FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL. RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO. BASE DE CÁLCULO DO ITCMD - DIVERGÊNCIA ENTRE AVALIAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA E AVALIAÇÃO DO ESPÓLIO. AVALIAÇÃO JUDICIAL REALIZADA NOS AUTOS. OBSERVÂNCIA. 1. Insurge-se a parte ré, ora recorrente, em face de sentença que jugou pela parcial procedência dos pedidos inaugurais, para reconhecer o valor venal do imóvel no valor de R$ 153.600,00, referente ao ano de 2015, bem como, condenar o réu na restituição da quantia de R$ 26.847,84 pago a mais a título de ITCD. Em suas razões, o ente público assevera a legalidade da base de cálculo do imposto, ITCMD ser o valor de mercado do bem, de acordo com a avaliação do Fisco Estadual, o qual o avaliou na quantia de R$ 850,000,00. Diz que em conformidade com o artigo 77
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...da Lei nº 11.651/91, a base de cálculo do ITCD é o valor de mercado do bem. Assevera que a correção monetária deve se dar de acordo com a EC 113/2021, com base na Selic. Pugna pelo conhecimento e provimento de seu recurso para reformar a sentença de primeiro grau e julgar improcedentes os pedidos inaugurais. 2. No caso aventado nos autos, os autores afirmam que são herdeiros de Osmar Mendes de Paula, o qual faleceu em 25/08/2015. Contam que, posteriormente ao falecimento, seu genitor teve reconhecimento em seu favor, por sentença, de usucapião de imóvel situado no município de Anhanguera-GO. Discorreram que fora realizado envio de declaração do ITCD, sendo que a Fazenda Pública avaliou o referido imóvel na quantia de R$ 850.000,00 para fins da base de cálculo do tributo, com alíquota de 3%, resultando no valor de R$ 25.500,00, os quais restaram pagos. Prosseguiram discorrendo que houve equívoco na análise da base de cálculo pela Fazenda Pública, a qual não observou o valor venal do imóvel referente ao ano de 2019, o qual perfazia a quantia de R$ 153.600,00. Alegando direito à restituição do indébito do tributo pago a mais, ajuizaram a presente demanda. 3. Cuida-se de ação ordinária por meio da qual o autor objetiva provimento judicial para que lhe seja assegurado o direito à restituição do valor excedente pago a título de ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos), nos termos do disposto na Lei Estadual 11.651/1991 (Código Tributário do Estado de Goiás). 4. A Lei Estadual nº 11.651, de 26.12.1991, que instituiu o ITCMD no Estado de Goiás (com redação dada pela Lei n. 18.002 de 30.04.2013), assim define a respectiva base de cálculo: Art. 77º. A base de cálculo do ITCD é o valor de mercado do bem ou direito transmitido por causa mortis ou por doação. § 1º ? O valor de mercado é apurado mediante avaliação judicial ou avaliação procedida pela Fazenda Pública Estadual e expresso em moeda nacional na data da declaração ou da avaliação. § 2º ? A base de cálculo do ITCD deve ser submetida à homologação, considerando-se homologada com a aprovação, pela Fazenda Pública Estadual, do valor de mercado do bem ou direito transmitido. § 3º ? Havendo discordância quanto ao valor da avaliação para fim de base de cálculo o sujeito passivo pode apresentar reclamação ao órgão competente. § 4º ? Na falta da entrega da Declaração do ITCD Doação no prazo legal e não havendo elementos para avaliar bens e direitos na data do fato gerador, a Fazenda Pública Estadual pode realizar avaliação e mediante método de ajuste de valor, encontrar a base de cálculo naquela data. § 5º ? Havendo discordância por parte da Administração Tributária quanto ao valor atribuído aos bens e direitos pelo sujeito passivo, cabe à Fazenda Pública Estadual realizar avaliação e sendo constatada diferença positiva entre o valor da avaliação e o valor atribuído, deve efetuar o lançamento do valor relativo à diferença verificada. 