RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CRIANÇA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). HEMATOMAS. COMUNICAÇÃO DA ESCOLA POR SUPOSTO MAUS-TRATOS AO CONSELHO TUTELAR. INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO. ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL. AUSÊNCIA DE DANOS MORAIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 01. (1.1). Trata-se de Ação de Indenização por Danos Morais, na qual narra a parte autora, em síntese, que matriculou o seu filho,
(...) portador de autismo moderado, em janeiro de 2021 na escola requerida e afirmou que a diretora
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...da instituição de ensino tinha conhecimento das condições especiais do aluno. Aduziu que no mês de abril de 2021, ao chegar na escola para deixar o seu filho, a diretora a indagou sobre o porquê de seu filho apresentar hematomas pelo corpo. Discorreu que no dia 27/05/2021, a escola requerida ligou para ela questionando porque de (...) não comparecer às aulas, desse modo, destacou que o seu filho encontrava-se gripado. Afirmou que, após as suas explicações, foi até a escola, a pedido da diretora, e deparou-se com o Conselho Tutelar, informando-lhe que havia sido denunciada por maus tratos a criança. Por essas razões, ajuizou a presente demanda, requerendo indenização por danos morais (ev. 01). (1.2). Na origem, a magistrada singular julgou totalmente improcedentes os pedidos iniciais, uma vez que a ação da requerida não causou nenhuma ofensa à ordem moral da parte autora (ev. 37). (1.3). Inconformada, a reclamante interpôs recurso inominado. Em suas razões, argumentou que, por se tratar de relação de consumo, haja vista a negociação entre um consumidor e fornecedor de bens e serviços, a parte requerida prestou serviços de forma insatisfatória, devendo ser reconhecida a responsabilidade civil pelos danos causados a recorrente. Repisou que a situação em tela a expôs a uma situação vexatória e humilhantes. Pugnou pela reforma da sentença para julgar totalmente procedentes os pedidos iniciais (ev. 40). 02. Recurso próprio, tempestivo e isento de preparo tendo em vista que a requerente é beneficiária da assistência judiciária gratuita (ev. 42). Contrarrazões apresentadas (ev. 45). 03. O cerne da questão cinge-se em verificar se a instituição de ensino requerida agiu com ilegalidade capaz de ensejar danos morais à parte requerente. 04. Em que pese a relação estabelecida entre a requerente e a requerida seja consumerista, a questão em discussão da presente ação funda-se na esfera cível, razão pela qual, não há se falar em aplicabilidade das normas previstas no CDC, mas sim as contidas no Código Civil. 05. A Constituição Federal afirma ser dever da ?família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.? 06. (6.1). O art. 56 da Lei n. 8.069/1990 ? Estatuto da Criança e do Adolescente, discorre que ?os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de: I ? maus-tratos envolvendo seus alunos; II ? reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos escolares; III ? elevados níveis de repetência.? (grifei). (6.2). Já o art. 13 da referida lei afirma que ?os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais.? (6.3). Ainda no art. 25, da mesma norma legal, dispõe: ?deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente: Pena ? multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.? (6.4). Após a análise dos artigos acima referidos, indene de dúvidas de que, se ocorrer qualquer situação da contida no art. 56, corroborado pelo art. 13, a comunicação ao Conselho Tutelar será obrigatória. No caso em apreço, verificou-se que, devido aos hematomas presentes no corpo da criança, bem como as reiteradas faltas, mesmo sendo o aluno portador de autismo moderado, a diretora da instituição de ensino, no estrito cumprimento do dever legal (Art. 12, inciso IX, da Lei 9.394/1996), foi obrigada a comunicar o Conselho Tutelar da situação em tela. 07. (7.1). DO DANO MORAL. Nos termos do art. 186 do Código Civil ?aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.? (7.2). Segundo a teoria clássica da responsabilidade civil, o dever de indenização pressupõe a presença de três requisitos: dano, ilicitude do ato e nexo de causalidade entre a conduta e o prejuízo causado, inexistindo um dos requisitos acima mencionados, não há que se falar em responsabilidade civil. (7.3). No caso em tela, verifica-se que a ação da diretora da instituição de ensino comunicar o Conselho Tutelar não extrapola os deveres legalmente atribuídos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pela Constituição Federal, tão somente teve o intento de resguardar a incolumidade e a integridade da criança. Não se desconhece de que tal situação possa ter deixado a autora em situação de constrangimento, ocorre que, não há nenhum indício de situação vexatória, não podendo a hipótese em questão ser elevada ao patamar de danos morias, uma vez que não restou demonstrado qualquer ato ilícito ou abuso de direito praticado pela promovida, tendo a juíza singular muito bem se posicionado no aspecto de julgar improcedente os pedidos iniciais. 08. Sentença integralmente mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos. 09. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Condeno a recorrente ao pagamento das custas e honorários advocatícios de 15% sobre o valor da causa atualizada, conforme disposto no artigo 55, Lei nº 9.099/95, ficando suspensa a exigibilidade da cobrança quanto a parte autora. Esta ementa servirá de acórdão, consoante disposto no artigo 46 da Lei 9.099/95. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos oralmente os presentes autos, ACORDA a SEGUNDA TURMA RECURSAL, CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto acima ementado, da lavra do relator ? Juiz de Direito Fernando César Rodrigues Salgado ? que foi acompanhado pelos excelentíssimos Juízes Fernando Ribeiro e Oscar de Oliveira Sá
(...). Goiânia, datado e assinado digitalmente. Fernando César Rodrigues Salgado Relator Fernando Ribeiro Montefusco Juiz Vogal Oscar de Oliveira Sá Neto Juiz Vogal
(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Recurso Inominado Cível 5424964-88.2022.8.09.0007, Rel. Fernando César Rodrigues Salgado, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 06/07/2023, DJe de 06/07/2023)