Inconformada com a r. sentença de fls. 596/604, que julgou o feito procedente em parte e cujo relatório adoto, a reclamada interpõe recurso ordinário, às fls. 614/633. Pretende a ré a reforma da r. sentença alegando que não procede a condenação no pagamento dos seguintes títulos: horas extras e reflexos, tanto as decorrentes do excesso de jornada, quanto da supressão dos intervalos intrajornada e interjornadas; adicional noturno, observada a hora noturna reduzida; adicional de insalubridade e reflexos; honorários periciais, que merecem ser reduzidos; diferenças salariais por equiparação e reflexos. Contrarrazões apresentadas pelo autor, às fls. 640/657. Não há parecer da M. D. Procuradoria do Ministério Público do Trabalho. Ação distribuída em 11/06/2017. Sentença proferida em 31/07/2019.
...« (+2253 PALAVRAS) »
...É o relatório. V O T O 1. ADMISSIBILIDADE. Conheço do recurso interposto, porque presentes os pressupostos de admissibilidade. 2. MÉRITO. 2.1. Horas extras e reflexos. Excesso de jornada. Intervalos intrajornada e interjornadas. Adicional noturno e reflexos. Insurge-se a recorrente contra a condenação ao pagamento das parcelas intituladas, aos argumentos de que o autor exerceu trabalho externo, não sujeito ao controle de horário, durante dois períodos do contrato de trabalho, assim como não extrapolou a jornada, tampouco se desvencilhou de seu ônus processual de comprovar a jornada descrita na inicial. Assiste-lhe razão em parte. Consigne-se, de início, que o contrato de trabalho vigorou de 12/05/1997 a 01/02/2017 (fls. 35) e que, na contestação (fls. 281/323), a reclamada sustentou que o autor exerceu trabalho externo, não sujeito ao controle de horário, do período imprescrito até 31/08/2013 e, a partir de 01/03/2014, sendo que no intervalo entre estes dois períodos (01/09/2013 a 28/02/2014), o reclamante não cumpriu horas extras, conforme cartões de ponto. Contudo, os referidos cartões de ponto, do período em que a ré alegou controlar a jornada (01/09/2013 a 28/02/2014), não vieram aos autos. Melhor sorte não socorre a ré, ao dizer que o reclamante desempenhou suas atribuições externamente, sem controle de jornada, na forma do art. 62, I, da CLT. Em regra, as atividades desenvolvidas externamente são incompatíveis com a fiscalização de jornada, não se sujeitando o empregado às disposições do regime de duração de trabalho contidas na CLT. Porém, se existir de alguma forma a possibilidade de controle de horário, o empregado não se enquadrará na hipótese prevista no art. 62, I, da CLT. E esta é a hipótese dos autos. O preposto declarou que "o reclamante ingressou como promotor de vendas; que o reclamante passou a promotor líder em 2011; que em 2014 o reclamante passou a vendedor; que o reclamante laborava em horário comercial, sempre o mesmo horário, das 08h00 às 17h00 de segunda a sexta-feira e sábados até 12h00; que o reclamante não prorrogava a jornada; que o reclamante tinha uma hora de intervalo; (...) que o reclamante como promotor não tinha telefone corporativo; que o mercado que o reclamante atendia havia controle de acesso à loja, onde a loja tinha seu controle paralelo dos horários, mas era o controle da loja; que há lojas que permitem que a reclamada tenha acesso a esses documentos e outras que não permitem; que o gestor de rua do reclamante nunca informou se havia tal controle; que o coordenador comercial determinava as lojas que o reclamante deveria atender, tanto como vendedor como quando promotor; que como vendedor, era o coordenador comercial da área Ice (Kibon); que a rota do reclamante como vendedor já saía pré determinada no aparelho; que o reclamante usava óculos, botas e luvas e como promotor de merchandising também capacete; que em caso de faltas, o reclamante deveria entregar atestados ao seu superior imediato;..." (fls. 568/569). Por sua vez, a testemunha ouvida a convite da ré declarou "que os vendedores fazer (sic) uso do aplicativo Mseries para fazer os pedidos de venda e o controle dos ativos da companhia; que no aplicativo aparece o cadastro d cliente, a loja vistoriada..."