Decreto nº 9310 (2018)

Decreto nº 9310 (2018)

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º

Ficam instituídos as normas gerais e os procedimentos aplicáveis à Regularização Fundiária Urbana - Reurb, a qual abrange as medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais destinadas à incorporação dos núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano e à titulação dos seus ocupantes.
§ 1º Os Poderes Públicos formularão e desenvolverão, no espaço urbano, as políticas de suas competências de acordo com os princípios de sustentabilidade econômica, social e ambiental e ordenação territorial, de forma a buscar a ocupação do solo de maneira eficiente e combinar o seu uso de forma funcional.
§ 2º A Reurb promovida por meio da legitimação fundiária somente poderá ser aplicada para os núcleos urbanos informais comprovadamente existentes em 22 de dezembro de 2016, nos termos do disposto na Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017 , e neste Decreto.

Art. 2º

Constituem objetivos da Reurb, a serem observados pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios:
I - identificar os núcleos urbanos informais a serem regularizados, organizá-los e assegurar a prestação de serviços públicos aos seus ocupantes, de modo a melhorar as condições urbanísticas e ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior;
II - criar unidades imobiliárias compatíveis com o ordenamento territorial urbano e constituir sobre elas direitos reais em favor dos seus ocupantes;
III - ampliar o acesso à terra urbanizada pela população de baixa renda, de modo a priorizar a permanência dos ocupantes nos próprios núcleos urbanos informais regularizados;
IV - promover a integração social e a geração de emprego e renda;
V - estimular a resolução extrajudicial de conflitos, em reforço à consensualidade e à cooperação entre Estado e sociedade;
VI - garantir o direito social à moradia digna e às condições de vida adequadas;
VII - garantir a efetivação da função social da propriedade;
VIII - ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes;
IX - concretizar o princípio constitucional da eficiência na ocupação e no uso do solo;
X - prevenir e desestimular a formação de novos núcleos urbanos informais;
XI - conceder direitos reais, preferencialmente em nome da mulher; e
XII - franquear a participação dos interessados nas etapas do processo de regularização fundiária.

