Descumprimento de ordem judicial: 5 medidas para tornar efetiva uma decisão

E-BOOK
 
Por Modelo Inicial
15/03/2024  
Descumprimento de ordem judicial: 5 medidas para tornar efetiva uma decisão - Geral
Das astreintes ao pedido de apreensão de CNH, veja algumas medidas que podem dar maior efetividade às decisões judiciais com modelos.

Neste artigo:
  1. O que é o descumprimento de ordem judicial?
  2. Quais as consequências do descumprimento de ordem judicial?
  3. Astreintes
  4. Arresto e Sequestro
  5. Penhora online, RENAJUD, SISBAJUD
  6. Bloqueio de verba pública
  7. Improbidade Administrativa

Um processo judicial objetiva reparar um direito que foi corrompido e busca garantir o equilíbrio do Estado Democrático de Direito. No entanto, ultrapassado o grande desgaste de um processo judicial, inicia-se um novo dilema: efetivar o cumprimento da decisão proferida pelo juízo.

Nessa fase, por vezes longa e complexa, muitos já se depararam com a frustração do descumprimento de uma ordem judicial, e com o dilema da existência de poucas ferramentas para torná-la eficaz e fazer valer o que foi determinado pelo magistrado, exigindo do Advogado maior intervenção para fazer valer a decisão proferida.

Veja: MODELO em face do descumprimento de decisão judicial.

Quer saber mais sobre o assunto? Neste post, você vai entender o que diz a Lei e as consequências jurídicas envolvendo o descumprimento de ordem judicial. Acompanhe a leitura e conheça mais sobre esse tema!

O que é o descumprimento de ordem judicial?

O descumprimento de ordem judicial é considerado como uma ofensa à estrutura judiciária. Trata-se de uma conduta classificada, inclusive, como crime de Desobediência pelo Código Penal:

Desobediência

Art. 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público:

Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, e multa.

Assim, em alguns casos mais graves, a pena de prisão pode ser requerida, conforme precedentes sobre o tema:

"(...) Não há espaço para imposição direta de multa à indigitada autoridade coatora por virtual descumprimento da medida liminar, mesmo porque está ela sujeita à prisão em flagrante delito pelo crime de desobediência, além das imposições cíveis e criminais que derivarem da resistência à ordem judicial, sendo, portanto, medida excepcional que deve ser avaliada em momento próprio. Provido em parte." (TJ-MG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.16.047869-9/001, Relator(a): Des.(a)Marcos Lincoln)

Todavia, se a letra fria da lei fosse aplicada, inúmeros seriam os casos passíveis de prisão por desobediência. Mas este não é um posicionamento majoritário adotado no nosso ordenamento brasileiro, sendo necessário buscar outras medidas coercitivas, mais eficazes.

Quais as consequências do descumprimento de ordem judicial?

Após esgotadas todas as medidas possíveis para a efetivação de uma ordem judicial, não resta outra alternativa senão requerer ao Juízo a adoção das medidas coercitivas mais severas para o efetivo cumprimento da decisão, nos termos do Art. 139 do CPC/15:

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:

IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;

A Lei tratou de conferir ao Juiz o poder necessário para dar efetividade às suas decisões, conforme destaca renomada doutrina, "O art. 139, IV, CPC, explicita os poderes de imperium conferidos ao juiz para concretizar suas ordens. A regra se destina tanto a ordens instrumentais (...) como a ordens finais (...)." (MITIDERO, Daniel. ARENHART, Sérgio Cruz. MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Código de Processo Civil Comentado - Revista dos Tribunais, 2017. Versão e-book, Art. 139.)

Razão pela qual, em proporção às razões demonstradas pelo requerente, o Juiz pode determinar medidas coercitivas mais severas para o efetivo cumprimento da decisão judicial. Vamos a algumas delas.

1. Astreintes

Trata-se da mais usual e conhecida pelos operadores do direito. Prevista no Código de Processo Civil/2015 em seu Art. 537, o pedido de multa diária ou por hora de descumprimento (astreintes), vem positivada nos seguintes termos:

Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.

