Decisão: Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, proposta pela REDE Sustentabilidade, em face da
Medida Provisória 896, de 2019, por ofensa aos
artigos 5º,
IV,
IX e
XIV;
22,
XXVII;
37,
XXI;
62;
173 ...« (+631 PALAVRAS) »
...e 220, todos da Constituição Federal, bem
como por afronta ao art. 13 da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos.
Em síntese, a Medida Provisória alterou as Leis 8.666/93 (Lei das Licitações), 10.520/02 (Lei do Pregão), 11.079/04 (Lei das PPPs) e 12.462/11 (Lei do RDC), para dispensar a obrigatoriedade de publicação de atos administrativos em jornais diários de
grande circulação, passando a exigir apenas a publicação em diário oficial ou sítio eletrônico oficial do respectivo ente, facultando aos Estados e aos Municípios utilizarem o sítio eletrônico da União.
Entende a requerente que, na linha do que foi determinado pela edição da Medida Provisória 892 (que dispensou a publicação dos balanços em jornais), o Poder Executivo, na verdade, objetiva desestabilizar uma imprensa livre e impedir a manutenção de
critérios basilares de transparência e ampla participação no âmbito das licitações.
Informa que, na exposição de motivos, o Governo afirma que a obrigatoriedade de publicação de atos administrativos em jornais de grande circulação vem se mostrando, cada vez mais, inapta para garantir a publicidade dos atos governamentais,
tratando-se de obrigação obsoleta, e que a continuidade da obrigação legal representa um gasto adicional e injustificado aos cofres públicos.
A requerente ainda relaciona diversas situações em que o Presidente da República dirigiu ataques a Grupos de Comunicação, como Grupo Globo e programa Jornal Nacional, demonstrando seu descontentamento com a imprensa, e que, quando da publicação da
MP 892/2019, teria dito Eu espero que o Valor Econômico sobreviva à medida provisória de ontem.
Alega ausência dos requisitos de relevância e urgência a justificar a edição de Medida Provisória sobre a matéria. Traz como argumento, inclusive, que o Plenário da Câmara dos Deputados iniciou discussão e votação do PL 1.292/95, que teve origem no
PLS 163/95, do Senado Federal, e trata da nova lei de licitação, prevendo a publicação dos editais no Portal Nacional de Contratações Públicas, a ser criado.
Sustenta que a imposição de que os entes publiquem as licitações em sítio eletrônico oficial não foi precedida de discussão, de modo a trazer insegurança jurídica para sua implementação, de tal forma que um Estado poderá publicar no sítio oficial da
secretaria da fazenda e outro Estado no sítio oficial da secretaria de transparência, trazendo consequências para o princípio da ampla concorrência.
Defende que a atividade de publicidade em jornais é uma atividade econômica, não podendo o Estado transpor parcela importante dessa atividade econômica da iniciativa privada para os entes públicos por meio de seus sítios oficiais.
Também argumenta que a medida implica violação ao direito à informação, à transparência e à ampla concorrência nas licitações e que o princípio da publicidade tem a finalidade de impedir o ocultamento aos administrados dos assuntos que a todos
interessam.
Sustenta que a exigência de publicação de atos da administração que onerem o patrimônio público é inerente ao Estado Democrático de Direito.
Assevera que o direito à informação, como substrato da transparência, impõe ao Estado que oportunize da forma mais ampla o recebimento das mensagens pelos potenciais participantes de uma licitação.
Cita, como base do direito fundamental à informação o art. XIX da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o art. 19 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos; arts. 10 e 13 da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção; art. 13 do
Pacto de São José da Costa Rica; e item 4 da Declaração Interamericana de Princípios de Liberdade de Expressão. Alega que a garantia do direito à informação é importante no combate à corrupção.
Define a medida adotada pela MP 896 como um ato de retaliação do Presidente da República contra a liberdade de imprensa, que tem importante papel no controle dos atos estatais. Alega que a MP foi usada com desvio de finalidade e constitui ato de
abuso de poder.
Requer a concessão de medida cautelar com a finalidade de suspender os efeitos da Medida Provisória 896, de 2019.
A Associação Nacional de Jornais (ANJ), por meio da Petição 58.457/2019 (eDOC 12), requereu seu ingresso no feito na condição de amicus curiae.
Deferi o pedido da ANJ e requisitei informações e manifestações da AGU e da PGR (eDOC 27).
Em 3 de outubro de 2019, por meio da Petição 60.981/2019 (eDOC 29), a ANJ reiterou o pedido de medida cautelar formulado na inicial, a fim de que seja suspensa a eficácia da norma impugnada até o julgamento final da ação. Informa que a Medida
Provisória 896/2019 já está afetando o segmento de veículos de comunicação impressos, com o fechamento de jornais municipais.
A Presidência da República encaminhou as informações elaboradas pela Advocacia-Geral da União (eDOC 35).
É o relatório.
(STF, ADI 6229 MC, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Decisão Monocrática, Julgado em: 18/10/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-229 DIVULG 21/10/2019 PUBLIC 22/10/2019)