DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR. ANÁLISE DOS REQUISITOS LEGAIS. TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS NO ESTADO DE GOIÁS.
LEI ESTADUAL N. 18.673/2014 E DECRETO ESTADUAL N. 8.444/2015. INCONSTITUCIONALIDADES FORMAIS E MATERIAIS. CONCESSÃO PARCIAL DA MEDIDA CAUTELAR. I. CASO EM EXAME 1. Ação direta de inconstitucionalidade com pedido de medida cautelar proposta pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado de Goiás contra dispositivos da Lei Estadual n. 18.673/2014 e do Decreto Estadual n.
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...8.444/2015, que regulam a prestação do serviço público de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros em Goiás. 2. Alegam-se inconstitucionalidades formais, por vício no processo legislativo e por inobservância da competência da União para legislar privativamente e/ou estabelecer normas gerais, e inconstitucionalidades materiais, por violação aos princípios da igualdade, da impessoalidade, da moralidade, da eficiência, da livre iniciativa e da livre concorrência. 3. O Governador do Estado em exercício manifesta-se favorável ao deferimento parcial da medida cautelar. O Presidente da Assembleia Legislativa posiciona-se pelo indeferimento total da cautelar. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 4. As questões em discussão compreendem: (i) a avaliação da probabilidade do direito a partir das inconstitucionalidades formais e materiais alegadas, considerando o exame das repercussões das modificações legislativas realizadas em determinados dispositivos tratados nesta ação; (ii) a deliberação se o mero decurso do tempo desde a publicação da lei e do decreto questionados constitui óbice instransponível à concessão da cautelar; e (iii) o reconhecimento de quais dispositivos legais e regulamentares questionados reúnem todos os requisitos legais (probabilidade do direito, perigo da demora e/ou critério da conveniência) para a finalidade da suspensão cautelar. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. Probabilidade do direito reconhecida: 5.1. Em relação ao inciso I do art. 6º; inciso III do §1º do art. 10; caput e §§1º, 2º e 3º do art. 13; caput do art. 14; caput do art. 15; parágrafo único do art. 18; parágrafo único do art. 19; inciso II do §1º do art. 21; inciso IV do art. 31; incisos II e IV do art. 48; art. 56 e art. 59, todos da Lei Estadual n. 18.673/2014, em razão da manifesta inconstitucionalidade formal por vício no processo legislativo, caracterizado pela realização de escrutínio secreto na sessão de apreciação de veto. 5.2. Em relação ao caput do art. 19 da Lei Estadual n. 18.673/2014, ao estabelecer que a concessão ?terá caráter de exclusividade?, e aos correspondentes arts. 8º e 10 do Decreto Estadual n. 8.444/2015, nos trechos em que estabelecem, respectivamente, que a concessão será efetuada "em caráter de exclusividade" e "sob o regime de exclusividade", em razão da aparente inconstitucionalidade formal por afronta à norma geral estabelecida pela União em sua competência privativa. 5.3. Em relação ao caput e §§ 1º, 2º, 4º e 5º, do art. 22; incisos I e III do art. 23; e inciso XII do art. 48 da Lei Estadual n. 18.673/2014, e incisos V e VI do § 1º do art. 6º, e caput e §§ 4º, 5º e 6º do art. 11 do Decreto Estadual n. 8.444/2015, porquanto a manutenção da possibilidade de transferência de outorgas representa, a princípio, uma incompatibilidade com os princípios constitucionais que regem o tipo de serviço público analisado e a forma de delegação aplicada. ADI 5.549/DF. 6. Probabilidade do direito não reconhecida: 6.1. Em relação ao art. 24-G da Lei Estadual n. 13.569/1999, que tinha redação dada pelo inciso IV do art. 31 da Lei Estadual n. 18.673/2014, e foi revogado; ao inciso II do §2º do art. 24 da Lei Estadual n. 13.569/1999, que tinha redação dada pelo inciso IV do art. 31 da Lei Estadual n. 18.673/2014, e foi modificado; e à alínea ?f? do inciso II do art. 11 da Lei Estadual n. 18.673/2014, e foi modificada, não há se falar em probabilidade do direito para suspender, nessa parte, o inciso IV do art. 31 da Lei Estadual n. 18.673/2014. 6.2. Em relação ao § 2º do art. 11 da Lei Estadual n. 18.673/2014, considerando que a inconstitucionalidade alegada não ressai evidente do exame da norma impugnada, além de a disposição legal encontrar justificativa constitucionalmente adequada, qual seja a garantia da continuidade do serviço público em trechos que não são economicamente interessantes. 6.3. Em relação ao caput do art. 18 da Lei Estadual n. 18.673/2014 e ao art. 7º do Decreto Estadual n. 8.444/2015, considerando que não impõem a exclusividade na exploração do serviço, mas a compreendem como exceção, dentro dos limites da norma geral, a Lei Federal n. 8.987/1995. 6.4. Em relação aos §§ 3º e 4º do art. 21 da Lei Estadual n. 18.673/2014, considerando que não há manifesta incompatibilidade com as normas constitucionais, pois versam sobre contratos de concessão, para os quais o equilíbrio econômico-financeiro é reconhecido como princípio constitucional pelo STF e previsto na Lei Federal n. 8.987/1995, segundo o STJ. 6.5. Em relação ao inciso II do caput, ao inciso IV do § 3º, e aos §§ 6º, 7º, 9º, 10 e 11, do art. 44 da Lei Estadual n. 18.673/2014, considerando que a regulamentação estabelecida trata de serviço público de competência do Estado de Goiás e do poder de polícia necessário a garantir sua boa prestação, sem evidenciar afronta à competência da União para legislar sobre trânsito e transporte. 