Art. 3º

Para fins do disposto na Lei nº 13.465, de 2017 , e neste Decreto, considera-se:
I - núcleo urbano - assentamento humano, com uso e características urbanas, constituído por unidades imobiliárias com área inferior à fração mínima de parcelamento prevista no Art. 8º da Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972 , independentemente da propriedade do solo, ainda que situado em área qualificada ou inscrita como rural;
II - núcleo urbano informal - aquele clandestino, irregular ou no qual não tenha sido possível realizar a titulação de seus ocupantes, ainda que atendida a legislação vigente à época de sua implantação ou regularização;
III - núcleo urbano informal consolidado - aquele de difícil reversão, considerados o tempo da ocupação, a natureza das edificações, a localização das vias de circulação e a presença de equipamentos públicos, entre outras circunstâncias a serem avaliadas pelo Município ou pelo Distrito Federal;
IV - demarcação urbanística - procedimento destinado a identificar os imóveis públicos e privados abrangidos pelo núcleo urbano informal e a obter a anuência dos titulares de direitos inscritos nas matrículas ou nas transcrições dos imóveis ocupados para possibilitar a averbação nas matrículas da viabilidade da regularização fundiária, a ser promovida a critério do Município ou do Distrito Federal;
V - Certidão de Regularização Fundiária - CRF - documento expedido pelo Município ou pelo Distrito Federal ao final do procedimento da Reurb, constituído do projeto de regularização fundiária aprovado, do termo de compromisso relativo a sua execução e, no caso da legitimação fundiária e da legitimação de posse, da listagem dos ocupantes do núcleo urbano informal regularizado, da devida qualificação destes e dos direitos reais que lhes foram conferidos;
VI - legitimação de posse - ato do Poder Público destinado a conferir título, por meio do qual fica reconhecida a posse de imóvel objeto da Reurb, conversível em aquisição de direito real de propriedade na forma estabelecida na Lei nº 13.465, de 2017 , e neste Decreto, e do qual conste a identificação de seus ocupantes, o tempo da ocupação e a natureza da posse;
VII - legitimação fundiária - mecanismo de reconhecimento da aquisição originária do direito real de propriedade sobre unidade imobiliária objeto de Reurb; e
VIII - ocupante - aquele que mantenha poder de fato sobre o lote ou a fração ideal de imóvel público ou privado em núcleos urbanos informais.
§ 1º Para fins de Reurb, os Municípios e o Distrito Federal poderão dispensar as exigências relativas ao percentual e às dimensões de áreas destinadas ao uso público, ao tamanho dos lotes regularizados ou a outros parâmetros urbanísticos e edilícios.
§ 2º O termo de compromisso referido no inciso V do caput conterá o cronograma da execução de obras e serviços e da implantação da infraestrutura essencial e poderá prever compensações urbanísticas e ambientais, quando necessárias.
§ 3º Constatada a existência de núcleo urbano informal situado, total ou parcialmente, em área de preservação permanente ou em área de unidade de conservação de uso sustentável ou de proteção de mananciais definidas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, a Reurb observará, também, o disposto nos Art. 64 e Art. 65 da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 , e será obrigatória a elaboração de estudo técnico que comprove que as intervenções de regularização fundiária implicam a melhoria das condições ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior com a adoção das medidas nele preconizadas, inclusive por meio de compensações ambientais, quando necessárias.
§ 4º Cabe aos Municípios e ao Distrito Federal a aprovação do projeto de regularização fundiária do núcleo urbano informal de que trata o § 3º.
§ 5º Constatada a existência de núcleo urbano informal situado, total ou parcialmente, em área de unidade de conservação de uso sustentável que, nos termos da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000 , admita a regularização, a anuência do órgão gestor da unidade será exigida, desde que estudo técnico comprove que essas intervenções de regularização fundiária impliquem a melhoria das condições ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior, o órgão gestor da unidade de conservação de uso sustentável deverá se manifestar, para fins de Reurb, no prazo de noventa dias, contado da data do protocolo da solicitação.
§ 6º Na hipótese de recusa à anuência a que se refere o § 5º pelo órgão gestor da unidade, este emitirá parecer, técnica e legalmente fundamentado, que justifique a negativa para realização da Reurb.
§ 7º Na Reurb em núcleos urbanos informais situados às margens de reservatório artificial de água destinado à geração de energia ou ao abastecimento público, a faixa da área de preservação permanente consistirá na distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum .
§ 8º Não é admitida a Reurb em núcleos urbanos informais situados em áreas indispensáveis à segurança nacional ou de interesse da defesa, assim reconhecidas em ato do Presidente da República.
§ 9º É admitida a Reurb em núcleos urbanos informais situados na faixa de fronteira estabelecida na Lei nº 6.634, de 2 de maio de 1979 , exceto na hipótese referida no § 8º.
§ 10. Consideram-se áreas indispensáveis à segurança nacional para fins do disposto neste Decreto, os locais e as adjacências onde o Presidente da República e o Vice-Presidente da República trabalham ou residem oficialmente durante o mandato presidencial, e das infraestruturas críticas, cujas instalações, serviços e bens, se forem interrompidos ou destruídos, provocarão sérios impactos à sociedade e ao Estado.
§ 11. As infraestruturas críticas cujas instalações, serviços e bens, se forem interrompidos ou destruídos, provocarão sérios impactos à sociedade e ao Estado, serão definidas em ato do Presidente da República, consultado o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
§ 12. Aplica-se o disposto no § 10 quanto às instalações, e às suas adjacências, utilizadas de forma permanente ou não pelo Presidente da República e pelo Vice-Presidente da República, conforme indicação definida em ato do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
§ 13. O disposto na Lei nº 13.465, de 2017 , e neste Decreto se aplica aos imóveis localizados em área rural, desde que a unidade imobiliária tenha área inferior à fração mínima de parcelamento prevista no Art. 8º da Lei nº 5.868, de 1972 .
§ 14. Após a Reurb de núcleos urbanos informais situados em áreas qualificadas como rurais, os Municípios e o Distrito Federal poderão efetuar o cadastramento das novas unidades imobiliárias, para fins de lançamento dos tributos municipais e distritais.