5. Na trilha do artigo 155, I, e § 1º, Constituição Federal, e do artigo 38, Código Tributário Nacional ? CTN, o artigo 77 do Código Tributário do Estado de Goiás, na redação da Lei estadual nº 13.772/2001, vigente de 01/01/2001 a 02/08/2013, definia como base de cálculo do imposto de transmissão causa mortis e doação ? ITCMD o valor venal do bem e do direito a ele relativo, do título ou do crédito transmitido ou doado. Na redação atualmente vigente, conferida pela Lei estadual nº 18.002/2013, constitui a base de cálculo o valor de mercado do bem ou direito transmitido por causa mortis ou por doação. 6. Como se vê da sucessão legal, a Lei estadual nº 18.002/2013 modificou a base de cálculo do imposto, antes estabelecida sobre o valor venal e, depois, sobre o valor de mercado. Nesse contexto, há de se considerar que o valor a ser observado é o valor de mercado, na redação da Lei 18.002/2013, vigente na data do fato gerador do tributo (abertura da sucessão legítima - 25/08/2015). A conclusão ancora-se na Súmula n º 112, Supremo Tribunal Federal, segundo a qual o imposto de transmissão causa mortis é devido pela alíquota vigente ao tempo da abertura da sucessão. 7. Dito isso, importa reverberar que os autores da demanda buscam a repetição do indébito tributário, sob enfoque de que pagaram valor equivocado de ITCMD em razão de sucessão, eis que a avaliação do imóvel realizada pela Fazenda Pública, observou valor muito superior ao venal, eis que conforme Resumo de Declaração fornecido pela Secretaria de Estado da Economia, a área(Bem/Direito/Dívida) possuía valor de R$ 153.600,00 (ev. 01, arquivo 5), e o Demonstrativo de Cálculo do ITCD Doação, analisado como Excedente de Quinhão, fornecido pela Superintendência de Controle e Fiscalização da Fazenda Pública, avaliou o imóvel na quantia de R$ 850.000,00 (oitocentos e cinquenta mil reais). 8. Nesse passo, há de se constituir entendimento acerca da avaliação do bem, necessária para a definição do valor venal ou de mercado que constituirá a base de cálculo do tributo. A lei estadual adotou como procedimento que o valor de mercado será ?apurado mediante avaliação judicial ou avaliação procedida pela Fazenda Pública Estadual e expresso em moeda nacional na data da declaração ou da avaliação.?. 9. Por conseguinte, reside a controvérsia em aferir se é cabível a avaliação judicial do imóvel, para cálculo do ITCMD. 10. Com efeito, nota-se dos autos que o juízo diligenciou no sentido de realizar avaliação judicial da área, em 15/10/2022, a qual avaliou-a pelo valor de R$ 165.000,00 (cento e sessenta e cinco mil reais), conforme visto de evento de nº 108 dos autos. A avaliação realizada pelo FISCO, para fins do cálculo do ITCD, na quantia de R$ 850.000,00, superou em muito as duas outras avaliações constantes dos autos, quais sejam, aquela contida na Declaração de ITCD (R$ 153.600,00) e a realizada judicialmente, de modo que a avaliação judicial apresenta-se como a medida mais razoável para dirimir o impasse, eis que bem aproximada àquela constante da Declaração do ITCD. 11. No caso, em que pese a Fazenda Pública não concorde com a avaliação judicial, é forçoso reconhecer que o Código de Processo Civil apenas dispensa a avaliação judicial, se a Fazenda concordar com o valor atribuído aos bens do espólio nas primeiras declarações, ou se os herdeiros concordarem com o valor dos bens declarados pela Fazenda Pública. Vejamos: Art. 1.007. Sendo capazes todas as partes, não se procederá à avaliação, se a Fazenda Pública, intimada na forma do art. 237, I, concordar expressamente com o valor atribuído, nas primeiras declarações, aos bens do espólio. Art. 1.008. Se os herdeiros concordarem com o valor dos bens declarados pela Fazenda Pública, a avaliação cingir-se-á aos demais. Art. 1.012. Ouvidas as partes sobre as últimas declarações no prazo comum de 10 (dez) dias, proceder-se-á ao cálculo do imposto. Art. 1.013. Feito o cálculo, sobre ele serão ouvidas todas as partes no prazo comum de 5 (cinco) dias, que correrá em cartório e, em seguida, a Fazenda Pública. § 1º Se houver impugnação julgada procedente, ordenará o juiz novamente a remessa dos autos ao contador, determinando as alterações que devam ser feitas no cálculo. § 2º Cumprido o despacho, o juiz julgará o cálculo do imposto. 