Ao disciplinar o tema, os doutrinadores Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade destacam:

"O objetivo das astreintes não é obrigar o réu a pagar o valor da multa, mas obrigá-lo a cumprir a obrigação na forma específica. A pena é inibitória. Deve ser alta para que o devedor desista de seu intento de não cumprir a obrigação específica. Vale dizer, o devedor deve sentir ser preferível cumprir a obrigação na forma específica a pagar o alto valor da multa fixada pelo." (in Código de Processo Civil Comentado. 13ªed. Revista dos Tribunais. p.808)

Ou seja, trata-se de medida coercitiva que objetiva o cumprimento da decisão e não uma reparação ao descumprimento, sendo cabível, inclusive, em face da Fazenda Pública:

DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMÓVEL. FEPASA. SUCESSÃO PELA RFFSA. SUCESSÃO PELA UNIÃO. REGULARIZAÇÃO REGISTRAL. PRAZO RAZOÁVEL. ART. 5º, LXXVIII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 24 DA LEI Nº 11.457/2007. ASTREINTE. FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. INÉRCIA ADMINISTRATIVA. APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO PARCIALMENTE PROVIDOS.1. (...).4. Não há que se falar em inaplicabilidade de astreintes em desfavor da Fazenda Pública, consoante entendimento sedimentado na Jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça. Precedente.5. Ausente previsão legal específica, mas necessária a fixação de um prazo razoável para o cumprimento da decisão proferida nestes autos - o que se justifica, principalmente, pela inegável inércia administrativa verificada até a prolação de sentença neste feito -, tenho por aplicável à espécie, por analogia, o prazo de 360 dias previsto no artigo 24 da Lei nº 11.457/2007. Correta, portanto, a sentença ao cominar multa para o caso de inobservância do prazo assinalado para cumprimento da determinação judicial, nada havendo de exorbitante na importância ali fixada, de R$ 1.000,00 (mil reais) por dia de atraso, cominação que resta mantida.7. Sentença parcialmente reformada para elastecer o prazo para início e conclusão de procedimento administrativo destinado à regularização da área discutida nos autos para 360 dias, por aplicação analógica do artigo 24 da Lei nº 11.457/2007, mantida a multa fixada em sentença para o caso de descumprimento.8. Apelação e reexame necessário parcialmente providos. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0011180-29.2016.4.03.6112, Rel. Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, julgado em 13/08/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 18/08/2020)

Trata-se do pedido e da medida coercitiva mais usual no judiciário, sendo eficaz nos casos em que a multa implica em penalidade indesejada ao Executado.

Veja MODELO com pedido de multa diária - astreintes.

2. Arresto e Sequestro

Para evitar o descumprimento de uma decisão, tem-se a possibilidade de se buscar previamente o arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem, dentre outras medidas, conforme dispõe o CPC/15:

Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para assegurar o direito.

Para tanto, tem-se a necessidade de se demonstrar os requisitos da probabilidade do direito e risco ao resultado útil do processo, permitindo previamente o bloqueio para fins de que o interesse do exequente seja alcançado, conforme precedentes sobre o tema:

Agravo de Instrumento - Execução de Título Extrajudicial - Diligenciado nos endereços informados pela Receita Federal e Detran e frustrada a citação dos executados, perfeitamente possível o arresto pelo Sisbajud, por analogia ao disposto no art. 854 do CPC, tendo em vista que não pode ser ignorado o princípio segundo o qual se realiza a execução no interesse do exequente. Decisão Reformada - Agravo Provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2260920-24.2020.8.26.0000; Relator (a): Ramon Mateo Júnior; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro de Jaú - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 09/11/2020; Data de Registro: 09/11/2020)

A doutrina nesse mesmo sentido, salienta:

"E, realmente, preenchidos os pressupostos de cabimento do art. 300, caput, ao órgão judiciário é dado, antecedente ou incidentemente, decretar o arresto ou o sequestro. O arresto possui exatamente a função de assegurar a execução de crédito em dinheiro, mediante expropriação; e o sequestro, a execução para entrega de coisa, através de desapossamento." (ASSIS, Araken de. Manual da Execução - Editora RT, 2017, e-book, 4. Institutos gerais da função executiva)

Para tanto, alguns sistemas informatizados conveniados com o judiciário podem ser utilizados, conforme menciona-se abaixo.

