PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILHA MAIOR INVÁLIDA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS.
1. Ação ajuizada com o escopo de obter a parte autora provimento jurisdicional que condene o INSS a lhe conceder pensão por morte em razão do falecimento de seu genitor ocorrido em 05/10/2017.
2. Sentença de procedência do pedido para condenar o INSS a conceder à autora o benefício de pensão por morte, com DIB em 05/10/2017 e valores atrasados atualizados conforme a Resolução CJF nº 267/13.
3. Recurso do INSS: alega, em síntese, que a incapacidade foi reconhecida após a autora alcançar a maioridade e que a recorrida é titular de benefício de aposentadoria por invalidez,
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...de modo que não há dependência econômica.4. Constou da sentença:
"(...) Postula a parte autora a concessão do benefício de pensão por morte, na condição de filha maior inválida do segurado ANTÔNIO AFONSO DE OLIVEIRA, falecido em 05/10/2017.
Inicialmente, verifica-se que o genitor da autora ostentava a qualidade de segurado na data de seu óbito (05/10/2017), visto que era beneficiário de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 067.725.124-6) desde 21/07/1995 (anexo n. 25).
Assim, resta averiguar se a autora possuía a qualidade de dependente, nos termos do art. 16 da Lei n. 8.213/1991.
Conforme se extrai dos autos, a autora encontrava-se inválida na data do óbito de seu genitor (05/10/2017), tendo em vista o recebimento de aposentadoria por invalidez desde 01/03/1998.
Isso posto, é necessário pontuar que a alegação da ré de que apenas o filho que ficou inválido antes de completar 21 anos - e , portanto, nunca deixou de ser dependente - teria direito a receber pensão por morte, não merece prosperar.
Com efeito, o art. 108 do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/1999), desborda dos limites da legalidade e impõe restrição não prevista na Lei de Benefícios.
Como consabido, não pode a Administração, no exercício do Poder Regulamentar, inovar no ordenamento jurídico para criar restrições ou sanções não previstas em Lei (em sentido estrito).
Logo, ilegítimo e ilegal o cerceamento de direito consubstanciado no art. 108 do RPS, pelo que sua aplicação deve ser afastada no caso concreto.
Nesse sentido, cita-se o magistério dos ilustres doutrinadores (...):
"O artigo 16 da Lei de Benefícios assegura a condição de dependente ao filho (e enteados e tutelados) e aos irmãos do segurado, até a idade de 21 anos, ou se inválidos, nos incisos I e III, respectivamente.
Ocorre que o Decreto n. 6.939/2009 modificou a redação do art. 108 do RPS para estabelecer que a "pensão por morte somente será devida ao filho e ao irmão cuja invalidez tenha ocorrido antes da emancipação ou de completar a idade de vinte e um anos, desde que reconhecida ou comprovada, pela perícia médica do INSS, a continuidade da invalidez até a data do óbito do segurado". Discordamos dessa regra, pois cria restrição não prevista na Lei de Benefícios e afasta a concessão da prestação previdenciária justamente nos casos de flagrante vulnerabilidade social enfrentada pelos dependentes inválidos.
Ou seja, comprovada a invalidez antes do óbito, o benefício deve ser concedido, mesmo que a invalidez tenha surgido após as hipóteses de cessação da dependência."
(CARLOS ALBERTO PEREIRA DE CASTRO e JOÃO BATISTA LAZZARI, Manual de Direito Previdenciário, 21ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 900)
Na mesma toada, registre-se o firme posicionamento esposado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. IRMÃO MAIOR E INVÁLIDO. MORBIDADE PSÍQUICA - ESQUIZOFRENIA PARANOIDE. DOENÇA GRAVE - HIV. INVALIDEZ SUPERVENIENTE À MAIORIDADE. IRRELEVÂNCIA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. EXCESSO DE PODER REGULAMENTAR. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
(...)4. O artigo 108 do Decreto 3.048/1991 extrapolou o poder regulamentar, pois criou um requisito para a concessão do benefício de pensão por morte ao filho ou irmão inválido, qual seja: que a invalidez ocorra antes dos vinte e um anos de idade.5. É irrelevante o fato de a invalidez ter sido após a maioridade do postulante, uma vez que, nos termos do artigo 16, inciso III c/c parágrafo 4º, da Lei 8.213/91, é devida a pensão por morte, comprovada a dependência econômica, ao irmão inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.6. Alinhado a esse entendimento, há precedentes do STJ no sentido de que, em se tratando de dependente maior inválido, basta a comprovação de que a invalidez é anterior ao óbito do segurado.
