Reclamação Trabalhista: Liquidação ou simples indicação dos valores?

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Por Modelo Inicial
21/05/2020  
Reclamação Trabalhista: Liquidação ou simples indicação dos valores? - Trabalhista
Apesar de não trazer expressamente a obrigação de se liquidar os valores na inicial, a Reforma Trabalhista trouxe uma certa instabilidade no manejo do processo. Veja algumas alternativas.

Recente decisão do TRT4 declara: "Imposição de liquidação da inicial da ação trabalhista é ilegal e obstaculizadora do direito fundamental de acesso à justiça." (0022366-07.2017.5.04.0000 MS - 28/2/18)

Com esse entendimento, o TRT4 concedeu mandado de segurança impetrado em face de ordem judicial que determinava a emenda por ausência de liquidação dos valores na inicial.

Gradativamente começam a surgir posicionamentos sobre a temida "liquidação dos valores iniciais" na Reclamação Trabalhista, o que vem gerando grande instabilidade, especialmente pela ausência de homogeneidade das decisões. Essa preocupação tem uma razão, muitas decisões em primeiro grau vem paulatinamente determinando a emenda à inicial para que o Reclamante "liquide" os valores, requerendo, inclusive, a juntada de cálculos discriminados, veja dois exemplos:

"Determino que a parte autora emende a inicial, no prazo de 15 dias, de forma a atribuir valor correspondente aos pedidos não líquidos, com consequente retificação do valor da causa, se for o caso, (...), sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito, quanto aos pedidos em tela, conforme o §3º do art. 840, da CLT, e o art. 485, IV, do CPC."

"Determino que o autor apresente emenda à petição inicial de forma a adequá-la aos termos do artigo 840, § 1º, da CLT (nova redação), atribuindo valores individualizados para cada pedido, ciente dos efeitos previstos no artigo 492 do CPC."

A insegurança jurídica gerada pela Reforma Trabalhista, ganha especial relevo na interpretação dada à exigência do Art. 840, §1º, diante da grande dificuldade de se ter acesso a dados e documentos que sustentam os cálculos exigidos.

Assim, mesmo diante da indicação aproximada dos valores por pedido, alguns Juízes tem entendido pela necessidade da liquidação, o que, smj, não encontra amparo na letra fria da redação da nova norma, in verbis:

Art. 840 - A reclamação poderá ser escrita ou verbal.

§ 1º Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante.

Ou seja, a lei não refere expressamente a necessidade de liquidação dos valores iniciais, mas unicamente a indicação de seu valor. Nesta linha, recentes decisões colocam em cheque os rumores de que seria obrigatória a liquidação prévia dos valores pleiteados, reafirmando a ausência desta exigência na lei, conforme precedente abaixo:

MANDADO DE SEGURANÇA. EMENDA À PETIÇÃO INICIAL. LEI 13.467. PEDIDO LÍQUIDO. IMPOSIÇÃO DE LIQUIDAÇÃO DA INICIAL DA AÇÃO TRABALHISTA ILEGAL E OBSTACULIZADORA DO DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO À JUSTIÇA. SEGURANÇA CONCEDIDA PARA CASSAR A EXIGÊNCIA. Tradicionalmente o art. 840 da CLT exige, da inicial da ação trabalhista, uma breve narrativa dos fatos, o pedido, o valor da causa, data e assinatura. A nova redação da lei 13467/17, denominada "reforma trabalhista" em nada altera a situação, considerando repetir o que está exposto no art. 291 do CPC quanto à necessidade de se atribuir valor à causa e não liquidar o pedido. A imposição de exigência de liquidação do pedido, no ajuizamento, quando o advogado e a parte não tem a dimensão concreta da violação do direito, apenas em tese, extrapola o razoável, causando embaraços indevidos ao exercício do direito humano de acesso à Justiça e exigindo do trabalhador, no processo especializado para tutela de seus direitos, mais formalidades do que as existentes no processo comum. (...). Segurança concedida. (TRT da 4ª Região, 1ª Seção de Dissídios Individuais, 0022366-07.2017.5.04.0000 MS, em 28/02/2018, Marcelo Jose Ferlin D'Ambroso)