Veja MODELO de pedido de sequestro e arresto.

3. Penhora online, RENAJUD, SISBAJUD

Ao envolver bens e valores, cumpre destacar ferramentas eficazes de posse do Judiciário, tais como:

  • Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI);
  • Registro Imobiliário do Brasil (IRIB);
  • Restrições Judiciais de Veículos Automotores (Renajud);
  • Sistema de Informações ao Judiciário (Infojud);
  • Sistema para a penhora on-line (Sisbajud).

Tais sistemas agilizaram exponencialmente a busca de patrimônio em nome da parte executada, devendo ser concedido ao requerente como forma de viabilizar o amplo acesso à Justiça:

Execução de titulo executivo extrajudicial -Pesquisa - BacenJud. Consistindo a penhora online medida destinada a dar efetividade à execução, não há como negar ao credor o direito de buscar a satisfação de seu crédito através dessa modalidade de constrição, inclusive sem necessidade de prévia indicação de bens. Recurso provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2217546-60.2017.8.26.0000; Relator (a): Itamar Gaino; Órgão Julgador: 21ª Câmara de Direito Privado; Foro de Catanduva - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 05/02/2018; Data de Registro: 05/02/2018)

Importa destacar, ainda, que não há limite para que se possa requer a repetição da pesquisa, conforme precedentes sobre o tema:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PESQUISA DE ATIVOS FINANCEIROS VIA BACENJUD. REITERAÇÃO DE DILIGÊNCIA. PRINCÍPIO DE RAZOABILIDADE. 1. A apreciação do pedido de reiteração de pesquisas de ativos financeiros em nome do devedor, por meio dos sistemas informatizados, deve observar o princípio de razoabilidade no caso concreto. Para tanto, considera-se a demonstração pelo exequente de indícios de mudança na situação patrimonial do executado, ou até mesmo o decurso de tempo suficiente entre as diligências. Precedentes. 2. Agravo de Instrumento conhecido e provido. (TJDFT, Acórdão n.1242221, 07192131820198070000, Relator(a): FÁBIO EDUARDO MARQUES, 7ª Turma Cível, Julgado em: 01/04/2020, Publicado em: 04/05/2020)

No entanto, cabe lembrar que o acesso não é concedido deliberadamente. Além do requerimento expresso para informações ou bloqueio por meio destes sistemas, é preciso esgotar todas as possibilidades acessíveis para justificar o uso do sistema. De posse das informações obtidas por estes sistemas, a efetiva execução de um crédito fica facilitada.

Veja MODELO de pedido de penhora.

4. Bloqueio de verba pública

Cumpre destacar que o Novo CPC introduziu uma séria de medidas coercitivas, sendo aplicáveis, inclusive em face da Fazenda Pública, in verbis:

Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.