Art. 4º

A aprovação municipal e distrital da Reurb de que trata o § 4º do art. 3º corresponde à aprovação urbanística do projeto de regularização fundiária, e à aprovação ambiental, se o Município tiver órgão ambiental capacitado.
§ 1º A aprovação ambiental a que se refere o caput corresponde à aprovação do estudo técnico ambiental a que se refere o inciso VIII do caput do art. 30.
§ 2º Considera-se órgão ambiental capacitado o órgão municipal que possua, em seus quadros ou à sua disposição, profissionais com atribuição técnica para a análise e a aprovação dos estudos referidos no art. 3º, independentemente da existência de convênio com os Estados ou com a União.
§ 3º A aprovação ambiental poderá ser feita pelos Estados, na hipótese de o Município não ter órgão ambiental capacitado.
§ 4º O estudo técnico ambiental será obrigatório somente para as parcelas dos núcleos urbanos informais situados nas áreas de preservação permanente, nas unidades de conservação de uso sustentável ou nas áreas de proteção de mananciais e poderá ser feito em fases ou etapas e a parte do núcleo urbano informal não afetada pelo estudo poderá ter seu projeto de regularização fundiária aprovado e levado a registro separadamente.
§ 5º Na Reurb de Interesse Social - Reurb-S, quando houver estudo técnico ambiental, este deverá comprovar que as intervenções da regularização fundiária implicam a melhoria das condições ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior com a adoção das medidas nele preconizadas e deverá conter, no mínimo, os seguintes elementos previstos no Art. 64 da Lei nº 12.651, de 2012 :
I - caracterização da situação ambiental da área a ser regularizada;
II - especificação dos sistemas de saneamento básico;
III - proposição de intervenções para a prevenção e o controle de riscos geotécnicos e de inundações;
IV - recuperação de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização;
V - comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental, considerados o uso adequado dos recursos hídricos, a não ocupação das áreas de risco e a proteção das unidades de conservação, quando for o caso;
VI - comprovação da melhoria da habitabilidade dos moradores propiciada pela regularização proposta; e
VII - demonstração de garantia de acesso livre e gratuito pela população às praias e aos corpos d’água, quando couber.
§ 6º Na Reurb de Interesse Específico - Reurb-E, quando houver estudo técnico ambiental, este deverá comprovar que as intervenções da regularização fundiária implicam a melhoria das condições ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior com a adoção das medidas nele preconizadas e deverá conter, no mínimo, os seguintes elementos previstos no Art. 65 da Lei nº 12.651, de 2012 :
I - caracterização físico-ambiental, social, cultural e econômica da área;
II - identificação dos recursos ambientais, dos passivos e das fragilidades ambientais e das restrições e potencialidades da área;
III - especificação e a avaliação dos sistemas de infraestrutura urbana e de saneamento básico implantados, além de outros serviços e equipamentos públicos;
IV - identificação das unidades de conservação e das áreas de proteção de mananciais na área de influência direta da ocupação, sejam elas águas superficiais, sejam subterrâneas;
V - especificação da ocupação consolidada existente na área;
VI - identificação das áreas consideradas de risco de inundações e de movimentos de massa rochosa, tais como deslizamento, queda e rolamento de blocos, corrida de lama e outras definidas como de risco geotécnico;
VII - indicação das faixas ou áreas em que devem ser resguardadas as características típicas da área de preservação permanente com a proposta de recuperação de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização;
VIII - avaliação dos riscos ambientais;
IX - comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental e de habitabilidade dos moradores a partir da regularização; e
X - demonstração de garantia de acesso livre e gratuito pela população às praias e aos corpos d’água, quando couber.
§ 7º Para fins da regularização ambiental prevista no § 6º, ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água, será mantida faixa não edificável com largura mínima de quinze metros de cada lado.
§ 8º Em áreas urbanas tombadas como patrimônio histórico e cultural, a faixa não edificável de que trata o inciso anterior poderá ser redefinida de maneira a atender aos parâmetros do ato do tombamento.
§ 9º Os estudos de que trata este artigo deverão ser elaborados por profissional legalmente habilitado e estar compatibilizados com o projeto de regularização fundiária e conter, conforme o caso, os elementos constantes dos Art. 64 ou Art. 65 da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012