Tal posicionamento é amplamente justificado, pois a exigência de valor certo e determinado não significa propriamente a sua liquidação. Importante lembrar, que a liquidação, conforme doutrina processualista, se trata de fase específica para simplesmente apurar os valores devidos em processo de conhecimento finalizado:

"A liquidação da obrigação cinge-se a apurar o valor devido a título de condenação ao demandante. Sua função é simplesmente outorgar liquidez ao título, não podendo jamais dar lugar à nova discussão da lide ou à modificação da sentença." (MITIDIERO, Daniel. ARENHART, Sérgio Cruz. MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Código de Processo Civil Comentado - Ed. RT, 2017. e-book, Art. 509.)

Ou seja, não há espaço para liquidação previamente à fase de conhecimento, o que conduziria à preclusão prematura dos critérios de apuração do seu valor, especialmente quando para os cálculos e exige acesso a fatos e documentos, muitas vezes, em posse do Reclamado.

Tal compreensão feriria frontalmente princípios basilares da Justiça Trabalhista, tais como o da simplicidade, informalidade e do amplo acesso à justiça. A doutrina especializada, ao analisar a matéria, corrobora com este entendimento:

"A lei não exige que o pedido esteja devidamente liquidado, com apresentação de cálculos detalhados, mas que indique o valor. De nossa parte, não há necessidade de apresentação de cálculos detalhados, mas que o valor seja justificado, ainda que por estimativa. Isso se justifica, pois o reclamante, dificilmente, tem documentos para o cálculo de horas extras, diferenças salariais, etc. Além disso, muitos cálculos demandam análise de documentação a ser apresentada pela própria reclamada." (SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho. 13ª ed. Ed. LTR, 2018. p. 570)

Apesar da compreensão sobre a inexigibilidade da liquidação prévia na Inicial Trabalhista, importante atentar que passamos por uma fase instável, exigindo dos profissionais a maior cautela possível para evitar extinção de processos e tempo perdido. Neste ambiente de insegurança jurídica, importante sempre avaliar as opções e dispor de todas as medidas acessíveis, conforme alguns exemplos abaixo:

  • INICIAL TRABALHISTA: Indicar pontualmente os valores relacionados a cada pedido, e, fundamentando em tópico específico sobre eventuais valores genéricos em face da inacessibilidade de alguns documentos e informações de posse do reclamado. Este tópico pode vir fundamentado pela desnecessidade da liquidação, conforme modelo de inicial trabalhista que disponibilizamos aqui.
  • RÉPLICA: Ao constar a indicação de inépcia na contestação, importante a fundamentação contundente sobre a desnecessidade da liquidação e suficiência da indicação dos valores em cada pedido, conforme modelo de Réplica disponibilizado aqui.
  • EMENDA À INICIAL: Nos casos em que seja necessário emendar a inicial, duas opções surgem: i) indicar os valores que sejam possíveis especificar e apresentar justificativa sobre a inacessibilidade a fatos e documentos, inviabilizando a indicação precisa (Ver modelo aqui), ou, ii) impetrar Mandado de Segurança, conforme tópico abaixo.
  • MANDADO DE SEGURANÇA: Em alguns casos, diante da inviabilidade de liquidação prévia (pela ausência documental em posse da reclamada, por ex., ou mesmo pela necessidade de cálculos complexos), alguns profissionais tem se socorrido pela via do mandado de segurança. Apesar de ser questionável, alguns resultados são positivos conforme precedentes e argumentação acima colacionados, com pedido de suspensão da decisão de primeiro grau e desnecessidade da liquidação, conforme modelo de Mandado de Segurança disponível aqui.
  • RECURSO ORDINÁRIO: Nos casos mais extremos, em que foi determinada a extinção do processo por ausência da indicação dos valores, não sendo possível o ingresso de nova ação (pelo risco da prescrição por ex.) pode-se buscar a revisão da decisão por meio de Recurso Ordinário, pelo qual busca a revisão da decisão pela arbitrariedade de se exigir a liquidação, quando a melhor interpretação seria apenas a indicação dos valores. Veja um modelo de Recurso Ordinário aqui.

