PROCESSO Nº: 0800275-74.2016.4.05.8504 - APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Leonardo Carvalho - 2ª Turma MAGISTRADO CONVOCADO: Desembargador(a) Federal Bianor Arruda Bezerra Neto JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal Adriana Franco Melo Machado EMENTA:ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INCLUSÃO DE FERRAMENTAS NO CAUC PARA GERENCIAR AS INFORMAÇÕES E SUSPENDER AUTOMATICAMENTE O REPASSE DE TRANSFERÊNCIAS VOLUNTÁRIAS. INEXISTÊNCIA DE DISPOSITIVO LEGAL QUE DETERMINE TAL PROVIDÊNCIA. APELAÇÃO DA UNIÃO PROVIDA. 1. Trata-se de ação civil pública, ajuizada pelo Ministério Público Federal, através da qual pretende a condenação: a) da União a (i) incluir, no sistema CAUC (Cadastro Único de Convênio) da Secretaria
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...do Tesouro Nacional (STN), ferramenta destinada a monitorar o cumprimento e a atualização das informações previstas na Lei Complementar n.º 101/2000, art. 48 e 48-A, e que devem ser publicadas nos respectivos Portais de Transparência dos entes estaduais e municipais, de modo a permitir que a suspensão das transferências voluntárias seja feita de forma automática, após regular notificação do gestor; (ii) na obrigação de formalizar termos de ajustes, convênios e outros repasses de natureza voluntária, bem como a proceder à liberação de recursos derivados de transferências voluntárias apenas mediante a devida comprovação do cumprimento do art. 48, parágrafo único, II e III, bem como do art. 48-A, ambos da Lei Complementar nº 101/2000, não suprindo a mera declaração de cumprimento por parte dos gestores estaduais e municipais; b) do Município de Itabi a regularizar as pendências encontradas no sítio eletrônico já implantado, de links que não estão disponíveis para consulta (sem registro ou arquivos corrompidos), bem como a promover a correta implantação do PORTAL DA TRANSPARÊNCIA, previsto na Lei Complementar nº 131/2009 e na Lei nº 12.527/2011, assegurando que nele estejam inseridos, e atualizados em tempo real, os dados previstos nos mencionados diplomas legais e no Decreto nº 7.185/2010 (art. 7º), inclusive mediante o atendimento de diversas providências mencionadas no item VII.1. da petição inicial. 2. A demanda foi julgada parcialmente procedente. 3. Na espécie, quanto à União, o Juízo de origem concluiu o seguinte: a) em nome da efetividade do "princípio da transparência", é dever da União aferir, através de seu próprio sistema, a regularidade dos municípios com relação aos deveres impostos pelos artigos 48 e 48-A da Lei Complementar n. 101/2000 e isso deriva diretamente das regras contidas nos artigos 8º e 9º da Lei n.º 11.945/2009, bem como do art. 23, §3º, I, e do art. 73-C, ambos da LC n,º 101/00; b) apesar da regularidade quanto à transparência, nos termos dos citados artigos 48 e 48-A poder ser aferida através do Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse do Governo Federal - SICONV, mantido pela União, é preciso que exista uma ferramenta no Serviço Auxiliar de Informações para Transferências Voluntárias - CAUC, que permita que a União anote a irregularidade, notifique o município faltoso e, imediatamente, torne indisponível qualquer transferência voluntária, interrompendo aquelas que já foram iniciadas; c) mesmo que a regularidade em comento já seja feita pelos Tribunais de Contas, a União também deve assumi-la, nos termos acima, uma vez que o art. 9º da Lei n.º 11.945/2009 fixa o prazo de 1 (um) ano para que a União se adapte às alterações legislativas das obrigações previstas na Lei de Transparência; d) essa exigência se deve ao fato de que a sanção ao descumprimento das obrigações de transparência por parte dos entes federados se dá pela suspensão das transferências voluntárias, de maneira que o objetivo é tornar mais efetivo o controle e assegurar a aplicação de possíveis sanções; e) o Acordo de Cooperação Técnica nº 04/2015, que envolve treinamento de servidores dos Tribunais de Contas dos Estados e/ou Municípios para que estes façam o registro diretamente no SICONV, o acesso às Cortes de Contas dos painéis de monitoramento e o monitoramento do desempenho da execução da ação pelos Tribunais de Contas, por si só, não é suficiente para dar por cumprido o dever constante do art. 9.º da Lei n.º 11.945/2009. 