RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. AÇÃO DE CONCESSÃO DE AUXÍLIO MORADIA. RESIDÊNCIA MULTIPROFISSIONAL. FONOAUDIOLOGIA. REGULAMENTAÇÃO PELA
LEI N° 11.129/2005. INCIDÊNCIA DA
LEI 6.932/1981. AUXÍLIO-MORADIA INDEVIDO. SÚMULA N° 77 DA TUJ. BENEFÍCIO PREVISTO EXPRESSAMENTE PARA OS RESIDENTES MÉDICOS. AUSÊNCIA DE LEI ESPECÍFICA.
SÚMULA VINCULANTE 37 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PORTARIA INTERMINISTERIAL MEC/MS Nº 7/2021. ÔNUS DA PROVA. FATO CONSTITUTIVO
... +1470 PALAVRAS
...DO DIREITO. PAGAMENTO INDEVIDO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. HISTÓRICO 1.1 Cuida-se de ação de concessão de auxílio moradia ao residente, proposta por Anny Priscilla Silva Ribeiro, ora Recorrente, em desfavor do Estado de Goiás, ora Recorrido. 1.2 A parte autora narrou ser fonoaudióloga, integrando o Programa de Residência Médica e Multiprofissional em saúde do Hospital de Urgências de Goiânia Dr. Valdemiro Cruz - HUGO, na especialidade de ?Concentração em Urgência e Trauma?, cujo início deu-se em 01/03/2018 e término em 29/02/2020. 1.3 Ressaltou que o Hospital Escola (HUGO) não possui qualquer alojamento disponível para os seus residentes e nunca forneceu valor pecuniário correspondente. Assim, requereu a conversão em pecúnia do auxílio moradia. 1.4 Em sede de contestação (evento 8), a parte ré requereu a improcedência dos pedidos alegando que a residência multiprofissional em saúde é regulamentada pela Lei 11.129/2005, que não atribuiu direito a auxílio-moradia a residente multiprofissional em saúde. Logo, é vedado ao Poder Judiciário estender direito indenizatório sem prévia autorização legal. 1.5 A sentença (evento 14) julgou improcedente o pedido inicial, entendendo que o auxílio-moradia previsto no art. 4° da Lei n° 6.932/81 é limitado aos médicos residentes, não havendo que se falar em extensão a outros profissionais, mesmo que atuem na área de saúde, vez que são regidos, de maneira específica, pela Lei n° 11.129/05. 1.6 Irresignada, a parte autora interpôs recurso (evento 18), requerendo a reforma da sentença, sob os seguintes argumentos: a) a alegação de ausência de previsão legal para a concessão de auxílio moradia não merece prosperar, pois a Residência Multiprofissional é regulamentada pela Lei n° 11.129, de 30 de junho de 2005, que possui total isonomia nos quesitos de responsabilidade e valores com a Residência Médica, instituída pela Lei nº 6.932/1981, alterada pela Lei nº 12.514/2011; b) o oferecimento de moradia à profissional residente está assegurado por opção legislativa, carecendo apenas de regulamentação, não sendo admitido que a parte recorrente seja prejudicada pela inércia do Poder Público. 1.7 A parte recorrida não apresentou contrarrazões (evento 29). 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 Em análise detida ao caso em apreço, observa-se que a parte autora é fonoaudióloga e foi residente multiprofissional na área de ?Concentração em Urgência e Trauma? junto ao Hospital de Urgências de Goiânia Dr. Valdemiro Cruz - HUGO, iniciando a especialização em 01/03/2019 com término em 29/02/2020 (evento 1, arquivo 6). 2.2 A parte recorrente afirma que a Residência Multiprofissional é regulamentada pela lei n° 11.129/2005, prevendo isonomia com os programas de residência médica, a qual é instituída pela Lei n.º 6.982/91, que por sua vez estabelece a concessão do benefício de auxílio-moradia aos médicos residentes, razão que aduz ser devido o pagamento do referido benefício ao seu favor. 2.3. Nesses termos, pertinente esclarecer que o art. 13 da Lei n° 11.129/2005 assim dispõe: ?Art. 13. Fica instituída a Residência em Área Profissional da Saúde, definida como modalidade de ensino de pós-graduação lato sensu, voltada para a educação em serviço e destinada às categorias profissionais que integram a área de saúde, excetuada a médica. § 1º A Residência a que se refere o caput deste artigo constitui-se em um programa de cooperação intersetorial para favorecer a inserção qualificada dos jovens profissionais da saúde no mercado de trabalho, particularmente em áreas prioritárias do Sistema Único de Saúde. § 2º A Residência a que se refere o caput deste artigo será desenvolvida em regime de dedicação exclusiva e realizada sob supervisão docente-assistencial, de responsabilidade conjunta dos setores da educação e da saúde.? 2.4 Não obstante, o art. 15 da referida Lei menciona: ?Art. 15. É instituído o Programa de Bolsas para a Educação pelo Trabalho, destinado aos estudantes de educação superior, prioritariamente com idade inferior a 29 (vinte e nove) anos, e aos trabalhadores da área da saúde, visando à vivência, ao estágio da área da saúde, à educação profissional técnica de nível médio, ao aperfeiçoamento e à especialização em área profissional, como estratégias para o provimento e a fixação de profissionais em programas, projetos, ações e atividades e em regiões prioritárias para o Sistema Único de Saúde.? 