Por fim cabe reiterar que em observância à redação da lei, o mais seguro é discriminar ao máximo os valores em cada um dos pedidos para evitar ter que se socorrer de litígios processuais que desviam do objetivo comum.

E você Dr., já teve uma experiência sobre o tema após a Reforma Trabalhista? Compartilhe conosco.

Veja ainda, alguns artigos relacionados ao tema:

Abraço da Equipe Modelo Inicial.

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Comentários

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@Kelly Viana:
Olá! Todos os artigos são feitos pela equipe interna da plataforma, podendo ser citado como fonte apenas Modelo Inicial e o link de acesso. Qualquer dúvida, seguimos à disposição.
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bom dia à todos. acabei de ter um ação julgado improcedente em razão de não ter indicado valor ao podido de condenação ao honorarios e multa do artigo 467. Entendo que tais pedidos são de natureza processual e dependem de fatos supervenientes a analise jurisdicional, assim como é o pedido de condenação em litigância de má fé por, ato atentatório a dignidade da justiça por exemplo. Cabe anotar que a decisão de indeferimento da inicial, foi proferida após a instrução probatória, com analise de documentos, oitiva de testemunhas e partes, o que traz ainda maior prejuízo e desrespeito aos princípios basilares da justiça laboral.
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@elson beleza adv:
Estou me deparando com cada decisão absurda! Toda instrução decorrida! Esta ação foi distribuída antes da Reforma? Mesmo sendo após é um absurdo. Veja este precdente, pode lhe ser interessante:  MANDADO DE SEGURANÇA. EMENDA À PETIÇÃO INICIAL. LEI 13.467. PEDIDO LÍQUIDO. IMPOSIÇÃO DE LIQUIDAÇÃO DA INICIAL DA AÇÃO TRABALHISTA ILEGAL E OBSTACULIZADORA DO DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO À JUSTIÇA. SEGURANÇA CONCEDIDA PARA CASSAR A EXIGÊNCIA.Tradicionalmente o art. 840 da CLT exige, da inicial da ação trabalhista, uma breve narrativa dos fatos, o pedido, o valor da causa, data e assinatura. A nova redação da lei 13467/17, denominada "reforma trabalhista" em nada altera a situação, considerando repetir o que está exposto no art. 291 do CPC quanto à necessidade de se atribuir valor à causa e não liquidar o pedido. A imposição de exigência de liquidação do pedido, no ajuizamento, quando o advogado e a parte não tem a dimensão concreta da violação do direito, apenas em tese, extrapola o razoável, causando embaraços indevidos ao exercício do direito humano de acesso à Justiça e exigindo do trabalhador, no processo especializado para tutela de seus direitos, mais formalidades do que as existentes no processo comum. No ajuizamento da inicial foram cumpridos todos os requisitos previstos na lei processual vigente, não podendo ser aplicados outros, por interpretação, de forma retroativa. Não cabe invocar a reforma trabalhista para acrescer novo requisito a ato jurídico processual perfeito. Inteligência do art. 14 do CPC. Segurança concedida. (TRT4 Processo 0022366-07.2017.5.04.0000(MS) Redator: Marcelo Jose Ferlin D'ambroso Órgão julgador: 1ª Seção de Dissídios Individuais 28/02/2018)
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Estou com um caso que se diz respeito ao "dano moral" que não liquidei e corro o risco de não ver infelizmente meu pedido atendido. Alguém já passou por isso?
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Estou com um caso que se diz respeito ao "dano moral" que não liquidei e corro o risco de não ver infelizmente meu pedido atendido. Alguém já passou por isso?
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Estou com um caso que se diz respeito ao "dano moral" que não liquidei e corro o risco de não ver infelizmente meu pedido atendido. Alguém já passou por isso?
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Estou com um caso que se diz respeito ao "dano moral" que não liquidei e corro o risco de não ver infelizmente meu pedido atendido. Alguém já passou por isso?
