PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0019937-48.2021.4.03.6302
RELATOR: 32º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: VALDECIR MARQUES MOTA
Advogado do(a) RECORRENTE: REYNALDO CALHEIROS VILELA - SP245019-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.
1. Pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de tempo especial.
2. Sentença de improcedência lançada nos seguintes
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...termos:
“(...)
Inicialmente, há que se ressaltar que a presente sentença cingir-se-á à análise dos tempos de serviço efetivamente controvertidos na esfera administrativa por ocasião do requerimento do benefício. Desse modo, serão mencionados apenas os tempos objeto de controvérsia, a despeito de eventual pedido de reconhecimento de tempo de serviço mencionado na inicial e ora não mencionado.
Atividade especial.
Conforme entendimento da Turma Nacional de Uniformização, até 5.3.97, data do advento do Decreto nº 2.172/97, deve ser levada em consideração a disciplina contida nos Decretos nº 53.831-64 e nº 83.080-79, para efeito de comprovação de atividade especial (PEDILEF nº 200783005072123, Rel. Juíza Federal Joana Carolina Lins Pereira).
A exigência de laudo técnico advém da Lei nº 9.528-97, resultante de conversão da Medida Provisória nº 1.523-96.
Para o tempo de serviço exercido anteriormente à vigência do mencionado diploma legal, o enquadramento se fazia conforme a atividade profissional do segurado. Havia uma relação anexa ao regulamento de benefícios, onde constava a lista de atividades profissionais e os agentes nocivos considerados especiais. A ausência da atividade da lista, no entanto, não afastava eventual direito à aposentadoria especial, desde que demonstrado, na situação concreta, o risco da profissão.
A previsão acerca dos agentes agressivos deve estar contida na legislação previdenciária, tendo em vista que esse ramo do direito — e não o trabalhista — é que se incumbe de definir as hipóteses de contagem especial do tempo para fins de aposentadoria no regime geral.
Em alguns casos, as definições adotadas nos atos normativos previdenciários especificados não se limitam a mencionar elementos, substâncias e agentes biológicos nocivos, mas, também, especificam a forma como tais agentes são obtidos, gerados, utilizados ou produzidos. Sendo assim, para restar configurada a nocividade da exposição e, por extensão, o caráter especial do tempo em que a exposição ocorre, os laudos devem descrever, em tais casos, além das substâncias ou elementos, os processos em que tais eventos (obtenção, geração, utilização e produção) ocorrem.
Por último, mas não menos importante, deve ficar caracterizado que o segurado tenha estado exposto em caráter habitual e permanente a uma das formas de manejo especificadas na legislação. Vale dizer que a exposição eventual ou intermitente impossibilita o reconhecimento do caráter especial do tempo para fins previdenciários.
Tratando-se de ruídos, aplicam-se as regras dispostas nos Decretos n° 53.831-64 e nº 83.080-79, que autorizam a caracterização da atividade como especial, quando o trabalhador foi submetido a ruído superior a 80 decibéis, até a data de edição do Decreto nº 2.172, de 5.3.97. Isso porque, a partir de então, para ser considerado como agente agressivo, o ruído deve ser acima de 90 decibéis. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.03, passou a ser agente agressivo o ruído superior a 85 decibéis.
No que diz respeito à metodologia utilizada para aferição do ruído nos laudos apresentados, destaco o entendimento adotado pela E. Turma Recursal de São Paulo em acórdão proferido nos autos de nº 0005702-13.2020.4.03.6302, de que a simples indicação no PPP ou LTCAT da adoção das metodologias previstas na NHO-01 ou na NR-15, ou mesmo a referência à utilização do método de medição da “dosimetria”, já são suficientes para atender ao previsto na legislação previdenciária, veja-se:
“Por conseguinte, desde que o PPP ou o laudo técnico indique, expressamente, a adoção das metodologias previstas na NHO-01 ou na NR-15, deve-se presumir que os valores informados, independentemente da técnica de medição utilizada, refletem a dose diária, devidamente normalizada para uma jornada de trabalho padrão de oito horas.
Finalmente, embora tenha entendido de forma diversa, o método de medição “dosimetria” também é suficiente para o atendimento das normas em vigor e está em consonância com o Tema 174 da TNU, nos termos do julgado no Pedido de Uniformização Regional nº 0001089-45.2018.4.03.9300 (processo originário nº 0004366-98.2016.4.03.6306), em 11/09/2019.
(...)
