. 37, ambos da CR, conforme será adiante explicitado. E,
porque afrontam decisão transitada em julgado e anteriormente adotada em medida cautelar deferida por esta C. STF pelo Ministro Ricardo Lewandowski na ADI 5.809, ofendem os princípios da coisa julgada material, da imperatividade das decisões judiciais,
da segurança jurídica e da harmonia entre os poderes (pág. 2 da inicial da ADI 6.009/DF).
Vai além, argumentando que a MP 849/2018 não cumpre o requisito constitucional da urgência, uma vez que
[...] é cristalina a ausência de urgência; não há imprevisibilidade ou contingência que reclame a edição de medida provisória. Não há, da mesma maneira, perigo na demora da adoção do ato legislativo.
Os efeitos das postergações e cancelamentos dos aumentos remuneratórios para os exercícios subsequentes das vinte e cinco categorias de servidores públicos afetadas pela Medida Provisória ora atacada não tem efeitos imediatos, mas somente para o
início do próximo ano. Frente a esse fato, fica claro que esse tema poderia ter sido regulamentado por Projeto de Lei (talvez até em regime de urgência constitucional, nos termos do art. 64, §1º, da CF) (pág. 12 da inicial da ADI 6.009/DF).
Além disso, destaca que, ante o disposto no art. 62, § 10, da CF, o ato normativo impugnado não poderia ter sido editado pelo Presidente da República na mesma sessão legislativa na qual a MP 805/2017 perdeu a sua vigência, [...] eis que
restabeleceria a eficácia da anterior, que não desapareceria do ordenamento jurídico (pág. 15 da inicial da ADI 6.009/DF).
Ao final, requereu, cautelarmente, a suspensão da MP 849/2018.
Constato que as ADIs 6.008 e 6.009/DF já estão completamente instruídas, contando com as informações e as manifestações da Advocacia-Geral da União pelo indeferimento, e da Procuradoria-Geral da República pelo deferimento da medida cautelar -
juntadas aos autos em 30/11/2018 -, nos mesmos termos do parecer já transcrito neste relatório.
Assinalo que também foram distribuídas a mim as ADIs 6.005, 6.010, 6.011, 6.015, 6.016 e 6.026/DF, que impugnam, no todo ou em parte, a Medida Provisória 849/2018. As referidas ações diretas ainda não estão integralmente instruídas.
A ADI 6.005/DF foi ajuizada pela União Nacional dos Auditores e Técnicos Federais de Finanças e Controle - Unacon, em face do art. 8° da MP 849/2018, que posterga os efeitos financeiros de parcela do reajuste concedido às carreiras de gestão
governamental.
Por sua vez, a ADI 6.015/DF, ajuizada pela Associação Nacional dos Servidores Públicos da Previdência e da Seguridade Social, ataca os arts. 3° e 16 do referido ato normativo, os quais postergam os efeitos financeiros de parcela do reajuste
concedido às carreiras de perito-médico previdenciário e de supervisor médico-pericial e às carreiras jurídicas.
A ADI 6.016/DF, proposta pela Associação Nacional dos Servidores Federais em Transporte - SDNER, questiona a constitucionalidade do art. 25 da referida MP, a qual posterga o reajuste das carreiras e do plano especial de cargos do Departamento
Nacional de Infraestrutura de Transportes - DNIT, enquanto que a ADI 6.026/DF, ajuizada pela Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico - Proifes, questiona
as postergações dos reajustes das carreiras de magistério federal, de magistério do ensino básico federal e de magistério do ensino básico dos ex-territórios, previstas nos arts. 26, 31 e 32 da mencionada medida provisória.
Por outro lado, nas ADIs 6.010 e 6.011/DF, ajuizadas pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil - Anfip e pela Confederação Nacional das Carreiras Típicas de Estado - Conacate, todo o texto da MP 849/2018 é
questionado.
Outrossim, deferi o ingresso, como amicus curiae, da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais - Anafe nestes autos. E, ainda, da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal - ADPF, bem como da Associação Nacional dos
Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil - Unafisco Nacional, nos autos da ADI 6.009/DF.
Posteriormente, indeferi os pedidos de ingresso da Federação Nacional dos Delegados da Polícia Federal - Fenadepol e do Sindicato dos Delegados de Polícia Federal - Sindepol nos presentes autos, bem como as solicitações formuladas pela Associação
Nacional dos Delegados de Polícia Federal - ADPF, Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil - Sindifisco Nacional, Sindicato Nacional dos Peritos Criminais Federais - APCF Sindical, Federação Nacional dos Policiais Federais -
FENAPEF, Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil - Unafisco Nacional e Sindicato dos Servidores do IPEA - AFIPEA Sindical, nos autos da ADI 6.009/DF.
Em 3/12/2018, solicitei a inclusão na pauta do Plenário do Supremo Tribunal Federal das medidas cautelares requeridas nas ADIs 6.004, 6.008 e 6.009/DF.
Após, as entidades requerentes das ADIs 6.004 e 6.008/DF - considerando a não inclusão do julgamento no cronograma de julgamento previsto até o dia 19/12/2018 -, requereram, subsidiariamente, a análise monocrática das medidas cautelares, ad
referendum do Plenário do Supremo Tribunal Federal.
É o relatório.
(STF, ADI 6004 MC, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Decisão Monocrática, Julgado em: 19/12/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-019 DIVULG 31/01/2019 PUBLIC 01/02/2019)