12. Portanto, subtende-se de todo o arrazoado que não há como modificar a sentença a quo, que determinou a restituição da quantia de R$ 26.847,84 à parte autora, paga a mais, com base no valor venal do bem (R$ 153.600,00), para incidência do cálculo do imposto ITCMD. Frisa-se a Fazenda Pública, embora alegue, não demonstrou nos autos que a mesma tenha sido realizada de frma adequada, ou seja, que fora elaborada por auditores-fiscais do Estado, com explicação detalhada sobre as circunstâncias que embasaram a formação da base de cálculo do ITCD. É importante constatar que a mesma destoa em muito com aquela realizada pelo juízo (Oficial de Justiça Avaliador) e a declarada pelos herdeiros, não se obtendo dos autos qualquer justificativa do Fisco na gritante disparidade desses valores apurados. 13. Os Tribunais Pátrios assim tem compreendido: EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - DIREITO DAS SUCESSÕES - INVENTÁRIO - HERDEIRA INCAPAZ À ÉPOCA DE ABERTURA DO INVENTÁRIO - ART. 633 DO CPC - AVALIAÇÃO REQUERIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO - VALOR DE BEM IMÓVEL INVENTARIADO - BASE DE CÁLCULO DO ITCD - DIVERGÊNCIA ENTRE OS VALORES ATRIBUÍDOS AO BEM PELA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL E AVALIADOR JUDICIAL - PREVALÊNCIA DO VALOR INDICADO PELA PERÍCIA JUDICIAL - AUTO FUNDAMENTADO Nos termos do art. 633 do CPC, havendo herdeiro incapaz ao tempo de abertura do inventário, deve se proceder à avaliação dos bens a ser inventariados. Compete ao juízo do inventário definir o valor do bem inventariado, base de cálculo do ITCD, quando houver divergência entre aqueles apresentados, nos termos dos artigos 633 a 638 do CPC. Havendo divergência entre o valor arbitrado pelo Oficial de Justiça Avaliador e o fixado pelo Fisco Estadual deve prevalecer como base de cálculo do ITCD o valor indicado por aquele, uma vez que se trata de avaliação fundamentada, ao contrário da realizada pelo Estado. Recurso conhecido e não provido. (TJ-MG - AI: 10000220404214001 MG, Relator: Paulo Rogério de Souza Abrantes (JD Convocado), Data de Julgamento: 09/06/2022, Câmaras Especializadas Cíveis / 8ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 27/06/2022). EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INVENTÁRIO. IMPUGNAÇÃO AO LAUDO DE AVALIAÇÃO OFICIAL. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE NÃO ILIDIDA. 1. O agravo de instrumento é um recurso secundum eventus litis, o que implica que o Órgão revisor está jungido a analisar, tão somente, o acerto ou desacerto da decisão impugnada, sendo-lhe vedado incursionar nas questões relativas ao mérito da demanda originária. 2. O laudo de avaliação elaborado por Perito Oficial goza de presunção relativa de veracidade, podendo apenas ser ilidido por robusta prova em contrário, capaz de infirmar as conclusões nele estabelecidas, o que não se verifica, na hipótese. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E DESPROVIDO. DECISÃO MANTIDA. (TJGO, Autos nº 5289299.29, 5ª Câmara Cível, Desembargador Relator Olavo Junqueira de Andrade, publicado em 08/10/2019). 14. Ressalva-se ainda, que quanto a inexistência de procedimento administrativo para apuração do ITCD, previsto na legislação estadual, não há obrigatoriedade de esgotamento da instância administrativa para que a parte possa provocar o Judiciário, em observância ao princípio da Inafastabilidade do Poder Judiciário, expresso no
art. 5º,
XXXV da
CF. 15. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Sentença de primeiro grau mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos.
(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Recurso Inominado Cível 5239802-21.2022.8.09.0039, Rel. Héber Carlos de Oliveira, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 12/06/2023, DJe de 12/06/2023)