Sob este prima, conforme sedimentado pela jurisprudência, as medidas podem contemplar, inclusive, o bloqueio de verbas públicas:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA-DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO QUE DETERMINOU O FORNECIMNTO DE INSUMOS - BLOQUEIO DE VERBA PÚBLICA - MEDIDA EXCEPCIONAL - DESÍDIA DO ENTE PÚBLICO CONFIGURADA- POSSIBILIDADE- DECISÃO MANTIDA- RECURSO DESPROVIDO. 1- É pacífica a jurisprudência do col. STJ no sentido de que o magistrado pode determinar o bloqueio de verba pública, como medida excepcional, necessária à aquisição de insumo essencial ao tratamento de saúde da parte, se comprovado que o Estado não está cumprindo obrigação determinada judicialmente e que a sua desídia pode implicar em grave lesão à saúde ou a vida da paciente. 2- Configurada a desídia do ente público, por prolongado lapso temporal, no cumprimento da obrigação de fazer determinada por decisão judicial, resta legitimado o bloqueio da verba pública, no valor referente a três meses do insumo necessário ao tratamento de saúde da paciente, como meio de garantir a efetividade da medida de urgência e de evitar prejuízo ao direito fundamental da paciente. 3- Recurso a que se nega provimento. (TJ-MG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0620.14.004487-1/001, Relator(a): Des.(a)Maria Luíza de Marilac, julgamento em 03/04/2018, publicação da súmula em 13/04/2018AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS E UTENSÍLIOS. BLOQUEIO DE VERBA PÚBLICA. POSSIBILIDADE MANUTENÇÃO DO DECISUM.1. Volta-se o recorrente contra a decisão do Juízo a quo que determinou o sequestro do valor requerido pelo demandante pelo sistema BACENJUD (R$ 5.904,18), para aquisição dos medicamentos e utensílios descritos na exordial. 2. A Constituição da República inseriu o direito à saúde no art. 6º, entre os direitos e garantias fundamentais, assim como a Lei n.º 8080/90, que implantou o Sistema Único de Saúde, estabeleceu, no art. 2º, que a saúde é um direito fundamental e, no art. 6º, no campo de atuação do Sistema Único de Saúde, a assistência farmacêutica. Neste caso, verifica-se que a natureza do direito protegido impõe tanto à União, ao Estado e ao Município providências no sentido de cumprir fielmente o que foi imposto pela Constituição. (...).4. Quanto à alegada irreversibilidade da medida concedida, impõe-se registrar que, em casos semelhantes, faz-se necessária a ponderação de interesses mediante o princípio da razoabilidade, pois a negativa do fornecimento do procedimento requerido pela agravada fatalmente também seria irreversível em seu desfavor, conforme atesta o laudo médico de folhas 29-31 dos autos originários (000019).5. (...). 7. Noutro Passo, quanto a alegada impossibilidade de sequestro de verba pública, esta não merece acolhida, e isso porque o art. 536, §1º, do Código de Processo Civil, contempla as medidas assecuratórias à obtenção do resultado prático equivalente ao adimplemento, sendo certo que tal rol não é exaustivo, e sim exemplificativo, fundamentando-se nele o sequestro da verba pública, medida excepcional e razoável diante do caso concreto. 8. Na espécie, o bloqueio da verba diretamente na conta da Administração Pública, a fim de se possibilitar a aquisição dos medicamentos e utensílios necessários à preservação da saúde do autor, que faz tratamento da mielomeningocele sacral rota, corrigida no dia seguinte do nascimento, hidrocefalia com derivação ventrículo-peritoneal e bexiga neurogênica (CID Q05.3 e N31.9), não ofende o princípio da menor onerosidade, previsto no caput art. 805 do Código de Processo Civil.9. (...). 11. Portanto, em que pese a impenhorabilidade do bem público, no caso concreto tal princípio deve ceder diante do direito fundamental à saúde, devendo ser mantido o sequestro da verba pública. Precedente STJ e TJ-RJ.12. Assim, diante do exposto, estão presentes na hipótese a verossimilhança das alegações autorais e o risco de dano irreparável e de difícil reparação a ensejar a manutenção da decisão que determinou o sequestro do valor requerido pelo demandante pelo sistema BACENJUD (R$ 5.904,18). 13. Por fim, somente se reforma a decisão concessiva ou não da antecipação de tutela, se teratológica, contrária à lei ou à evidente prova dos autos. Verbete n.º 59 da súmula de jurisprudência desta Corte.14. Recurso não provido. Conclusões: POR UNANIMIDADE, NEGOU-SE PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO DES. RELATOR. (TJ-RJ, AGRAVO DE INSTRUMENTO 0058710-13.2020.8.19.0000, Relator(a): DES. JOSE CARLOS PAES, Publicado em: 10/12/2020).

Afinal, o descumprimento de uma ordem judicial caracteriza uma grave ilegalidade administrativa, passível de configuração de improbidade, conforme legislação aplicável:

Lei da Improbidade Administrativa, Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

(...)

VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;

Veja também, um MODELO de pedido de penhora de verba pública.