Assim, restou comprovada a utilização de técnica de medição de ruído que atende a legislação previdenciária, razão pela qual os períodos em comento também devem ser mantidos como atividade especial”.
Com relação a eventual utilização de EPI, as Súmulas nsº 09 e 87 da Turma de Uniformização das Decisões das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais dispõem que:
“O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado”.
“A eficácia do EPI não obsta o reconhecimento de atividade especial exercida antes de 03/12/1998, data de início da vigência da MP 1.729/98, convertida na Lei n. 9.732/98”.
O Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) nº 664335, com repercussão geral reconhecida, fixou duas teses acerca dos efeitos da utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI), quais sejam: I) “o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial”; e II) “na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria”.
No que se refere à data dos laudos, a TNU também disciplinou a matéria, no sentido de ser irrelevante a data do laudo pericial para fins de reconhecimento da atividade especial:
“Súmula nº 68 O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”.
Ainda, tratando-se da atividade de vigilante, indispensável a citação da Súmula n° 26 da Turma Nacional de Uniformização: ”A atividade de vigilante enquadra-se como especial, equiparando-se à de guarda, elencada no item 2.5.7. do Anexo III do Decreto n. 53.831/64”.
A mesma Turma Nacional de Uniformização, no julgamento do Pedido de Uniformização nº 0502013-34.2015.4.05.8302, representativo de controvérsia, fixou a tese de que é possível o reconhecimento de tempo especial prestado com exposição a agente nocivo periculosidade, na atividade de vigilante, mesmo em data posterior a 05/03/1997, desde que laudo técnico (ou elemento material equivalente) comprove a permanente exposição à atividade nociva.
Ademais, o STJ firmou entendimento em sede de Recursos Repetitivos, no tema 1.031, que:
“É admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de Vigilante, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997, desde que haja a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por qualquer meio de prova até 5.3.1997, momento em que se passa a exigir apresentação de laudo técnico ou elemento material equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem intermitente, exposição à atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do Segurado”.
Caso concreto
No caso dos autos, todavia, não reconheço a especialidade dos períodos pleiteados, eis que não há comprovação de exposição a fatores de risco em nível acima do tolerado, a despeito de oportunidade concedida para tanto (evento 13, id 159783272).
Designada audiência para oitiva de testemunhas em relação ao uso ou não de arma de fogo, a parte autora declarou que não teria mais interesse em ouvi-la (id 288558388).
Ademais, para outros elementos nocivos, diante de certidões de baixa/inatividade (evento 18, id 159783284), não é cabível o reconhecimento do período de labor especial por meio de perícia por similaridade, uma vez que não retrataria as efetivas condições de trabalho enfrentadas pela parte autora à época do seu labor. De fato, entendo que não cabe a realização de perícia em ambientes similares aos das empresas cujas atividades já foram encerradas, já que os resultados das medições, por não condizerem com os efetivos locais de trabalho, não se revestiriam do caráter de certeza que se espera de uma prova técnica dessa natureza.
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO (CPC, ART. 557, § 1º). CONCESSÃO. APOSENTADORIA. TEMPO ESPECIAL. ATIVIDADE INSALUBRE NÃO RECONHECIDA 1. No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto n. 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica. 2. Não é possível o reconhecimento da natureza especial de atividade por similaridade, nem por testemunhos de funcionários ou empregadores, razão pela qual entendo que o laudo técnico não comprova as alegadas condições especiais. 3. Agravo (CPC, art. 557, §1º) interposto pelo autor improvido
(APELREEX 00144907120064039999, JUIZ CONVOCADO FERNANDO GONÇALVES, TRF3 - SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/03/2012. Destacou-se.)
Há, ainda, documentação não trazendo uso de arma de fogo (fls. 62/63, anexo 02), ruído abaixo dos limites e intermitente (78,3 dB), em direção de “automóveis, peruas e outros veículos leves” (fls. 103/104, anexo 02).
Por fim, o item 2.2.1 do Decreto nº 53.831-64 considerava especial o tempo trabalhado na agropecuária, o que não se aplica ao caso do autor, que trabalhou somente na agricultura. Vale lembrar que a agropecuária é caracterizada pelo exercício simultâneo de atividades agrícolas e pecuárias, conforme reconhece expressamente a Classificação Brasileira de Ocupações, expedida pelo Ministério do Trabalho e Emprego (agropecuária: item 6-21.5).