(fls. 569). Depreende-se dos depoimentos acima transcritos que a ré tinha como controlar a jornada da trabalho do autor, durante todo o período contratual. A ausência de controles de horário atrai a incidência do item I, da Súmula 338, do C. TST, com inversão do ônus da prova e presunção relativa da jornada narrada na inicial, que pode ser elidida pelos demais elementos de convicção presentes nos autos. O MM. Juízo acolheu a jornada narrada na inicial (fls. 10), isto é, de segunda a sexta-feira, das 7h00 às 20h30 e, duas vezes na semana, encerrando às 23h00; sábados, das 7h00 às 17h00, com intervalo intrajornada de 30 minutos. Entendo que a r. sentença merece pequeno reparo, no tocante à fixação da jornada, considerado o depoimento da testemunha convidada pelo trabalhador, segundo o qual: "ingressou na reclamada em julho de 1997, saindo em julho de 2016; que iniciou como vendedor, depois supervisor e coordenador de vendas; que trabalhou junto com o reclamante, de 2011 a 2016; que o reclamante era promotor de auto serviço em 2011, trabalhando indiretamente com o depoente, o depoente da divisão de sorvetes e o reclamante fazia toda a Unilever; que quando era sorvete, o reclamante falava com o depoente; que como promotor, o reclamante tinha reuniões na Unilever, de uma a duas vezes por semana, no final do dia; que o horário do reclamante, como promotor, tinha horário de ponto, laborando das 07h00 às 20h00, horário de lojas (clientes da reclamada); que o promotor tinha ponto na loja cliente que o reclamante fazia; que o depoente promoveu o reclamante a vendedor em dezembro de 2014 até a saída do depoente; que o reclamante laborava das 07h00 às 20h30 como vendedor de segunda a sexta-feira e sábados até 17h00, controlado através do Mseries e GPS do celular, além de ponto de encontro matinal e vespertino, orientado pela companhia; que o reclamante tinha trinta minutos de intervalo; que como chefe o depoente controlava o horário do reclamante através do Mseries; (...); que uma ou duas vezes por semana o reclamante passava das 20h30 em razão do ponto de encontro, ficando até 22h00; que quando promotor líder, o reclamante marcava o horário em folha de ponto manual na loja; que não presenciou o reclamante trabalhando além das 20h00 como promotor; que o reclamante tinha obrigação de cumprir o roteiro definido pela gerência, sob pena de ser advertido, até porque trabalham com metas; que o reclamante saía com uma média de vinte e cinco visitas, uma média de vinte e cinco minutos por clientes; que o intervalo era controlado pelo Mseries, não precisando ligar para avisar o intervalo; que pela quantidade de visitas, o reclamante não podia fazer uma hora de intervalo" (fls. 570 - sublinhei). Conforme trechos acima em destaque do depoimento da testemunha do próprio reclamante, fixo a seguinte jornada, com base, inclusive, na ficha de registro do trabalhador, que acusa a promoção a vendedor, a partir de 01/12/2014 (fls. 324/327): Até 30/11/2014, quando o reclamante trabalhava como promotor: de segunda a sexta-feira, das 7h00 às 20h00 e aos sábados, das 7h00 às 17h00, com intervalo intrajornada de 30 minutos; a partir de 01/12/2014, quando o reclamante foi promovido a vendedor: de segunda a sexta-feira, das 7h00 às 20h30 e, duas vezes na semana, encerrando às 22h00; sábados, das 7h00 às 17h00, com intervalo intrajornada de 30 minutos. A jornada acima fixada confere ao trabalhador o direito à percepção de horas extras, tanto as excedentes da oitava diária, ou quadragésima