O posicionamento majoritário na doutrina e na jurisprudência sempre foi pautado na impenhorabilidade absoluta do salário, soldos, vencimento, dentre outros nos casos em que não envolvia crédito alimentar. Nesse sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. SALÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. Não sendo objeto da execução crédito de prestação alimentícia, é impenhorável o salário do executado. (TRF-4 - AG: 50108106720184040000 5010810-67.2018.4.04.0000, Relator: RÔMULO PIZZOLATTI, Data de Julgamento: 07/05/2019, SEGUNDA TURMA)
Mas uma decisão do STJ iniciou uma longa mudança de posicionamento, que na relatoria do Ministro RAUL ARAÚJO, entendeu que com a exclusão do termo "absolutamente impenhoráveis" no Novo CPC, a impenhorabilidade do salário passa a ser relativa, podendo ser mitigada no caso concreto:
Veja teor da decisão:
"Ocorre que o novo Código de Processo Civil, em seu art. 833, deu à matéria da impenhorabilidade tratamento um tanto diferente em relação ao Código anterior, no art. 649. O que antes era tido como "absolutamente impenhorável", no novo regramento passa a ser "impenhorável", permitindo, assim, essa nova disciplina maior espaço para o aplicador da norma promover mitigações em relação aos casos que examina, respeitada sempre a essência da norma protetiva. Precedente: EREsp 1.582.475/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/10/2018, REPDJe 19/03/2019, DJe de 16/10/2018. 3. Agravo interno parcialmente provido para modificar a decisão agravada e, em novo exame do recurso, dar parcial provimento ao recurso especial, no sentido de afastar a conclusão acerca da impenhorabilidade absoluta da remuneração, determinando o retorno dos autos à origem, para que o Tribunal local prossiga no julgamento do feito, como entender de direito." (AgInt nos EDcl no REsp 1676013/DF, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 11/06/2019, DJe 26/06/2019)
Nesse mesmo sentido, a Corte do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos EREsp 1.582.475/MG, firmou o entendimento de que a regra geral de impenhorabilidade de vencimentos pode ser excepcionada a fim de garantir a efetividade da tutela jurisdicional do crédito, desde que observado percentual suficiente de assegurar a dignidade do devedor e de sua família.
Em outros termos, a impenhorabilidade do salário, presente na posição jurisprudencial majoritária, passa a ser mitigada quando presente fundamentos relevantes a evidenciar a capacidade financeira do devedor, a suprir sua dívida sem comprometer a dignidade da pessoa humana.
Nesse sentido, as decisões passaram a prever a impenhorabilidade dos salários como relativa:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA DE PERCENTUAL DE SALÁRIO. IMPENHORABILIDADE RELATIVA. POSSIBILIDADE DE MITIGAÇÃO. TEORIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE SALÁRIO PASSÍVEL DE CONSTRIÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de penhora de até 10% do salário do executado, nos autos da execução fiscal ajuizada para cobrança de anuidades e multa de eleição. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em verificar a possibilidade de penhora de percentual de até 10% do salário do executado para satisfação do crédito do exequente, à luz da jurisprudência que admite a relativização da impenhorabilidade de verbas salariais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O artigo 833, IV, do CPC estabelece a impenhorabilidade de salários, salvo para pagamento de prestação alimentícia ou quando ultrapassado o limite de 50 salários mínimos mensais. 4. A jurisprudência do STJ admite a relativização da impenhorabilidade salarial em caráter excepcional, desde que não comprometa a subsistência digna do devedor e de sua família, aplicando-se a Teoria do Mínimo Existencial. 5. A penhora de parte dos rendimentos do executado só é admissível quando demonstrada a existência de salário ou proventos passíveis de constrição, observada a razoabilidade e proporcionalidade da medida. 6. No caso concreto, os documentos fiscais do executado indicam que ele não possui salário fixo, tendo declarado apenas R$ 6,13 como rendimentos tributáveis no exercício de 2023, o que torna a medida constritiva inócua. 7. Além disso, a alegação do exequente de que o devedor possui renda anual superior a R$ 70.000,00 não encontra respaldo nos documentos constantes nos autos. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Agravo de instrumento desprovido. 9. Tese de julgamento: a) A impenhorabilidade salarial prevista no artigo 833, IV, do CPC é relativa e pode ser mitigada, em caráter excepcional, desde que não comprometa a subsistência digna do devedor e de sua família; e, b) A penhora de percentual de salário exige prova da existência de rendimentos passíveis de constrição, não sendo admitida quando os documentos fiscais indicam a inexistência de salário fixo ou de renda suficiente para garantir a satisfação do crédito exequendo. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, art. 833, IV e §2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 1582475/MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 16/10/2018; STJ, AgInt no REsp 2064504, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 13/09/2023; STJ, EREsp 1.874.222/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe 24/05/2023; STJ, AgInt no REsp n. 2.021.507/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 29.3.2023; STJ, AgInt no AREsp n. 1.969.114/RS, Rela. Mina. Maria Isabel Gallotti, DJe 16.12.2022; TRF2, AG 5003001-41.2022.4.02.0000, Rel. Juíza Fed. Sandra Meirim Chalu Barbosa de Campos, DJe 18/05/2023; TRF2, AI 5005563-23.2022.4.02.0000, Rel. Des. Fed. Ricardo Perlingeiro, julg. em 22.6.2022; TRF2, AG5004295-65.2021.4.02.0000, Rel. Des. Fed. Marcelo Pereira da Silva, Dje 22/07/2021. DECISAO: Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. (TRF2 , Agravo de Instrumento, 5014094-30.2024.4.02.0000, Rel. MAURO SOUZA MARQUES DA COSTA BRAGA , 5ª TURMA ESPECIALIZADA , Rel. do Acordao - MAURO SOUZA MARQUES DA COSTA BRAGA, julgado em 24/03/2025, DJe 02/04/2025)
Sobre o tema, veja Modelo de Execução Forçada nos casos em que houve o esgotamento de medidas.
O desafio neste caso é como comprovar as condições financeiras do devedor. Sobre o tema, vale utilizar as informações das redes sociais, conforme já discorremos no artigo sobre a influência das redes sociais no deferimento da Justiça Gratuita.
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