5. Improbidade Administrativa

O STJ já reconheceu que o descumprimento de decisão judicial configura ato de improbidade de administrativa. O entendimento foi expresso em acórdão decidido no AgInt no AREsp 1.397.770/MG (Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial). O Tribunal decidiu que o não cumprimento de decisão proferida por juiz e destinada a prefeito do município configura ato de improbidade administrativa.

No caso concreto, foi ajuizada ação contra o município de Miradouro, situado em Minas Gerais, com o objetivo de compelir o ente público a fornecer leite especial para uma criança com condições especiais. Nesse sentido, o magistrado responsável pela sentença, em primeira instância, deferiu a medida liminar para obrigar o município a fornecer o alimento.

Contudo, o gestor público municipal permaneceu inerte e não realizou nenhuma medida no intuito de efetivar cumprimento da decisão judicial. Como consequência, o juízo determinou o bloqueio de bens públicos do município para garantir a efetividade da medida liminar.

Por sua vez, o Ministério Público ajuizou ação de improbidade administrativa em face do prefeito com o pedido de responsabilização pela prática de ato que configura ato atentatório contra a moralidade, configurando improbidade administrativa. O pedido foi tido como improcedente e chegou ao STJ.

O Tribunal entendeu que a conduta do gestor violou princípios da administração pública, o que configura a prática de ato de improbidade administrativa, conforme previsto no art. 11 da Lei 8.429/92. Tal comportamento é suscetível a sanções cíveis, como a perda do cargo público, o ressarcimento ao erário, a suspensão dos direitos políticos e o pagamento de multa.

A Corte decidiu que o réu, ao ocupar o mais alto cargo da administração pública local, tinha o dever de conhecer a exigência básica segundo a qual não pode o administrador deixar de cumprir, sem justa causa reportada e comprovada nos respectivos autos, ordens emanadas de processos judiciais.

Confira a redação da Ementa:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MUNICÍPIO DE MIRADOURO. EX-PREFEITO. NÃO CUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. FORNECIMENTO DE SUPLEMENTO A MENOR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC. NÃO VERIFICADA. DOLO OU MÁ FÉ DO AGENTE. ELEMENTO SUBJETIVO. CARACTERIZAÇÃO. ART. 11 DA LEI N. 8.429/92. PREJUÍZO AO ERÁRIO. DESNECESSIDADE. I - Trata-se, na origem, de ação civil pública por ato de improbidade administrativa objetivando a condenação do município a fornecer suplemento alimentar a menor. Concedida a liminar, o réu, na qualidade de prefeito municipal, não cumpriu a ordem judicial, com o que se fez necessário o bloqueio de valores do município para a efetividade do comando. Por sentença, julgou-se improcedente o pedido inicial. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais confirmou a sentença e julgou prejudicado o recurso. II - No tocante à violação do art. 1.022, II, do Código de Processo Civil, a argumentação não merece acolhida. O acórdão recorrido não se ressente de omissão, obscuridade ou contradição, porquanto apreciou a controvérsia com fundamentação suficiente, embora contrária aos interesses do recorrente. III - Entendeu o Tribunal a quo que, a despeito de evidenciado o descumprimento da liminar, para a configuração da improbidade administrativa, era necessária a comprovação do dolo ou má-fé do agente. IV - No tocante a tipificação, a conduta consistente em ignorar ordens judiciais afronta não apenas princípios basilares da administração pública - notadamente os princípios da legalidade e da moralidade administrativas -, mas também a própria estrutura democrática de Estado, que canaliza no Poder Judiciário a garantia de implemento impositivo das prestações constitucionalmente prometidas e não honradas pelo poder público. V - Portanto, não há dúvida de que, com o comportamento do prefeito, infringiu o recorrido postulados fundamentais e postos fora dos quadrantes da discricionariedade administrativa. VI - Sabe-se que não é qualquer atuação, desconforme os parâmetros normativos, que caracteriza ato de improbidade administrativa. É imprescindível a constatação de uma ilegalidade dita qualificada, reveladora da consciência e vontade de violar princípios da administração pública. Nesse sentido: AgInt no REsp n. 1.560.197/RN, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 2/2/2017, DJe 3/3/2017 e REsp n. 1.546.443/PB, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 18/10/2016, DJe 25/10/2016. VII - No caso dos autos, é clara a presença do elemento subjetivo dolo, já que o réu-recorrido, ocupando o mais alto cargo da administração pública local, tinha o dever de conhecer a exigência básica segundo a qual não pode o administrador deixar de cumprir, sem justa causa reportada e comprovada nos respectivos autos, ordens emanadas de processos judiciais. VIII - Cumpre recordar que "o dolo que se exige para a configuração de improbidade administrativa é a simples vontade consciente de aderir à conduta, produzindo os resultados vedados pela norma jurídica - ou, ainda, a simples anuência aos resultados contrários ao Direito quando o agente público ou privado deveria saber que a conduta praticada a eles levaria -, sendo despiciendo perquirir acerca de finalidades específicas" (STJ, AgRg no REsp n. 1.539.929/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 2/8/2016.) IX - Além disso, acentue-se que a atuação, em desconformidade com os referidos dispositivos legais, caracteriza conduta ímproba, nos termos do art. 11 da Lei n. 8.429/92, independentemente da ocorrência de prejuízo efetivo ao patrimônio público. O prejuízo efetivo ao patrimônio público é dispensado. Nesse sentido: REsp n. 1.164.881/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 14/9/2010, DJe 6/10/2010. X - Por consequência, resulta configurada a prática de improbidade administrativa violadora de princípios da administração pública, nos termos do art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92. XI - Agravo interno improvido. (STJ - AgInt no AREsp: 1397770 MG 2018/0298477-2, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 14/05/2019, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/05/2019).