2.5 Por sua vez, o art. 16 da Lei n° 11.129/2005 preleciona que as bolsas relativas às modalidades de Residência Multiprofissional terão valor semelhante ao devido aos Residentes Médicos. Vejamos: ?Art. 16. As bolsas objeto do Programa instituído pelo art. 15 desta Lei serão concedidas nas seguintes modalidades: I - Iniciação ao Trabalho; II - Residente; III - Preceptor; IV - Tutor; V - Orientador de Serviço; e VI ? Trabalhador-Estudante. § 1º As bolsas relativas às modalidades referidas nos incisos I e II do caput deste artigo terão, respectivamente, valores isonômicos aos praticados para a iniciação científica no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq e para a residência médica, permitida a majoração desses valores de acordo com critérios técnicos relativos à dificuldade de acesso e locomoção ou provimento e fixação dos profissionais.? 2.6 Nesse sentido, inobstante a legislação disponha acerca da aplicação da isonomia, referente aos valores concernentes a bolsa para a residência médica, constata-se que não há previsão legal expressa no sentido de conceder outra vantagem pecuniária, notadamente o auxílio-moradia, objeto da insurgência recursal. 2.7 Conforme súmula n° 77 da Turma de Uniformização do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, in verbis: ?não tem direito a auxílio-moradia previsto na Lei n°12.514/2011 os residentes multiprofissionais regulados pela Lei n° 11.129/2005. 2.8 Assim, inexistindo previsão legal acerca de benefício similar àquele previsto para os médicos residentes, não cabe ao Poder Judiciário conceder a benesse pleiteada, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos poderes. 2.9 Ademais, destaca-se o enunciado da Súmula Vinculante 37 do Supremo Tribunal Federal: ?Não cabe ao poder judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia.?, cuja razão de ser é semelhante ao presente caso. 2.10 Noutro tanto, importa mencionar que o art. 18 da Portaria Interministerial MEC/MS nº 7, de 16 de setembro de 2021, a qual dispõe sobre a estrutura, a organização e o funcionamento da Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde, assim dispôs: ?Art. 1º A Residência Multiprofissional em Saúde e a Residência em Área Profissional da Saúde constituem modalidade de ensino de pós-graduação lato sensu, sob a forma de curso de especialização, caracterizado por ensino em serviço, de responsabilidade conjunta dos setores da educação e da saúde, com carga horária de 60 (sessenta) horas semanais e duração mínima de dois anos, em regime de dedicação exclusiva. § 1º O disposto nesta Portaria abrange os egressos das seguintes áreas de formação na graduação: Biomedicina, Ciências Biológicas, Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Medicina Veterinária, Nutrição, Odontologia, Psicologia, Serviço Social, Terapia Ocupacional, Saúde Coletiva e Física Médica.? 2.11 O art. 18 da mencionada Portaria instituiu bolsas para Residências Multiprofissionais da Saúde e estabelece que estas são normatizadas por meio de editais específicos. Vejamos: ?Art. 18. Institui-se o Programa Nacional de Bolsas para Residências Multiprofissionais e em Área Profissional da Saúde, a ser normatizado por meio de editais específicos.? 2.12 In casu, não constam nos autos em comento provas produzidas pela parte recorrente no intuito de comprovar a existência de editais específicos que normatizem ou qualquer ato administrativo que reconhece e defere o pedido ao auxílio-moradia. 2.13 Convém rememorar que pela regra inserta no art. 373, no inciso I, do Código de Processo Civil, o ônus da prova quanto ao fato constitutivo de seu direito é atribuído ao autor, in verbis: ?Artigo 373. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; (?)? 2.14 Desta feita, in casu, a parte autora não se desincumbiu do ônus de provar fato constitutivo do seu direito, razão pela qual não faz jus ao recebimento do auxílio-moradia. Logo, a sentença de origem não merece reparos. 2.15 PRECEDENTE TJGO: 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais ? RI 5076772-31, Relator: Héber Carlos de Oliveira, Data do julgamento: 06/06/2023; 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais ? RI 5050692.30, Relatora: Mônica Cezar Moreno Senhorelo, Data do julgamento: 11/05/2023; 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais ? RI 5216415-04, Relator: Neiva Borges, Data do julgamento: 14/07/2023. 3. CONCLUSÃO 3.1 RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Sentença mantida por estes e seus próprios fundamentos. 3.2 Parte recorrente condenada ao pagamento de custas e dos honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da causa (art. 55 da Lei n. 9.099/95). Obrigações suspensas em razão da concessão da assistência judiciária, nos termos do art. 98, § 3º, do
CPC. 3.3 Advirta-se que, se opostos embargos de declaração com caráter protelatório, será aplicada multa com fulcro no
art. 1.026,
§ 2º do
Código de Processo Civil, ou se houver nítido propósito de rediscutir o mérito da controvérsia.
(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Recurso Inominado Cível 5206975-81.2023.8.09.0051, Rel. Mateus Milhomem de Sousa, Goiânia - UPJ Juizados da Fazenda Pública: 1º, 2º, 3º e 4º (1º Núcleo da Justiça 4.0 Permanente), julgado em 05/02/2024, DJe de 05/02/2024)