PROCESSO Nº: 0807196-58.2020.4.05.8100 - APELAÇÃO CÍVEL
APELANTE: AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - ANVISA
APELADO: ESTADO DO CEARÁ
RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Cid Marconi Gurgel de Souza - 3ª Turma
MAGISTRADO CONVOCADO: Desembargador(a) Federal Arnaldo Pereira De Andrade Segundo
JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal Luis Praxedes Vieira Da Silva EMENTA
TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO. RESPIRADORES MECÂNICOS. COVID-19. ESTADO DO CEARÁ. DECLARAÇÃO DO DETENTOR DA REGULARIZAÇÃO DO PRODUTO - DDR. PRODUTO REGISTRADO NA ANVISA NO MOMENTO DO PEDIDO DE IMPORTAÇÃO. EXIGÊNCIA LEGAL. APRESENTAÇÃO.
1. Apelação interposta pela ANVISA em face de sentença que julgou procedente o pedido para, confirmando a tutela de urgência deferida, declarar
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...a inexigibilidade de apresentação das DDR's - Declarações do Detentor da Regularização do Produto atinentes aos respiradores mecânicos, com determinação subsequente de que a ANVISA emita as respectivas licenças de Importação referentes aos mencionados equipamentos. A Autarquia Ré foi condenada no pagamento de honorários sucumbenciais fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais). 2. Sobre a permissão para aquisição de ventiladores pulmonares essenciais ao combate da COVID-19, mesmo aqueles ainda não regularizados perante a ANVISA, quando não disponíveis no comércio outros produtos semelhantes com registro perante essa Autarquia, a sentença foi bastante esclarecedora, de forma que adota-se como razões de decidir esse trecho, tendo em vista que o Supremo Tribunal Federal já firmou posicionamento de que a motivação referenciada "per relationem" não constitui negativa de prestação jurisdicional, tendo-se por cumprida a exigência constitucional da fundamentação das decisões judiciais (HC 160088 AgR, Relator: Min. Celso de Mello, Segunda Turma, julgado em 29/03/2019, Processo Eletrônico DJe-072, Public 09-04-2019 e AI 855829 AgR, Relator: Min. Rosa Weber, Primeira Turma, julgado em 20/11/2012, Public 10-12-2012. 3. "Com o objetivo de disciplinar medidas institucionais destinadas ao enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 13.979, de 06 de fevereiro de 2020, que, com as modificações introduzidas pela Lei nº 14.006, de 28 de maio de 2020, enuncia, no art. 3º, inciso VIII, o seguinte: Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as seguintes medidas: (Redação dada pela Medida Provisória nº 926, de 2020) [...] VIII - autorização excepcional e temporária para a importação de produtos sujeitos à vigilância sanitária sem registro na Anvisa, desde que: VIII - autorização excepcional e temporária para a importação e distribuição de quaisquer materiais, medicamentos, equipamentos e insumos da área de saúde sujeitos à vigilância sanitária sem registro na Anvisa considerados essenciais para auxiliar no combate à pandemia do coronavírus, desde que: (Redação dada pela Lei nº 14.006, de 2020) a) registrados por autoridade sanitária estrangeira; e a) registrados por pelo menos 1 (uma) das seguintes autoridades sanitárias estrangeiras e autorizados à distribuição comercial em seus respectivos países: (Redação dada pela Lei nº 14.006, de 2020) 1. Food and Drug Administration (FDA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020) 2. European Medicines Agency (EMA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020) 3. Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020) 4. National Medical Products Administration (NMPA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020) b) previstos em ato do Ministério da Saúde. b) (revogada). (Redação dada pela Lei nº 14.006, de 2020). 4. "Nesses termos, o art. 3º, VIII, da Lei nº 13.979/2020, com modificações introduzidas pela Lei nº 14.006/2020, autoriza, em caráter excepcional e temporário, a importação e a distribuição de quaisquer equipamentos da área de saúde sujeitos à vigilância sanitária sem registro na ANVISA, desde que considerados essenciais para auxiliar no combate à pandemia do coronavírus. Para a flexibilização da exigência legal de registro na ANVISA, estabeleceu-se, ademais, que os equipamentos devem ser registrados por, pelo menos, 1 (uma) das autoridades sanitárias estrangeiras que especifica (Food and Drug Administration - FDA, European Medicines Agency - EMA, Pharmaceuticals and Medical Devices Agency - PMDA e National Medical Products Administration - NMPA), bem como que sejam autorizados à distribuição comercial em seus respectivos países." 5. "Com o propósito de regulamentar essas operações, a ANVISA editou a Resolução de Diretoria Colegiada - RDC nº 356, de 23 de março de 2020, que dispõe: Art. 9º Fica permitida a aquisição de equipamentos de proteção individual, ventiladores pulmonares, circuitos, conexões e válvulas respiratórios, monitores paramétricos e outros dispositivos médicos, essenciais para o combate à COVID-19, novos e não regularizados pela Anvisa, desde que regularizados e comercializados em jurisdição membro do International Medical Device Regulators Forum (IMDRF), por órgãos e entidades públicas e privadas, bem como serviços de saúde, quando não disponíveis para o comércio dispositivos semelhantes regularizados na Anvisa." 