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Estou com um caso que se diz respeito ao "dano moral" que não liquidei e corro o risco de não ver infelizmente meu pedido atendido. Alguém já passou por isso?
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Estou com um caso que se diz respeito ao "dano moral" que não liquidei e corro o risco de não ver infelizmente meu pedido atendido. Alguém já passou por isso?
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Tive uma experiência recente. O processo foi fatalmente extinto sem resolução do mérito por não observância da nova redação do artigo 840.
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Corretas as explicações. De fato, liquidar (todas) as parcelas em um primeiro momento, torna inviável a propositura da ação trabalhista. Sempre há controvérsias a serem dirimidas após sentença.
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De fato, a advocacia trabalhista vive um momento de incertezas. Eu ajuizei uma demanda no dia 10.11.17 e não liquidei os pedidos, a petição inicial foi indeferida com base na nova legislação ainda não em vigor. Apesar de resultar em prejuízo temporal para o Reclamante, achei melhor recorrer da decisão posto que essas matérias precisam chegar aos tribunais trabalhistas, a fim de consolidarem entendimento.  
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Excelente!!!
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acabei de ter uma experiencia dessas hoje. O Juiz extinguiu o feito e condenou em custas sem nem mesmo apreciar  pedido de gratuidade de um reclamante que está desempregado. Muito boa essa pesquisa e informação.
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Segue o entendimento da Juíza da 72ª/RJ. Absurdo!Relatório Fundamentação PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO 1ª REGIÃO 72ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro Avenida Gomes Freire, 471, 1º Andar, Centro, RIO DE JANEIRO - RJ - CEP: 20231-014 tel: (21) 23807572  -  e.mail: vt72.rj@trt1.jus.br PROCESSO: 0100155-10.2018.5.01.0072 CLASSE: AÇÃO TRABALHISTA - RITO ORDINÁRIO (985) RECLAMANTE: LUZIVALDO SANTOS DA MOTA RECLAMADO: VS BRASIL SEGURANCA E VIGILANCIA - EIRELI e outros SENTENÇA PJe Vistos etc...A presente ação foi ajuizada sob a égide da Lei 13467/2017, que entrou em vigor em 11 de novembro do corrente ano, aplicando-se, de imediato, à presente ação, conforme artigos 14 e 1046 do CPC/2015.A petição inicial da presente ação apresenta todos os pedidos certos e determinados, com indicação dos respectivos valores, poré, constato que o reclamante englobou vários pedidos em tópicos, apresentando valor único para todos eles, sem individualização de cada valor.Ademais, o autor também não apresentou a planilha demonstrativa do débito atualizada, configurando-se a ausência de documento essencial para o prosseguimento da lide, o que implica na extinção do processo por ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo.    Dispositivo Destarte, extingo a presente ação sem resolução do mérito, nos termos do artigos 485, I e IV do CPC/2015 e 330 I e §1º, II do CPC/2015..Custas de R$1173,41 incidentes sobre R$58670,33 pelo reclamante, conforme nova redação do artigo 790 §3º da CLT.Das quais fica dispensado, por receber salário inferior a 40% do teto do regime geral da Previdência Social.Intime-se.  RIO DE JANEIRO, 13 de Março de 2018 HELOISA JUNCKEN RODRIGUES Juiz do Trabalho Titular
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MUITO BOM..
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Excelente!
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Muito esclarecedor.
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Muito útil as explicações, apesar de que todas as reclamatórias deduzidas e protocoladas tem sido recepcionadas pelos juízes Gaúchos. Mas se enfrentar problemas irei lembrar-me do artigo publicado.
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