O Superior Tribunal de Justiça já assinalou que o “Decreto nº 53.831/64, no seu item 2.2.1, considera como insalubre somente os serviços e atividades profissionais desempenhados na agropecuária, não se enquadrando como tal a atividade laboral exercida apenas na lavoura” (Sexta Turma. REsp nº 291.404. DJ de 2.8.04).
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região tem idêntico posicionamento, porquanto pontifica que a “atividade na lavoura não está enquadrada como especial, porquanto o código 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64 se refere apenas à agropecuária. Assim, ainda que o rol das atividades especiais elencadas no Decreto não seja taxativo, é certo que não define o trabalho desenvolvido na lavoura como insalubre. Aliás, é específico quando prevê seu campo de aplicação para os trabalhadores na agropecuária, não abrangendo, assim, todas as espécies de trabalhadores rurais” (Décima Turma. Apelação Cível nº 837.020. Autos nº 200203990411790).
Nem se alegue que as intempéries porventura indicadas levariam a conclusão diversa, conforme já pacificado pela jurisprudência:
“Com efeito, apesar de o trabalho no campo, exercido pelo rurícola, ser extremamente desgastante, estando sujeito a diversas intempéries, tais como, calor, frio, sol e chuva, certo é que a legislação pátria não o enquadra nas atividades prejudiciais à saúde e sujeitas à contagem de seu tempo como especial, não se confundindo, assim, com o trabalho exercido na agropecuária, expressamente previsto como insalubre no item 2.2.1 do Decreto nº 53.831/1964” (excerto de AC 00130652820144039999, DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/11/2016).
Ainda, a origem do calor deve advir de fontes artificiais, e não naturais, como a estrela solar. Neste sentido:
“O autor desempenhava suas funções ao ar livre, sujeito a intempéries e a fonte de calor, para ser considerada nociva, deve ser artificial (ex: forno, caldeira, etc). e não o calor do sol. Ademais, cumpre ressaltar que o sol não é fonte nociva habitual e permanente, devendo referidos períodos serem considerados comuns”. (Excerto de 00025846320104036307, JUIZ(A) FEDERAL FLAVIA PELLEGRINO SOARES MILLANI - 4ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO, e-DJF3 Judicial DATA: 08/06/2015. Sem destaques no original.)
Não se olvide que o ônus da prova cabe a quem faz a alegação (art. 373, CPC).
Assim, resta inalterada a análise em seara administrativa.
Dispositivo
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, extinguindo o feito com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Sem custas e honorários. Defiro a gratuidade. P. I. Sentença registrada eletronicamente. Após o trânsito, dê-se baixa.
(...)”.3. Recurso da parte autora, em que alega
(...)
(...)
(...)
(...)
(...)4. Não procede a alegação de cerceamento de defesa, pois constitui ônus da parte autora fazer prova dos fatos constitutivos de seu direito. Nos processos que tramitam perante os Juizados Especiais Federais, que têm rito próprio previsto nas Leis 10.259/01 e 9.099/95, o requerimento, especificação e justificação das provas deve ser feito quando do ajuizamento da ação, o que não ocorre no caso concreto. Com efeito, o requerimento de produção de prova foi apresentado de forma abstrata e genérica, sem nenhuma justificativa quanto à sua necessidade e pertinência.5. Saliente-se que, a partir da Lei 9.032/95, o reconhecimento do direito à conversão do tempo de serviço especial se dá mediante a demonstração da exposição aos agentes prejudiciais à saúde, por meio de formulários estabelecidos pela autarquia, até o advento do Decreto 2.172/97 (05/03/1997). A partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
6. No caso dos autos, a parte autora apenas apresentou PPP referente ao período de 20/10/2009 a 20/07/2010, laborado na Empresa Brasileira de Segurança e Vigilância. Em relação aos demais vínculos controvertidos, não foram apresentados formulários, PPP ou LTCAT, nem comprovada a impossibilidade de obtê-los
7. No mais, considerando que o Supremo Tribunal Federal determinou a suspensão nacional de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos que versem sobre o reconhecimento da especialidade da atividade de vigilante (Tema 1.209), determino o sobrestamento do feito, até que a questão seja apreciada pelo STF
MAÍRA FELIPE LOURENÇO
JUÍZA FEDERAL RELATORA
(TRF 3ª Região, 11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0019937-48.2021.4.03.6302, Rel. Juiz Federal MAIRA FELIPE LOURENCO, julgado em 15/12/2023, Intimação via sistema DATA: 30/12/2023)