Trata-se de apelação cível interposta por Quesia Cristiane Pereira de Souza em face da sentença (id. 53406459), proferida pelo Juízo da 7ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador, que, nos autos da ação ordinária ajuizada contra o Estado da Bahia, reconheceu que o
art. 115 da
Lei Estadual n. 3.803/80 encontra-se revogado, e, com base na
Súmula 339 do STF, julgou improcedentes os pedidos e extinguiu o feito com resolução do mérito, em razão da impossibilidade jurídica do pedido, com base no
art. 487,
I, do
CPC. ...« (+1545 PALAVRAS) »
...Condenou, ainda, os sucumbentes ao pagamento das custas e de honorários advocatícios, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), ficando a exigibilidade suspensa por serem beneficiários da assistência judiciária gratuita. Em suas razões (id. 53406461), sustenta a autora/apelante que ajuizou ação originária, juntamente com outros autores, também policiais militares, pretendendo o reajuste das suas remunerações por meio de escalonamento vertical, para que fosse aplicado o critério de fixação do vencimento previsto no art. 115, da Lei Estadual n. 3.803/80, de modo que fosse tomado como base o soldo de Coronel/PM e a tabela anexa à referida Lei, bem como requerendo o reajuste da GAP no mesmo percentual daqueles conferidos aos soldos. Alega que o seu pedido é possível e a sua pretensão está amparada pelo ordenamento jurídico, com base na Lei Estadual n. 3.803/80, a qual continua em plena vigência, pois não teria ocorrido a sua revogação expressa e nem integral tratamento da matéria por lei posterior, mormente porque o escalonamento vertical está previsto na Constituição do Estado da Bahia. Aduz que o pedido não se trata de aumento salarial e sim de interpretação e aplicação do diploma legal pelo Poder Judiciário, não havendo que se falar em óbice no enunciado da Súmula 339 do STF. Afirma, ainda, que o pretendido reajuste, incidiria, também, no valor da GAP, que precisa ser atualizado, considerando a previsão contida no art. 7º da Lei n.º 7.145/97, devendo ser considerados pedidos autônomos. Por derradeiro, pugna pelo provimento do apelo, para que seja reformada a sentença, julgando procedentes os pedidos. Intimado, o Estado da Bahia não apresentou contrarrazões, conforme certidão de id. 53406822. É o relatório. Decido. Presentes os pressupostos de admissibilidade, estando a apelante dispensada do preparo, em razão da concessão da assistência judiciária gratuita no 1º grau, conheço da apelação interposta. O feito comporta julgamento monocrático, nos termos do art. 932, IV, “a” e “b”, do CPC, visto que a matéria versada neste recurso é contrária a entendimento sumulado pelo Supremo Tribunal Federal, bem como decidido em sede de Repercussão Geral, no RE 976.610 (Tema 984). O cerne da questão debatida envolve o reajuste dos soldos dos autores, com esteio no artigo 115 da Lei Estadual n. 3.803/80, que previa o escalonamento vertical desse benefício, tomando por base a graduação do Coronel PM, in verbis: Art. 115 - O valor do soldo será fixado, para cada posto ou graduação, com base no soldo do posto de Coronel PM, observados os Índices estabelecidos na Tabela de Escalonamento Vertical anexa a esta Lei. Nesse contexto, a apelante argumenta que a referida norma ainda se encontraria vigente, de modo a ser imperativo o reajustamento dos soldos nos parâmetros demonstrados. No entanto, não merece amparo a alegada validade do escalonamento previsto na Lei Estadual n. 3.803/80, pois a matéria relativa à fixação do soldo dos policiais militares foi inteiramente tratada pela posterior Lei Estadual n. 7.145/97, que instituiu, por meio de seu art. 5º, nova tabela de valores para os soldos dos Policiais Militares do Estado da Bahia, implicando na revogação