6. Crime de Prevaricação

A não realização do ato determinado judicialmente pelo gestor pode caracterizar, inclusive, crime de Prevaricação conforme dispõe o Código Penal:

Prevaricação

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

No entanto, algumas medidas passam a ser ineficazes quando o Executado for insolvente ou falido, obrigando o uso de outras medidas.

7. Apreensão de CNH e passaporte

Para se obter uma medida tão drástica como esta, o requerente precisa evidenciar que todas as medidas coercitivas para o adimplemento foram esgotadas, uma vez que inúmeras são as decisões que negam o presente pedido por desproporcional:

"Para que se legitime a apreensão do passaporte e a suspensão da carteira nacional de habilitação do executado é preciso que se demonstre que ele, embora possua lastro financeiro ou patrimonial para suportar a execução, atua processualmente em desacordo com o primado da boa-fé e da lealdade com o intuito de embaraçar a satisfação do crédito do exequente. IV. Recurso conhecido e provido em parte." (TJ-DF 07088192020178070000 DF 0708819-20.2017.8.07.0000, Relator: JAMES EDUARDO OLIVEIRA, Data de Julgamento: 22/02/2018, 4ª Turma Cível.)

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - Decisão agravada que deferiu a apreensão da CNH dos devedores e o bloqueio de seus cartões de crédito como medidas coercitivas ao pagamento da dívida, com fundamento no art. 139, inc. IV, CPC - Medidas atípicas que não podem ser aplicadas de forma absoluta - Atos excepcionais, que exigem o esgotamento dos meios tradicionais de satisfação do crédito e a ocultação de patrimônio pelo devedor, principalmente quando destinados a restringir direitos individuais - Ausência de qualquer indício de ocultação de patrimônio - Revogação da medida que se impõe - (...)Recurso provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2229398-81.2017.8.26.0000; Relator (a): Hugo Crepaldi; Órgão Julgador: 25ª Câmara de Direito Privado; Foro de Lins - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 21/02/2018; Data de Registro: 21/02/2018)

Trata-se de medida severa, reconhecida na maioria das vezes como desproporcional:

Agravo de Instrumento. Cumprimento provisório de julgado. Decisão agravada que indeferiu pedido de apreensão de passaporte, CNH e bloqueio de cartões de crédito do sócio administrador da Executada. Insurgência da Exequente. Não acolhimento. Medidas pleiteadas que não implicam na satisfação do débito executado, além de violarem direitos fundamentais que, no caso, são de pessoa diversa da devedora. Execução que deve se pautar pela busca de bens passíveis de penhora. Decisão mantida. Recurso não provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2245458-27.2020.8.26.0000; Relator (a): João Pazine Neto; Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito Privado; Foro de Barueri - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 01/12/2020; Data de Registro: 02/12/2020)

A justificativa para requerimentos como estes, parte do poder conferido ao Juiz pelo Art. 139, inc. IV do CPC/15, e, principalmente, pela necessária preservação da segurança jurídica e o risco de enfraquecimento da instituição judiciária, conforme destaca de forma brilhante renomada doutrina:

"Não há dúvida de que o direito perde a sua qualidade se não puder ser efetivamente tutelado. A proibição de fazer justiça de mão própria não tem muito sentido se ao réu for dada a liberdade de descumprir a decisão judicial, pois nesse caso ele estará fazendo prevalecer a sua vontade como se o Estado não houvesse assumido o monopólio da jurisdição, cuja atuação efetiva é imprescindível para a existência do próprio ordenamento jurídico. Ninguém pode negar que o processo exige, diante de certas situações de direito substancial, o uso da coerção indireta. Porém, a multa não constitui a única forma de coerção indireta e nem se pode dizer que é suficiente para a efetiva prestação da tutela jurisdicional" (MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela de Urgência e Tutela da Evidência. Editora RT, 2017. p.173).

Sobre o tema, veja pedido de apreensão de CNH e passaporte.

Assim, sob o viés da necessária efetividade do processo, alguns pedidos nesse sentido são deferidos.

De fato, a Justiça deve adotar as ferramentas necessárias para garantir a sua integral efetividade e agir diante de claro descumprimento de ordem judicial. Nesse cenário, os advogados devem estar atentos e pleitear em juízo, as medidas de coerção necessárias sempre que entenderem que o réu está violando as determinações proferidas na sentença, bem como incidindo em ilegalidade e indo contra a legislação aplicável.

Entendeu como prosseguir o cumprimento judicial de forma efetiva? Você já passou por essa experiência? Ainda tem alguma dúvida sobre o assunto? Deixe um comentário abaixo com a sua pergunta ou contando a sua experiência!

PETIÇÃO RELACIONADA

Descumprimento de decisão

  CADASTRE-SE GRÁTIS

Cadastre-se para receber conteúdos da área Geral e poder comentar esse artigo.