quarta semanal, quanto as decorrentes da supressão dos intervalos intrajornada e interjornadas. Contudo, exclui da condenação no pagamento do adicional noturno e a determinação de observação da ficção jurídica da hora noturna reduzida. Como contrato de trabalho vigorou no período anterior à Reforma Trabalhista (de 12/05/1997 a 01/02/2017), deve ser aplicada a legislação vigente à época dos fatos, já que o intervalo intrajornada não se trata de matéria processual. Assim, resta mantida a r. sentença, que deferiu uma hora extra e reflexos, em razão da supressão parcial do intervalo intrajornada (item I, da Súmula 437 do C. TST), pois, no caso, não se aplica a nova redação do parágrafo 4º, do art. 71 da CLT, a prever a natureza indenizatória da parcela: "§ 4° A não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento, de natureza indenizatória, apenas do período suprimido, com acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho". Ainda, o descumprimento do art. 66 da CLT não constitui apenas infração administrativa, à vista da disposição da Súmula 26 deste E. TRT e Orientação Jurisprudencial 355, da SBDI-1, do C. TST: 26 - Intervalo entre jornadas. Artigo 66 da Consolidação das Leis do Trabalho. Inobservância. Horas extras. (Res. TP nº 02/2015 - DOEletrônico 26/05/2015) A inobservância do intervalo mínimo de 11 horas previsto no art. 66 da CLT resulta no pagamento de horas extras pelo tempo suprimido. 355. Intervalo interjornadas. Inobservância. Horas extras. Período pago como sobrejornada. Art. 66 da CLT. Aplicação analógica do § 4º do art. 71 da CLT. (DJ 14.03.2008) O desrespeito ao intervalo mínimo interjornadas previsto no art. 66 da CLT acarreta, por analogia, os mesmos efeitos previstos no § 4º do art. 71 da CLT e na Súmula nº 110 do TST, devendo-se pagar a integralidade das horas que foram subtraídas do intervalo, acrescidas do respectivo adicional. Por fim, devido o principal, são devidos os acessórios, inclusive os reflexos sobre os DSRs, na forma da Súmula 172 do C. TST, a preconizar que "computam-se no cálculo do repouso remunerado as horas extras habitualmente prestadas". No mais, atente-se a ré que o MM. Juízo não determinou a incidência do DSR refletido pelas horas extras sobre as demais verbas. Provejo em parte para fixar a seguinte jornada para o cômputo de horas extras e reflexos: até 30/11/2014, quando o reclamante trabalhava como promotor - de segunda a sexta-feira, das 7h00 às 20h00 e aos sábados, das 7h00 às 17h00, com intervalo intrajornada de 30 minutos; a partir de 01/12/2014, quando o reclamante foi promovido a vendedor - de segunda a sexta-feira, das 7h00 às 20h30 e, duas vezes na semana, encerrando às 22h00e aos sábados, das 7h00 às 17h00, com intervalo intrajornada de 30 minutos; e, com isto, excluir da condenação o pagamento de adicional noturno e reflexos. 2.2. Adicional de insalubridade. Honorários periciais. Sustenta a reclamada que o autor recebeu todos os equipamentos de proteção individual e que sua entrada na câmara fria se dava de maneira eventual. Insurge-se contra a condenação no pagamento dos honorários periciais, que, ao menos, merecem ser reduzidos. Sem razão. Realizada perícia, o perito judicial concluiu (fls. 506/528): Acessava câmara frigorífica 2 vezes quando era promotor e 4 vezes quando era vendedor. Quando era promotor permanecia cerca de 1 hora dentro das câmaras frigoríficas e quando foi promovido a vendedor permanecia em média cerca de 2 horas dentro das câmaras frigoríficas. O Reclamante alega que não recebeu ou utilizava jaqueta térmica para acessar as câmaras. (...) 