Nesse sentido: AgRg no AREsp 551.951/SP, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 24/4/2015, e AgRg no Ag 1.427.186/PE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 14/9/2012.7. In casu, a instituidora do benefício faleceu em 17 de junho de 2011 (fl. 370, e-STJ), a invalidez anterior à data do óbito (1.5.2001) e a dependência econômica do irmão foram reconhecidas pelo acórdão recorrido (fls. 484-485, e-STJ). Portanto, encontram-se preenchidos os requisitos legais para concessão do benefício pleiteado.8. Recurso Especial provido.
(REsp 1551150/AL, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/10/2015, DJe 21/03/2016)
Superada tal questão, cumpre salientar que, segundo a jurisprudência do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, o §4º do art. 16 da LBPS estabelece uma presunção relativa (juris tantum) de dependência econômica.
Dessa forma, a dependência econômica do filho maior inválido é presumida, podendo, contudo, ser elidida por prova em sentido contrário, a cargo da autarquia previdenciária.
Nesse sentido:
"O § 4º do artigo 16 da Lei 8.213/1991 estabelece uma presunção relativa de dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I do mesmo dispositivo, e, como tal, pode ser elidida por provas em sentido contrário."
(AgInt no AREsp 1327916/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/12/2018, DJe 14/12/2018)
Dessa forma, não havendo prova em contrário, presume-se a dependência econômica do filho maior inválido e, por conseguinte, sua condição de dependente.
Outrossim, cumpre referir que a circunstância de a demandante perceber aposentadoria por invalidez, de valor mínimo, não basta, por si só, para infirmar a presunção de dependência econômica da autora (filha maior inválida) em relação ao seu genitor (segurado), tanto que o art. 124 da LBPS não veda a percepção conjunta de aposentadoria por invalidez e pensão por morte.
Nesta senda:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PREENCHIDOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. FILHA MAIOR INVÁLIDA. ACUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFICIO CONCEDIDO.1. Para a obtenção do benefício da pensão por morte, faz-se necessário a presença de dois requisitos: qualidade de segurado e condição de dependência.2. No que tange à qualidade de segurado, restou plenamente comprovada.3. Quanto à dependência econômica em relação ao de cujus, na figura de filho maior inválido, restou igualmente caracterizada, a teor do art. 16, I, §4º, parte final, da Lei n. 8.213/91.4. Em consulta ao extrato do sistema CNIS/DATAPREV verifica-se que a autora é beneficiária de aposentadoria por invalidez, o que corrobora a alegação de incapacidade laborativa do autor em data anterior ao óbito dos genitores.5. Assim sendo, no caso, mesmo sendo o autor beneficiário da aposentadoria por invalidez, não é fator impeditivo ao recebimento do benefício da pensão por morte da genitora, vez que é possível a acumulação dos dois benefícios, por possuírem natureza distinta.6. Apelação parcialmente provida.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApReeNec - Apelação / Reexame Necessário - 0000445-78.2017.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 20/12/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 21/01/2020)
Outrossim, cumpre sobrelevar que, nos termos do art. 77, §6º, da Lei n. 8.213/1991, "o exercício de atividade remunerada, inclusive na condição de microempreendedor individual, não impede a concessão ou manutenção da parte individual da pensão do dependente com deficiência intelectual ou mental ou com deficiência grave."
Da análise da referida norma, extrai-se que o exercício de atividade laborativa - e, por conseguinte, a obtenção de renda - pelo dependente que padece de deficiência intelectual ou mental, ou, ainda, de deficiência grave, não impede a concessão - ou a manutenção - de pensão por morte em seu favor.