7. O tardio ajuizamento da ação direta configura, em regra, causa obstativa da concessão de medida cautelar, entretanto, aplicado o critério da conveniência, a concessão mostra-se possível. 8. No caso em análise, o tempo de vigor das normas impugnadas, em vez de descaracterizar a urgência, é capaz de ressaltar a necessidade da medida, porquanto cumpre fazer cessar as lesões ao interesse público e mitigar danos à boa prestação do serviço público que atingem aqueles que dependem do transporte intermunicipal. 9. Perigo da demora reconhecido: 9.1. Em relação ao inciso III do § 1º do art. 10; ao caput do art. 14; ao caput do art. 15; e ao parágrafo único do art. 18, da Lei Estadual n. 18.673/2014, pois, além dos vícios formais, estabelecem disposições contrárias ao modelo de delegação, comprometendo a eficiência da prestação do serviço público e limitando a atuação da agência reguladora em descompasso com os paradigmas constitucionais e as normas gerais editadas pela União. 9.2. Em relação ao caput e §§ 1º, 2º, 4º e 5º, do art. 22; incisos I e III do art. 23; e inciso XII do art. 48, todos da Lei Estadual n. 18.673/2014; e os incisos V e VI do § 1º do art. 6º, e caput e §§ 4º, 5º e 6º do art. 11 do Decreto Estadual n. 8.444/2015, porque disciplinam a transferência de outorgas, medida que se mostra incompatível com o decidido na ADI 5.549/DF e, caso subsistente, possibilitará a continuidade da prática tida por inconstitucional e o envolvimento de cada vez mais agentes. 10. Perigo da demora não reconhecido: 10.1. Em relação ao inciso I do art. 6º da Estadual n. 18.673/2014, porque consiste em norma destinada à segurança do transporte de passageiros e sua retirada do ordenamento pode caracterizar perigo inverso. 10.2. Em relação ao caput e ao parágrafo único do art. 19 e ao inciso II do §1º do art. 21 da Lei Estadual n. 18.673/2014, assim como aos arts. 8º e 10 do Decreto Estadual n. 8.444/2015, porque tratam da hipótese de contratos de concessão, marcados por parâmetros constitucionais e legais próprios a serem considerados de forma pormenorizada, sob pena de resultar em dano superior ao que se busca evitar. 10.3. Em relação ao inciso IV do art. 31 da Lei Estadual n. 18.673/2014, que alterou dispositivos da Lei Estadual n. 13.569/1999, dispondo sobre a Taxa de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos ? TRFC, porque faltam elementos para se reconhecer a urgência. 10.4. Em relação aos incisos II e IV do art. 48 da Lei Estadual n. 18.673/2014, pois preveem hipóteses de aplicação da penalidade da caducidade, sem nenhuma urgência particular demonstrada. 10.5. Em relação ao art. 56 da Lei Estadual n. 18.673/2014, que alterou a Lei Estadual n. 13.569/1999, dispondo sobre organização e competências da AGR, pois sua suspensão não somente carece de urgência, como poderia gerar prejuízos relevantes ao afetar o funcionamento da agência. 10.6. Em relação ao art. 59 da Lei Estadual n. 18.673/2014, que revogou a Lei Estadual n. 14.480/2003 (sobre fiscalização do transporte intermunicipal clandestino de passageiros), a suspensão de sua eficácia poderia gerar efeito repristinatório, com produção de consequências imprevisíveis e risco de dano maior que a manutenção da norma impugnada até o julgamento definitivo. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Medida cautelar parcialmente concedida para suspender os efeitos do inciso III do § 1º do art. 10; do caput do art. 14; do caput do art. 15; do parágrafo único do art. 18; do caput e §§ 1º, 2º, 4º e 5º, do art. 22; dos incisos I e III do art. 23; do inciso XII do art. 48, todos da Lei Estadual n. 18.673/2014; e dos incisos V e VI do § 1º do art. 6º; do caput e §§ 4º, 5º e 6º do art. 11 do Decreto Estadual n. 8.444/2015. Tese de julgamento: ?Presentes os requisitos da probabilidade do direito e do perigo da demora, considerando o critério da conveniência, a medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade deve ser concedida para suspender os efeitos das normas apontadas como inconstitucionais?. Dispositivos relevantes citados: Constituição Federal: art. 2º; art. 5º, caput; art. 22, incisos XI e XXVII; art. 37, caput e inciso XXI; art. 66, §4º; art. 170, caput; art. 173, caput e §4º; art. 175, caput. Constituição do Estado de Goiás: arts. 2º, caput e §2º; 5º, inciso V; 20, §1º, inciso II, alínea ?e?; 92, caput e inciso XXI; 149. Lei Federal n. 8.987/1995: arts. 5º, 16, 35 a 37. Lei Federal n. 14.133/2021: arts. 21, §4º; 131, caput e parágrafo único. Lei Federal n. 9.503/1997 (CTB): arts. 270, caput e §1º, §2º; 320; 328, caput, §6º e §12. Lei Federal n. 9.868/1999:
art. 10, caput. Jurisprudência relevante citada: STF, ADI 5549, Rel. Min. Luiz Fux, j. 29/03/2023, DJe 01/06/2023. TJGO, 5185869-10.2016.8.09.0051, Rel. Des. Eduardo Abdon Moura, 3ª Câmara Cível, j. 07/03/2024. STF, ADI-MC 1.087-5-RJ, Rel. Min. Moreira Alves, DJU 07/04/1995. TJGO, ADI n. 201700525254, Rel. Des. Leobino Valente Chaves, j. 11/10/2017.
(TJ-GO, 5147599-55.2025.8.09.0000, Relator(a): , , Publicado em: 01/11/2025)