11- CONCLUSÃO Em diligência foram verificados os quesitos pressão sonora, temperatura, frio, exposição a atmosferas ácidas, exposição a monóxido de carbono, concentração de oxigênio, metano e avaliação dos produtos químicos utilizados. Relativo à insalubridade pleiteada. (...) Referente a exposição ao frio, o Reclamante acessava câmara frigorífica 2 vezes quando era promotor e 4 vezes quando era vendedor. Quando era promotor permanecia cerca de 1 hora dentro das câmaras frigoríficas e quando foi promovido a vendedor permanecia em média cerca de 2 horas dentro das câmaras frigoríficas. A temperatura encontrada da câmara frigorífica foi de (-15,8 ºC). O Reclamante alega que não recebeu ou utilizava jaqueta térmica para acessas as câmaras. A alegação recursal - de que foram fornecidos equipamentos de proteção individual - não foi provada, eis que a ré deixou de juntar recibos de entrega assinados pelo autor. Também é inócua a discussão em torno do tempo de permanência do autor no interior da câmara fria, visto que, em relação ao agente físico frio, a insalubridade é determinada de forma qualitativa, e não quantitativa, pouco importando, portanto, o tempo de exposição do trabalhador ao agente insalubre. Por fim, a quantia arbitrada em R$ 1.500,00 para a perícia realizada para apuração da exposição a agentes insalubres obedece aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, vez que reflete o grau de dificuldade do laudo realizado, a qualificação técnica do sr. perito, o tempo despendido à sua elaboração e, ainda, observa parâmetros monetários estabelecidos pela realidade nacional. Mantenho. 2.3. Equiparação salarial e reflexos. Sustenta a reclamada que estão ausentes os elementos previstos no art. 461 da CLT, caracterizadores da equiparação salarial, pois o autor não desenvolveu seu trabalho na mesma localidade, com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica que o paradigma, (...), nos moldes do § 1º, do art. 461, da CLT. Sem razão. Nos termos do item VIII, da Súmula 6 do C. TST, era da ré o ônus da prova do fato impeditivo, modificativo, ou extintivo da equiparação salarial. Mas dele não se desincumbiu. O preposto confessou que "o reclamante e o Sr. Anelito passaram a promotor líder em 2011, realizando as mesmas atividades" (fls. 569 - sublinhei). Tal confissão expressa é absoluta jure et jure e não admite prova em contrário. Ademais, a reclamada não trouxe documentos comprobatórios de que havia diferença de tempo de serviço superior a dois anos entre o autor e o modelo. Nesse sentido, peço vênia para adotar os fundamentos da r. sentença (fls. 601): Corroboram tais assertivas a prova documental. Primeiro, a ficha de registro do Autor, em que consta "Em 01.12.2011, posição 00025764 - Promotor Lider até março/14" (ID. 46ec909 - Pág. 11). Segundo, a ficha de registro do Sr. ANELITO, extraída dos autos nº 1001537-91.2017.5.02.0501, o qual confirmado que o paradigma foi promovido a promotor líder em 01.11.2012 (ID. ba3cce2 - Pág. 11, daqueles autos). A nomenclatura dos cargos ocupados pelo reclamante e paradigma não afasta a identidade de funções, por força da disposição do item III, da Súmula 6 do C. TST: III - A equiparação salarial só é possível se o empregado e o paradigma exercerem a mesma função, desempenhando as mesmas tarefas, não importando se os cargos têm, ou não, a mesma denominação. (ex-OJ da SBDI-1 nº 328 - DJ 09.12.2003) (grifei) Por fim, o item X, da Súmula 6 do C. TST dispõe sobre o conceito de "mesma localidade": X - O conceito de "mesma localidade" de que trata o
art. 461 da
CLT refere-se, em princípio, ao mesmo município, ou a municípios distintos que, comprovadamente, pertençam à mesma região metropolitana. (ex-OJ da SBDI-1 nº 252 - inserida em 13.03.2002) E nada consta dos autos a demonstrar que o local de trabalho do autor não estivesse de acordo com o item X, da Súmula 6 do C. TST. Nego provimento.
(TRT-2, 1000740-18.2017.5.02.0501, Rel. VALERIA PEDROSO DE MORAES - 9ª Turma - DOE 06/02/2020)