Art. 5º

A Reurb compreende duas modalidades:
I - Reurb-S - regularização fundiária aplicável aos núcleos urbanos informais ocupados predominantemente por população de baixa renda, assim declarados em ato do Poder Público municipal ou distrital; e
II - Reurb-E - regularização fundiária aplicável aos núcleos urbanos informais ocupados por população não qualificada na hipótese de que trata o inciso I.
§ 1º Serão isentos de custas e emolumentos, entre outros, os atos registrais relacionados à Reurb-S conforme disposto no Capítulo V.
§ 2º O registro dos atos de que trata § 1º independe da comprovação do pagamento de tributos ou de penalidades tributárias.
§ 3º O disposto nos § 1º e § 2º aplica-se também à Reurb-S que tenha por objeto conjuntos habitacionais ou condomínios de interesse social construídos pelo Poder Público, diretamente ou por meio da administração pública indireta, que já tenham sido implantados em 22 de dezembro de 2016.
§ 4º No mesmo núcleo urbano informal poderá haver as duas modalidades de Reurb, desde que a parte ocupada predominantemente por população de baixa renda seja regularizada por meio de Reurb-S e o restante do núcleo por meio de Reurb-E.
§ 5º Na Reurb, os Municípios e o Distrito Federal poderão admitir o uso misto de atividades como forma de promover a integração social e a geração de emprego e renda no núcleo urbano informal regularizado.
§ 6º A regularização fundiária de núcleos urbanos informais constituídos por unidades imobiliárias não residenciais poderá ser feita por meio de Reurb-E.
§ 7º A classificação da modalidade da Reurb de unidades imobiliárias residenciais ou não residenciais integrantes de núcleos urbanos informais poderá ser feita, a critério do Município ou do Distrito Federal, ou quando for o caso, dos Estados e da União, de forma integral, por partes ou de forma isolada por unidade imobiliária.
§ 8º A classificação da modalidade visa exclusivamente à identificação dos responsáveis pela implantação ou adequação das obras da infraestrutura essencial e ao reconhecimento do direito à gratuidade das custas e dos emolumentos notariais e registrais em favor daqueles a quem for atribuído o domínio das unidades imobiliárias regularizadas.
§ 9 º Os cartórios que não cumprirem o disposto neste artigo, que retardarem ou não efetuarem o registro de acordo com as normas previstas neste Decreto, por ato não justificado, ficarão sujeitos às sanções previstas no Art. 44 da Lei nº 11.977, de 2009 , observado o disposto nos § 3º -A e § 3º -B do art. 30 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 .
§ 10. A partir da disponibilidade de equipamentos e infraestrutura para prestação de serviço público de abastecimento de água, coleta de esgoto, distribuição de energia elétrica, ou outros serviços públicos, é obrigatório aos beneficiários do Reurb realizar a conexão da edificação que ocupem à rede de água, de coleta de esgoto ou de distribuição de energia elétrica e adotar as demais providências necessárias à utilização do serviço, exceto se houver disposição em contrário na legislação municipal ou distrital.

Art. 6

º Para a classificação da Reurb na modalidade Reurb-S, a composição ou a faixa da renda familiar para definição de população de baixa renda poderá ser estabelecida em ato do Poder Público municipal ou distrital, consideradas as peculiaridades locais e regionais de cada ente federativo.
Parágrafo único. A renda familiar prevista no caput não poderá ser superior ao quíntuplo do salário mínimo vigente no País.

Art. 7º

Poderão requerer a instauração da Reurb:
I - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, diretamente ou por meio de entidades da administração pública indireta;
II - os seus beneficiários, individual ou coletivamente, diretamente ou por meio de cooperativas habitacionais, associações de moradores, fundações, organizações sociais, organizações da sociedade civil de interesse público ou outras associações civis que tenham por finalidade atuar nas áreas de desenvolvimento urbano ou de regularização fundiária urbana;
III - os proprietários dos imóveis ou dos terrenos, os loteadores ou os incorporadores;
IV - a Defensoria Pública, em nome dos beneficiários hipossuficientes; e
V - o Ministério Público.
§ 1º Os legitimados poderão promover os atos necessários à regularização fundiária, inclusive requerer os atos de registro.
§ 2º Nas hipóteses de parcelamento do solo, de conjunto habitacional ou de condomínio informal, empreendidos por particular, a conclusão da Reurb confere direito de regresso àqueles que suportarem os seus custos e as suas obrigações contra os responsáveis pela implantação dos núcleos urbanos informais.
§ 3º O requerimento de instauração da Reurb pelos proprietários de terreno, pelos loteadores ou pelos incorporadores que tenham dado causa à formação de núcleos urbanos informais, ou por seus sucessores, não os eximirá de responsabilidades administrativa, civil ou criminal.
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