Logo, se o exercício de atividade remunerada, de per si, não se revela causa idônea para afastar o direito à pensão por morte, com redobradas razões a percepção de aposentadoria por invalidez - benefício previdenciário que, também, decorre do exercício de atividade laborativa - não pode constituir justo óbice ao recebimento do benefício.
No caso concreto, é patente que a autora padece de grave enfermidade mental e não possui condições de exercer atividade laborativa, consoante conclusão lavrada no laudo médico-pericial carreado aos autos (anexo n. 28):
"A pericianda apresenta comprometimento do raciocínio lógico, não conseguindo exprimir desejos ou necessidade, o que a impossibilita de imprimir diretrizes de vida.
Há restrição total para atos de vida negocial e patrimonial, como fazer empréstimos, conciliar, dar quitação, alienar, demandar ou ser demandado, praticar atos que não sejam de mera administração.
O quadro é irreversível."
(LAUDO MÉDICO-PERICIAL - Anexo n. 28, fl. 14)
Nesta quadra, afigurar-se-ia um contrassenso não reconhecer a dependência econômica e, consequentemente, privar a autora - que não tem condições de trabalhar - do benefício da pensão por morte e, concomitantemente, reconhecer a dependência econômica e conceder o aludido benefício em favor de deficiente que exerce atividade laboral.
Ademais, repise-se que o benefício de aposentadoria por invalidez recebido pela parte autora é de valor mínimo, que, sabidamente, pelas "regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece" (art. 375 do CPC), é insuficiente para custear, adequadamente, a manutenção de pessoa portadora de deficiência, que, por sua condição peculiar de saúde, demanda gastos mais elevados que uma pessoa que goza de perfeita higidez física e mental.
Nesta senda, ainda que se tratando de caso envolvendo Regime Próprio de Previdência Social (RJU - Lei n. 8.112/1990), o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA já decidiu que a percepção de benefício de aposentadoria por invalidez, no valor de R$ 1.814,81, não elide a presunção de dependência econômica do filho maior inválido em relação ao segurado falecido, senão vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. FILHA MAIOR. INVALIDEZ. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. PRESUNÇÃO. CUMULAÇÃO DE PENSÃO COM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. POSSIBILIDADE.
(...)4. Com efeito, a norma não exige a prova de dependência econômica do filho inválido em relação ao de cujus. Outrossim, o simples fato de a parte recorrente receber aposentadoria por invalidez não elide a presunção de dependência econômica da filha inválida no que se refere a sua genitora, mormente em se considerando que, por lógica mediana, o benefício de aposentadoria por invalidez de R$1.814,81 é insuficiente para suprir as necessidades básicas da parte recorrente.5. Conforme jurisprudência do STJ, a cumulação de pensão por morte com aposentadoria por invalidez é possível, pois possuem naturezas distintas, com fatos geradores diversos.
(...)
(REsp 1766807/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/10/2018, DJe 17/12/2018)
Derradeiramente, cumpre salientar que a autarquia previdenciária não apresentou nenhuma prova visando a desconstituir a presunção relativa de dependência econômica que milita em favor da parte autora, faltando, assim, com o ônus imposto no art. 332, inciso II, do CPC, razão pela qual, no caso concreto, deve prevalece a presunção juris tantum prevista no art. 16, §4º, da LBPS.
Assim sendo, pelas razões aduzidas, a concessão do benefício da pensão por morte em favor da autora é medida que se impõe (...)".5. Verifico que a sentença abordou de forma exaustiva todas as questões arguidas pela recorrente, tendo aplicado o direito de forma irreparável, motivo pelo qual deve ser confirmada por seus próprios fundamentos, nos termos do
art. 46 da
Lei n.º 9.099/95.
6. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
7. Condeno a parte recorrente ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do
artigo 55 da
Lei 9.099/95, corrigido conforme critérios definidos na sentença.
8. É o voto.
(TRF 3ª Região, 11ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO, 16 - RECURSO INOMINADO - 0002181-49.2019.4.03.6317, Rel. JUIZ(A) FEDERAL PAULO CEZAR NEVES JUNIOR, julgado em 18/09/2020, e-DJF3 Judicial DATA: 24/09/2020)