da norma anterior. Ao contrário do quanto afirmado pelos demandantes, dúvidas não há quanto à revogação tácita dos dispositivos legais por eles invocados para amparar a sua pretensão, especialmente diante da previsões do §1º, do art. 2º, do Decreto-Lei n. 4.657/42 - Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro: Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. § 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. Ademais, quanto à diferenciação entre os reajustes concedidos a cada graduação dentro da carreira militar estadual, o STF consolidou seu entendimento, em sede de repercussão geral, Tema 984, no sentido de que a concessão de reajustes setoriais, com o fim de corrigir distorções remuneratórias não viola o princípio da isonomia nem o art. 37, X, in fine, da CF. REPERCUSSÃO GERAL. SERVIDORES PÚBLICOS. REESTRUTURAÇÃO DA CARREIRA DOS MILITARES DO ESTADO DA BAHIA. LEI ESTADUAL Nº 7.622/2000. CONCESSÃO DE REAJUSTES DIFERENCIADOS. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA E DO ART. 37, INC. X, DA CF/88. NÃO OCORRÊNCIA. RECONHECIMENTO DE REPERCUSSÃO GERAL E REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. (REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 976.610 BAHIA; RELATOR MINISTRO DIAS TOFOLLI; DATA DE JULGAMENTO: 15/02/2018). Com efeito, a jurisprudência deste Tribunal de Justiça consolidou-se na tese alinhada com os fundamentos aqui expostos e integralmente oposta à pretensão da recorrente: APELAÇÃO CÍVEL. REGIME REMUNERATÓRIO DOS POLICIAIS MILITARES. ESCALONAMENTO VERTICAL DA LEI ESTADUAL Nº 3.803/80. MODIFICAÇÃO SUPERVENIENTE DA FORMA DE CÁLCULO DOS SOLDOS. REVOGAÇÃO EXPRESSA DAS DISPOSIÇÕES INCOMPATÍVEIS COM O SISTEMA REMUNERATÓRIO INAUGURADO PELAS LEIS ESTADUAIS Nº.7.145/97 E Nº.7.622/2000 (ARTS. 22 E 7º). REVOGAÇÃO TÁCITA, PELA SUCESSÃO DE LEIS NO TEMPO, CONFORME §1º DO ART 2º DA LINDB E JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO TJ/BA. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO À REGIME JURÍDICO E À FORMA DE CÁLCULO DA REMUNERAÇÃO. PRECEDENTES DA SUPREMA CORTE. APELO IMPROVIDO. (TJBA, Classe: Apelação, Número do Processo: 0013612-07.2011.8.05.0001, Relator(a): REGINA HELENA RAMOS REIS, Publicado em: 30/11/2020). APELAÇÃO. DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. PROCEDIMENTO ORDINÁRIO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. IRRESIGNAÇÃO. ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO AFASTADA. POLICIAIS MILITARES. RECÁLCULO DOS SOLDOS. ESCALONAMENTO VERTICAL PREVISTO NO ART. 115 DA LEI ESTADUAL Nº. 3.803/1980. INAPLICABILIDADE. REVOGAÇÃO TÁCITA. MODIFICAÇÕES INSERIDAS PELA LEI ESTADUAL Nº 7.145/1997. AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO DO MILITAR AO REGIME REMUNERATÓRIO. GARANTIA DO SALÁRIO MÍNIMO QUE SE APLICA À REMUNERAÇÃO GLOBAL DO SERVIDOR MILITAR. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (Classe: Apelação, Número do Processo: 0006780-55.2011.8.05.0001, Relator(a): Pilar Celia Tobio de Claro, Primeira Câmara Cível, Publicado em: 14/03/2018) APELAÇÃO CÍVEL. POLICIAIS MILITARES. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO AFASTADA. ESCALONAMENTO VERTICAL. AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO DOS MILICIANOS AO REGIME REMUNERATÓRIO. MODIFICAÇÕES INSERIDAS PELA LEI 7.145/97. REVOGAÇÃO TÁCITA DO ART. 115 DA LEI 3.803/1980. SENTENÇA MANTIDA. ADVOGADOS RENUNCIARAM AO MANDATO COM RELAÇÃO A DOIS DOS APELANTES. REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL NÃO REGULARIZADA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, NÃO PROVIDO. 