6. "A RDC prevê, portanto, a permissão da aquisição de ventiladores pulmonares essenciais para o combate à COVID-19, novos e não regularizados pela ANVISA, desde que regularizados e comercializados em jurisdição membro do International Medical Device Regulators Forum - IMDRF, por órgãos e entidades públicas e privadas, bem como serviços de saúde, quando não disponíveis para o comércio dispositivos semelhantes regularizados na ANVISA." 7. "Como assinalado, o Estado do Ceará requer que seja declarada a inexigibilidade de apresentação das DRR's - Declaração do Detentor da Regularização do Produto atinentes aos respiradores mecânicos, com a determinação consequente, de obrigação de fazer, de que a ANVISA emita as respectivas Licenças de Importação." 8. "Em análise dos autos (ID nº 4058100.18336475), verifico que o Contrato nº 312/2020 foi firmado pelo Estado do Ceará, através da Secretaria da Saúde do Estado do Ceará - SESA, e a Empresa China Meheco Corporation em 24 de março de 2020 e envolveu a aquisição, mediante importação da (...), de 700 (setecentas) unidades de ventiladores pulmonares mecânicos do tipo VG70 para pacientes pediátricos e adultos. Esses aparelhos se destinam, ademais, ao tratamento da COVID-19, resultante do "Novo Coronavírus", conforme especificações e quantitativos previstos no Anexo I do Termo de Referência e na proposta contratada (Cláusula 3ª). Inequivocamente, a importação envolve equipamentos "considerados essenciais para auxiliar no combate à pandemia do coronavírus", nos termos literais do art. 3º, VIII, da Lei nº 13.979/2020. Por sua vez, conforme evidenciado pelo certificado de regularização (ID 4058100.18336487) e pelas informações do sítio eletrônico oficial da International Medical Device Regulators Forum - IMDRF (ID 4058100.18336491), equipamentos desse tipo são regularizados e comercializados no Reino Unido (que se retirou, recentemente, da União Européia no contexto do "Brexit") e na Alemanha, que integra, na condição de país membro da União Européia, a IMDRF (http://www.imdrf.org/about/about.asp). Restou, portanto, satisfeito o disposto nesse tocante no art. 9º da RDC nº 356/2020. Noutra senda, a ANVISA promoveu o registro da empresa EXXOMED Equipamentos LTDA (CNPJ nº 09.135.326/0001-09, Registro nº 80743230052 e Autorização nº 8.07.432-3), que comercializa ventiladores pulmonares mecânicos do tipo VG70 no território nacional. Esse registro só se deu, contudo, em 27 de março de 2020, 3 (três) dias depois da conclusão do mencionado Contrato nº 312/2020 (ID 4058100.18336502)." 9. No caso, a regra é a da exigência da DDR - Declaração do Detentor da Regularização do Produto por parte da ANVISA. No entanto, essa exigência foi flexibilizada em razão da pandemia do novo Coronavírus, desde que preenchidos determinados requisitos. 10. A exigência da DDR tem uma relação direta com a responsabilização do detentor do produto pelas especificações de qualidade que foram avaliadas pela ANVISA no momento do seu registro e para que essas especificações se mantenham até o momento final de seu consumo. Daí o seu valor do ponto de vista sanitário e de proteção à saúde. Portanto, a importância de sua exigência não se discute. 11. No caso em comento, há que se divergir da sentença quanto ao marco temporal utilizado para a verificação da exigência da DDR. 12. O contrato de aquisição dos ventiladores pulmonares e comento foi celebrado em 24/03/2020, poucos dias antes do registro junto à ANVISA da Empresa EXXOMED Equipamentos Ltda, que os comercializa em território nacional, ocorrido em 27/03/2020. Já a licença de importação estava pronta para ser formalizada em 19/06/2020, quase três meses depois, tendo em vista que a entrega dos produtos somente deveria ocorrer após o pagamento integral do preço pactuado. É essa data que deve ser considerada como marco para a aplicação do regime jurídico correspondente, pois é nesse momento que nasce o dever de apresentação da DDR. 13. A DDR - Declaração do Detentor da Regularização do Produto é documento que se relaciona com a importação em si, de forma que a verificação de sua exigência deve estar atrelada a essa data e não à data da celebração do contrato entre o Estado do Ceará e a Empresa fornecedora. 14. Considerado que o fato gerador do Imposto de Importação é a entrada da mercadoria no país e essa entrada somente ocorre com o registro da Declaração de Importação e que, no momento em que as licenças de importação estavam aguardando a correspondente emissão, já havia o registro dos ventiladores pulmonares junto à ANVISA, a DDR era uma exigência legal e legítima para o desembaraço aduaneiro. Assim, a ANVISA agiu dentro dos limites de seu poder. 15. Nesse caso, aplica-se o disposto no
art. 9º,
§ 4º, da RDC 356/2020, com as alterações da RDC 379/2020, que vedou a importação de produtos regularizados na ANVISA sem a devida Declaração da pessoa jurídica detentora da regularização do produto junto à mencionado Autarquia.
16. Nesse mesmo sentido foi julgado o PJe 0806058-56.2020.4.05.8100, em que o Estado do Ceará pleiteava a liberação, também sem a apresentação da DDR, de 200 (duzentos) respiradores mecânicos importados por meio do mesmo contrato.
17. Apelação provida para reformar a sentença e julgar improcedentes os pedidos. Inversão do ônus da sucumbência.
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(TRF-5, PROCESSO: 08071965820204058100, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL ARNALDO PEREIRA DE ANDRADE SEGUNDO (CONVOCADO), 3ª TURMA, JULGAMENTO: 05/05/2022)