4. A União recorreu, ocasião em que alegou o seguinte: a) compete ao Ministério Público e aos Tribunais de Contas a obrigação de fiscalizar o cumprimento das normas contidas na Lei de Responsabilidade Fiscal; b) os atos referentes à celebração, execução, acompanhamento e fiscalização dos convênios, contratos de repasse e termos de parceria serão registrados no Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse - SICONV, de maneira que o Ministério Público e o Tribunal de Contas podem acompanhar todos os atos da União; c) o artigo 38, XVII, da Portaria Interministerial CGU/MF/MP 507/2011 estabelece, em conformidade com a LRF, que, para celebrar convênios, o ente convenente deve comprovar a divulgação da execução orçamentária e financeira por meio eletrônico de acesso ao público e de informações pormenorizadas relativas à receita e à despesa em atendimento ao disposto no art. 73-C da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, comprovado por meio de declaração de cumprimento, juntamente com a remessa da declaração para o respectivo Tribunal de Contas por meio de recibo do protocolo, aviso de recebimento ou carta registrada; d) essas informações, portanto, são recebidas pelos Tribunais de Contas, que alimentam o SICONV; e) há ferramenta em funcionamento no SICONV denominada "Verificação de Regularidade", para atender ao disposto nos incisos II e III do parágrafo único dos artigos 48 e 48-A da LRF; f) a União, através do Ministério do Planejamento, publicou o Comunicado 10/ 2016, alertando os concedentes acerca da obrigatoriedade de verificação da regularidade dos proponentes na funcionalidade específica disponibilizada no SICONV; g) recentemente (16.08.2016) foi firmado o Acordo de Cooperação Técnica 10/2016, subscrito também pelo Conselho Nacional do Ministério Público, que tem como objeto o desenvolvimento de ações conjuntas e apoio mútuo a atividades de interesse comum para melhorar a gestão, capacitação e fortalecimento da comunicação e transparência, relativas às transparências voluntárias. 5. Esta Turma já enfrentou a presente questão controvertida, posicionando-se no sentido de que a lei não impõe à União o dever de inserir ferramentas no CAUC para gerenciar as informações e suspender automaticamente o repasse das transferências. 6. Ademais, "a implantação de tal medida depende de criação e desenvolvimento de sistemas/ferramentas tecnológicas, que, sabe-se bem, ações dessa natureza, dada a complexidade e abrangência, demandam a utilização de grandes recursos financeiros e tempo para implantação. E, não se pode olvidar que, depois de implantado o sistema há ainda o período de testes. Nesse contexto, tem razão a União quando defende que, por mais diligentes que sejam os profissionais de Tecnologia da Informação imbuídos nesse mister, é praticamente impossível desenvolver, no prazo estipulado pela sentença (90 dias), um sistema que se comunique adequadamente com os cerca de 5.700 Municípios brasileiros e com todos os Estados da Federação. Daí a desarrazoabilidade na imposição da medida". (AC n.º 08004160520164058501, relator o Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, julgado no dia 14/12/2017) 7. Cumpre registrar que o art. 59 da Lei Complementar 101/2000 atribui ao Ministério Público, auxiliado pelos Tribunais de Contas, a responsabilidade pela fiscalização da gestão fiscal, afigurando-se descabida a pretensão de repassá-la ao ente federal. Ainda sobre este aspecto, releva salientar que a União já dispõe de ferramenta própria de controle das transferências voluntárias consistente no "Módulo de Verificação de Regularidade" do Sistema de Gestão de Convênios - SINCOV, desenvolvida justamente para atender às disposições do arts. 48 e 48-A, da Lei de Responsabilidade Fiscal. 8. Não bastasse isso, a União também firmou o Acordo de Cooperação Técnica 10/2016, subscrito inclusive pelo Conselho Nacional do Ministério Público, com ações conjuntas voltadas para melhoria da gestão, capacitação e fortalecimento da comunicação e transparência, relativas às transparências voluntárias. Assim, por melhores que sejam as intenções do Ministério Público Federal, a fim de exigir da União um controle maior dos gastos públicos pela implementação de mecanismos de transparência, os elementos dos autos demonstram que esta investe largamente contra o primado da discricionariedade que é substrato do princípio da independência entre os Poderes constituídos, implicando em forte cláusula de restrição à gestão administrativa da União. Como tal, não pode subsistir ao controle recursal a sentença que compeliu o ente federativo a agir nos termos acima relatados. 9. Nesse sentido, conferir também: AC n.º 08041324320164058500, relator o Desembargador Leonardo Carvalho, julgado no dia 18/10/2018. 10. Apelação provida, para julgar improcedentes os pedidos formulados em face da União.
(TRF-5, PROCESSO: 08002757420164058504, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL BIANOR ARRUDA BEZERRA NETO (CONVOCADO), 2ª TURMA, JULGAMENTO: 28/04/2020)