1. Os advogados dos apelantes Anderson Afonso Freitas dos Santos e Clécio Gonçalves dos Santos renunciaram ao mandatos que lhes foram outorgados (fls. 156 e 161) e apesar de cientificadas da renúncia, conforme preleciona o art. 112 do CPC/15, estas partes não regularizaram a representação, no prazo consignado no §2º do referido dispositivo, o que conduz ao não conhecimento do apelo com relação aos mencionados recorrentes, por ausência de pressuposto processual. 2. A demanda trata do reajuste dos valores dos soldos percebidos pelos apelantes, evidenciando prestação de trato sucessivo, de sorte a não ser aplicável a prescrição do fundo de direito, mas tão somente aquela relativa às parcelas que antecedem ao quinquênio da propositura da ação, nos termos dos artigos 1º e 3° do Decreto 29.910/32. 3. O cerne da discussão envolve a aplicação do art. 115 da Lei 3.803/80 que prevê o escalonamento vertical dos soldos de cada policial militar do Estado da Bahia, tomando por base a graduação do Coronel PM. 4. Malgrado a vigência da lei 3.803/80 no que pertine aos aspectos conceituais da remuneração na estrutura hierárquica da Polícia Militar do Estado da Bahia, não há como se restabelecer o valor do soldo nos parâmetros da tabela anexa àquela norma, diante da modificação do regime remuneratório com a vigência da lei 7.145/97. (Classe: Apelação,Número do Processo: 0081616-96.2011.8.05.0001, Relator(a): José Edivaldo Rocha Rotondano, Quinta Câmara Cível, Publicado em: 10/10/2017 ) Assim, não resta dúvida, pois, de que a Lei Estadual n. 3.803/80 foi revogada pela Lei Estadual n. 7.145/97 e seguintes, na medida em que esta traz tabela de soldos que não tem mais vinculação com a disposição constante na Lei Estadual 3.803/80, estabelecendo os soldos das diferentes graduações da PM/BA, na forma disposta no seu Anexo I, e não com base em índices proporcionais à remuneração do posto de Coronel/PM, previstos na Tabela de escalonamento. Cuida-se, portanto, de hipótese de incompatibilidade da norma posterior com a anterior, ambas de mesmo grau hierárquico. Ressalta-se, ainda, que, segundo jurisprudência pacífica do STF, inexiste direito adquirido quanto ao regime jurídico de servidores, podendo ocorrer modificação na forma de cálculo da remuneração dos mesmos, desde que não implique em diminuição do quantum percebido. Frise-se, também, que a nova tabela dos soldos da Polícia Militar reajustou os valores com índices diferenciados, tendo a patente de Cabo recebido o maior deles. Todavia, o fato do índice não ter sido único, não significa que tal percentual equivalha à revisão geral anual, que deveria ser atribuída a todas as patentes da carreira militar. Tal postulação esbarraria no teor da Súmula Vinculante 37 (antiga súmula 339, do STF), segundo o qual: “Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia”. Não reconhecido o pedido de pagamento de diferença na remuneração, fica prejudicado o pedido de extensão dos referidos percentuais de reajuste às parcelas da GAP – Gratificação de Atividade Policial e de pagamento de parcelas retroativas, visto que se tratam de pedidos subsidiários e não autônomos. Por tais razões, com fundamento no art. 932, inciso IV, alíneas “a” e "b", do
CPC, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO, para manter integralmente a sentença. Em razão do não provimento do recurso, devem ser majorados os honorários advocatícios devidos, o que faço alterando para R$ 1.100,00 (mil e cem reais), nos termos do
art. 85,
§11, do
CPC, mantida a suspensão da exigibilidade em face do deferimento da assistência judiciária gratuita. Publique-se. Intimem-se. Transitada em julgado, após as cautelas de praxe, dê-se baixa. Salvador, 09 de janeiro de 2024. DESA. SILVIA CARNEIRO SANTOS ZARIF RELATORA A4
(TJ-BA, Classe: Apelação, Número do Processo: 0557350-80.2014.8.05.0001, Órgão julgador: PRIMEIRA CAMARA CÍVEL, Relator(a): SILVIA CARNEIRO SANTOS ZARIF, Publicado em: 15/01/2024)