Comentários

requeri  a expedição de alvará judicial para levantamento  dos valores deixados em bancos, FGTS,  e verbas trabalhistas apuradas em processo administrativo municipal, vez que o  finado pai dos clientes era servidor publico.  Assim, após juntar os alvarás no pad da prefeitura e requerer o pagamento, eis que permanece parado há 04 meses no setor de despesa e    e sem previsão  para enfim pagar o valor.  Pensei em ajuizar ação monitoria  em  face da fazenda pública, porém me sobreveio dúvidas acerca de cumprimento  de sentença na ação de alvará...alguma opinião para me ajudar?
Responder
Há, porém, a situação recíproca: a cessação de obrigação, com termo certo. Nessa, caso concreto, um juiz parece não querer cumprir um acordo de pagamento de pensão, homologado em juízo, decorrente de obrigação por ato ilícito, cujo ônus possui data certa para cessar, e o juízo inventa a necessidade de "contraditório", demora a despachar questões simples (média de 95 dias) etc., para uma situação constituída há quase 25 anos. QUESTIONO: Só existiria o mandado de segurança para remediar esse absoluto despautério ??? 
Responder
Consegui uma liminar na justiça para obter um tratamento de quimioterapia junto ao SUS, porém o Ministério da Saúde não acatou e agora minha mãe sofre sem tratamento.  O que fazer?
Responder
@Marcelo Bmc:
Bom dia Marcelo, teria que analisar a liminar deferida para ver se é o caso de pedido de multa e bloqueio/sequestro de valores para o cumprimento da liminar, tive que fazer esse pedido agora pela manhã para a minha cliente! Boa sorte!!! 
Responder
@Marcelo Bmc:
Vá a imprensa! 
Responder
fui declarado inventariante mas pessoas nao respeitam a ordem a ordem do juiz que fazer em um caso deste e a pessoa usa a casa para moradia que se encontra fazendo inventario morando e 8 comodos e nao respeita os direitos judicias nao sei o que fazer mais 
Responder
Processei a CEF para me excluir de Fiador em um contrato do FIES. Ganhei a causa e o recurso e está transito em julgado. Isso foi em Junho de 2021, que foi publicado o transito em julgado. Porém a caixa não me excluiu e continuo sendo o fiador do contrato, e agora a pessoa não pagou o contrato e meu nome foi negativado do Serasa me prejudicando, Não sei o que fazer agora, já havia sido exonerado do contrato por decisão judicial e continuo a me prejudicar, mesmo após o transito em julgado...
Responder
@Luiz Antonio Palma:
Olá Luiz! Sou advogada, e nesse caso você terá que ajuizar nova ação de obrigação de fazer com danos morais, além do pedido de urgência. Creio que no processo antigo cabe informar que a Caixa nunca cumpriu com ordem judicial e pedir aplicação de multa. Abraço!
Responder
@Luiz Antonio Palma:
Boa tarde, Luiz. Vc deve entrar com o incidente de cumprimento de sentença, como pedido de expedição de oficio a CEF/ FIES requerendo sua exclusão como fiador. Apos a exclusão entra com o pedido de danos morais contra CEF/ FIES.(cuidado). Vc ganhou a causa mas não deu continuidade ao cumprimento de sentença, por isso a CEF manteve vc como fiador.  boa sorte  abçs
Responder
Estou aguardando a Caixa Econômica Federal cumprir uma determinação judicial a meses. Qual seria a ferramenta adequada nesse caso? Trata-se de penhora de FGTS/alimentos, já deferida pela Magistrada. Protocolei o ofício pessoalmente, já cobrei a gerente que o recebeu, pedi aplicação de multa, mas a juíza indeferiu por ser aplicável somente ás partes do processo...
Responder
GRATIDÃO
Responder
Excelentes informações. Gratidão.
Responder
Parabéns!!! Artigo completo e eficiente.
Responder
Excelente. Parabéns!
Responder
excelente artigo
Responder
muito boa matéria!
Responder
Excelente artigo colega, gostei muito. Foi bom.
Responder
Perfeito . Baseado no artigo Vou requerer a prisão do chefe do departamento da Petrus bem como do INSS .
Responder
Artigo fenomenal. Claro e objetivo. Farta substância jurisprudencial e doutrinária. PERFEITO!
Responder
Artigo muito bem elaborado e esclarecedor, sensacional!!!
Responder
Excelente material!
Responder
Este modelo caiu do  céu. Patrocino uma ação de execução de cheque ajuizada em 2010 e até hoje ainda não teve uma solução. Há 30 ou 40 dias o Juiz, a pedido, aceitou penhora de um furgão, determinando que o veículo fosse recolhido pelo leiloeira. Assim mesmo, tal ordem judicial não foi concretizada. Ainda esta noite vou elaborar a petição. Muito obrigado.
Responder
EXCELENTE TEXTO. VAMOS NOS APERFEIÇOANDO NA CAMINHADA
Responder
Parabéns pela rica jurisprudência e robusta doutrina vanguardista textualizadas.
Responder
Excelentes dicas.
Responder
Excelente, estou usando o material, esta sendo de grande utilidade!
Responder
Excelentes dicas! Parabéns pelo texto, diga se de passagem, muito bem elaborado.
Responder
Obrigada!!! Será de grande valia.
Responder
Parabens, excelente material;!  
Responder
@Souza Santos:
Parabéns  Parabéns, eu sempre acreditei nas evoluções das leis, segundo o humanismo cada vez mais evoluindo os direitos sucessórios. Cordiais Saudações 
Responder
MODELOS RELACIONADOS